quarta-feira, 20 de julho de 2016

Recuperação ou fundo do poço

Semana de 11 a 17 de julho de 2016

Nelson Rosas Ribeiro[i]

Nos últimos tempos tem aumentado o berreiro sobre a recuperação da economia. Os economistas do governo, as autoridades, os jornais, a TV Globo, os comentaristas, todos fazem questão de criar um ambiente otimista sobre o fim da crise. E isto é decisivo para o governo já que todos acreditam que os movimentos da economia são regidos por “expectativas” dos agentes. Quando a expectativa é negativa a economia afunda. Se for positiva, otimista, por milagre o crescimento é retomado. Tudo é uma questão de credibilidade. Assim, uma vez derrubado o PT, superada a corrupção, criada uma equipe econômica “confiável”, com um bom e sério governo, teria sido restaurada a credibilidade e a economia deveria entrar em recuperação. Infelizmente, apesar do berreiro, os únicos indicadores que são apresentados são indicadores subjetivos e duvidosos que reportam o humor dos empresários, consumidores e “investidores”. Os indicadores objetivos apontam, em outra direção. Vou apenas citar alguns exemplos.
Em maio, em relação à abril, o varejo caiu 1%, a venda de materiais de construção, 3,7% e os serviços 0,1%. A indústria se manteve estável e o desemprego ficou nos 11,2%. No entanto o número de pessoas que recebem menos que um salário mínimo aumentou de 19,4% para 23,5% e a previsão é que, até o final do ano, o número dos empregados com carteira assinada caia, de 57,2%, para 55%. A Volskwaguem de São Bernardo do Campo está promovendo a demissão de 3,6 mil operários, 30% do total do pessoal ocupado, além de cortar gratificações, pagamentos de horas extras, adicionais por serviço noturno e insalubridade. Admite-se que a queda na indústria automobilística já atinge os 20%.
Para agravar a situação o processo de valorização da moeda nacional ante o dólar continua apesar das intervenções do Banco Central (BC) que, contrariando as promessas de restauração do tripé macroeconômico (meta de inflação, superávit primário, câmbio flutuante), remove a perna do tripé do câmbio flutuante, voltando à política de “flutuação suja” usada pelo ex-ministro Mantega e tão criticada na época. A valorização do real dificulta as exportações tidas como um dos estímulos à recuperação.
Se a economia patina, o governo se enterra em contradições.
O resultado das privatizações já realizadas não está sendo o esperado. A receita vinda da entrega dos aeroportos não vem sendo recolhida, pois as concessionárias não pagam. Seis delas já devem ao governo R$2,6 bilhões, sem contar os juros (Viracopos R$173,7 milhões; Guarulhos R$1,1 bilhões; Galeão R$933,4 milhões; Confins BH R$74,4 milhões, etc.) Nas rodovias a situação é semelhante e os investimentos prometidos não estão sendo realizados. E o governo não cobra como também não vem cobrando os impostos devidos por grandes empresas que os utilizam como forma de capitalização, já que o crédito no sistema bancário continua escasso e sendo reduzido.
Com esses dados não nos parece que haja sinais de recuperação à vista. Tudo indica que nos aproximamos do fundo do poço, ou seja, a situação ainda está piorando, mas a um ritmo mais lento. 
No campo político o governo sofreu uma derrota na eleição para a presidência da Câmara com a vitória do candidato do DEM que contou até com os votos de parte do bloco aliado ao PT. Era preciso remover o defunto Eduardo Cunha do ambiente. O resultado criou uma grande alteração nas alianças dos partidos representando um rude golpe no “centrão”, o que obrigará Temer a rever a sua base de apoio. Mais complicação para o governo: gerir agora uma aliança PMDB – PSDB – DEM.
As esperanças de uma recuperação, no entanto, estão condicionadas por acontecimentos internos e externos. Internamente será difícil estimular a economia mantendo-se uma política de austeridade fiscal defendida fanaticamente pelas forças que estão no poder. Externamente, dependemos da recuperação da economia mundial, o que se torna cada vez mais difícil diante da ameaça de uma nova crise em gestação, agravada pelo Brexit, saída do Reino Unido da União Europeia, e das dificuldades da economia chinesa que continua a se arrastar.
Por enquanto ficamos no fundo do poço.

[i] Professor Emérito da UFPB e Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).
Share:

0 comentários:

Postar um comentário

Novidades

Recent Posts Widget

Postagens mais visitadas

Arquivo do blog