quarta-feira, 4 de abril de 2018

Recuperação consistente?



Semana de 26 de março a 01 de abril de 2018

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Há 15 dias, anunciávamos aqui o decrescimento da economia brasileira com o recuo da produção industrial em janeiro, número que provocou sucessivas revisões para baixo do PIB de 2018. Mesmo assim, governo e parte dos economistas não param de festejar a recuperação nada sólida da nossa economia.
Apesar da inconsistência dos números, os discursos são os mesmos. O entusiasmo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) é tal que ela acaba de lançar um seminário de título “A retomada do crescimento” marcado para 02 de abril.
Em contrapartida, pesquisas que apuram as expectativas dos agentes econômicos realizadas pela própria FGV, levantam dúvidas quanto à recuperação. Entre fevereiro e março, o Indicador de Incerteza da Economia (IIE-Br) subiu 5,2 pontos mas o Índice de Confiança do setor de Serviços (ICS) caiu 1,7 ponto. Esta foi a maior queda desde junho de 2017.
Na economia real, mais notícia ruim. O PIB de São Paulo recuou 0,7% entre dezembro de 2017 e janeiro de 2018, segundo a Fundação Seade. Por setores, a indústria apresentou queda de 2,5% e os serviços recuaram 0,1%. Apenas a produção agropecuária cresceu 3,6%. Já o SPC Brasil e a Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas apuraram, em fevereiro quando comparado a janeiro, um crescimento do índice de inadimplência das empresas de 0,9% e de 6,76% na base de comparação anual. Do lado dos credores, quem menos recebeu foi a indústria, com a inadimplência de seus credores crescendo 9,26%.
Se o setor produtivo, com exceção do ramo de automóveis, continua a padecer, a recuperação também não chegou a quem consome. No trimestre encerrado em fevereiro de 2018, a taxa de desemprego, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) subiu a 12,6%. O registro foi maior do que o esperado pelos analistas ouvidos pelo Jornal Valor Econômicos que, um dia antes da pesquisa ser divulgada projetavam alta de 12,5%. No trimestre móvel encerrado em janeiro a taxa foi de 12,2%. Houve aumento de 432 mil pessoas no contingente de desempregados, quando comparado ao trimestre anterior. Já são 13,1 milhões de trabalhadores na fila do desemprego. O número de empregados no setor privado sem carteira assinada diminuiu 407 mil pessoas, a quantidade de trabalhadores por conta própria e de domésticos ficou estável. Aqueles que não têm emprego e que não estão em busca de um, já somam 64,9 milhões de pessoas. Segundo o IBGE a alta foi causada por questões sazonais, em virtude da dispensa dos trabalhadores temporários contratados para as festas de final de ano.
O governo, mesmo sem admitir a ineficácia de suas políticas, continua a tentar “produzir” resultados. Após a decisão de cortar os juros, em março, a ata do Copom sinaliza que um novo corte deve ocorrer em maio. Segundo seus membros, há “necessidade de tornar a política monetária um pouco mais estimulativa”, ou seja, para a “...próxima reunião, o Comitê vê, neste momento, como apropriada uma flexibilização monetária moderada adicional”. Será mais um corte, provavelmente sem reflexo algum sobre o consumo e tampouco sobre a taxa de juros ao consumidor final.
Por outro lado, o Banco Central alterou as regras dos depósitos compulsórios, promovendo a queda da alíquota de recolhimento dos depósitos à vista de 40% para 25%, reduzindo as alíquotas do encaixe obrigatório dos depósitos da poupança rural de 21% para 20% . Para as demais modalidades de poupança a queda foi de 24,5% para 20%. Com estas mudanças o BC visa reduzir o spread bancário e facilitar a concessão de crédito.
Se estiver realmente ocorrendo, a tal recuperação consistente tão alardeada, pode ser revertida se a economia internacional entrar novamente em crise, cenário bastante provável para 2018.
Portanto, o tal crescimento sustentado ainda figura como um sonho do governo e ainda permanece teoricamente restrito aos manuais de Economia.


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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