quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Um salto mortal ao passado


Semana de 15 a 21 de outubro de 2018

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

As pesquisas apontam para uma vitória expressiva do fascismo-antipetismo nesse 2º turno das eleições de 2018. Criado pelo ódio às diversas faces dos governos do PT (positivas e negativas), o atual movimento de rejeição ao partido somou-se ao contraditório discurso de repulsa ao diferente (de si e de suas crenças e tradições) e ao que está aí (na estrutura política). Além dos fatos concretos motivadores desse sentimento, a grande mídia brasileira cumpriu o papel de inflamar a opinião pública.
Desde as manifestações de junho de 2013, mas, sobretudo, a partir de 2014, vimos a responsabilidade por todos os problemas econômicos ser atirada contra o governo Dilma e sua política intitulada de “irresponsável”.
Como bem sabe qualquer economista que se preze, as economias capitalistas apresentam uma característica básica: a alternância periódica de momentos de aquecimento e desaquecimento da atividade produtiva. No final de 2008, o Brasil foi atingido pela “Crise do Subprime”, originada no mercado financeiro estadunidense. Como reação a isto, o então presidente Lula utilizou-se de políticas econômicas de combate aos efeitos da crise. Ao assumir a presidência, em 2011, Dilma Rousseff manteve e, em alguns pontos, ampliou tais medidas.
O problema fundamental é que, mesmo com o aparente superpoder que o Estado supostamente teria, ele só é capaz de combater os sintomas da crise. Sua causa fundamental, contudo, ele é incapaz de eliminar. Sua ação se assemelha a um analgésico, que inibe os efeitos de uma infecção, mas não combate o mal causador da patologia. Quando o analgésico é utilizado de forma contínua, a tendência é de que sua eficiência se reduza gradativamente, até chegar ao ponto de não mais surtir qualquer efeito. O mesmo pode-se dizer das medidas anticrise adotadas por um governo. O limite da intervenção é o orçamento governamental, que, em períodos de crise, por si só, tende a tornar-se deficitário.
As restrições na intervenção governamental começaram a se manifestar em 2014, ano em que a presidente foi reeleita, derrotando o candidato do PSDB, Aécio Neves. No ano seguinte, no início do seu segundo mandato, Dilma, de imediato, adotou uma política de forte cunho restritivo, e este foi um dos grandes erros no trato da crise econômica. Isto significou que, mesmo sem ter superado a fase crítica de desaquecimento, o Estado não só reduziu a dosagem do analgésico, como tomou medidas para piorar a situação da atividade produtiva. Isto se manteve nos primeiros meses de 2016, quando houve o Golpe.
A partir daí, o bombardeio de críticas à política econômica se intensificou e por todos os lados: além da grande mídia, também entrou no jogo a esmagadora maioria dos partidos políticos, inclusive os que outrora eram aliados. O objetivo primordial era aniquilar o PT e associar toda a desgraça do país a ele. As eleições de 2014 já haviam mostrado que faltava pouco para a direita (agora centro-direita, diante do atual cenário) voltar ao poder do Executivo nacional. Contudo, “esqueceram de combinar com os russos”, quer dizer, com Joesley Batista. No ano passado, o dono da JBS revelou a verdadeira face da menina dos olhos da burguesia, Aécio e o próprio PSDB: seu envolvimento com a corrupção a qualquer custo (inclusive custos com a vida alheia). Com isto, os grandes problemas da “velha política” e do PT também estavam enraizados nos tucanos, ou seja, eles estavam contaminados e seriam carta fora do baralho, como o 1º turno demonstrou.
É neste ponto chave que se dá a reviravolta e a ascensão de uma figura de intelecto duvidoso, que desde 1993 despeja excremento através de palavras ofensivas, mas que conseguiu incorporar parte do clamor social e tornar-se porta-voz dele. Surgiu, então, a figura do “mito” (sic) Jair Bolsonaro. Este, por sua vez, tratou de alinhar-se, também, com as frações da burguesia que detêm o poder no Brasil: os setores financeiro e agrário.
Assim, sem um candidato tradicional capaz de se aproveitar do antipetismo, a elite e seus “peixes-piloto” (a classe média) tiveram que apostar na carta fascista.
 A questão que fica é a seguinte: em que momento deve vir o arrependimento por essa infeliz escolha, tão semelhante àquela feita pela Alemanha ou pela Itália no início do século passado?


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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