Semana de 04 a 10 de março de 2019
Jomar Andrade da Silva Filho [i]
Uma tática de guerra bastante conhecida por
qualquer militar que se preze é a cortina de fumaça. A estratégia consiste em
produzir artificialmente uma fumaça espessa, cujo propósito é encobrir a visão
dos oponentes para os enganar. Essa parece ser a estratégia adotada também pelo
presidente Jair Bolsonaro e sua equipe nos seus primeiros meses de mandato. No
campo de batalha das redes sociais, a substância escolhida para compor a fumaça
bolsonarista é clara: a pauta dos costumes. Circulando por temas laterais, e
muitas vezes até de foro íntimo/individual, a comunicação presidencial adotada
nesse primeiro momento é uma arma importante para um governo que tem muito mais
problemas a esconder do que realizações a exibir.
Longe da liturgia ou da seriedade que se
espera de quem ocupa o cargo mais alto da república, o presidente tem dedicado
grande parte do seu tempo a (tentar) incitar grupos mais radicais, facilmente
atiçados pela pauta dos costumes. O ápice (ou fundo do poço) dessa estratégia
ocorreu na semana passada, com a divulgação, via Twitter, de um vídeo com
conteúdo sexual ocorrido durante o carnaval de São Paulo.
Apontada como uma tentativa clara de
resposta às manifestações contrárias ao seu governo ocorridas durante o
carnaval, nos quatro cantos do país, a cena escatológica repercutiu
negativamente, tanto na mídia internacional, quanto dentro do governo. A
impressão geral, obviamente, é a de que a postagem foi “desnecessária” e “de
baixo nível”.
Devo lembrar, caro leitor, que enquanto o
presidente se debruça em estigmatizar artistas, professores, formadores de
opinião, imprensa, universidades e até o carnaval, boa parte da população
brasileira ainda segue sufocada em questões básicas da existência humana.
Questões como saúde, educação, emprego e moradia digna são as demandas mais
reais e urgentes da sociedade. Vejamos alguns exemplos.
Dados do Sistema Nacional de Informações
sobre Saneamento para o ano de 2016, mostram que no Brasil ainda havia 35
milhões de brasileiros sem acesso à água e mais de 100 milhões sem coleta de
esgoto.
O Indicador do Alfabetismo funcional de
2018, calculado para brasileiros entre 15 e 64 anos, apontou que 29% da
população, cerca de 38 milhões de pessoas, são consideradas analfabetos funcionais.
Isso significa que eles têm elevada dificuldade em compreender textos simples
ou realizar operações matemáticas.
Segundo dados do IBGE, para o ano de 2017,
havia 54,8 milhões de pessoas em situação de pobreza no Brasil (de acordo com a
definição do Banco Mundial, são pessoas com renda de até R$ 406 por mês). Já a
população na condição de extrema pobreza (com renda inferior a R$140 por mês)
era de 15,3 milhões. Do total da população, 7,4% estavam abaixo da linha da
pobreza no mesmo período.
O quadro é mais preocupante se lembrarmos
da trajetória ainda errática da economia brasileira e mundial.
A Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou relatório pouco animador, reduzindo
as projeções de crescimento para quase todos os países do G-20. Esta é uma
clara sinalização de que o ciclo de expansão da economia global está perto do
fim.
Para o Brasil, a projeção de crescimento do
PIB em 2019 foi revisada para baixo, de 2,1% para 1,9%. A OCDE, em setembro do
ano passado, chegou a prever que, em 2019, o PIB brasileiro cresceria 2,5%.
Diante da cortina de fumaça que nos foi
lançada nesses três meses, apenas uma coisa é clara: as demandas reais da
população não serão solucionadas da maneira simplista e imediatista como tem
sido proposto na gestão atual.
A resolução dos principais problemas
nacionais exige foco, estudo aprofundado e planejamento estratégico de longo
prazo.
Mas o que esperar de um governo que mal
consegue se equilibrar em 280 caracteres?
[i] Estudante
de Economia da UFPB e pesquisador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na
Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; jomarandradefilho@gmail.com).
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