quarta-feira, 13 de março de 2019

“Cortina de Fumaça”


Semana de 04 a 10 de março de 2019

Jomar Andrade da Silva Filho [i]

           
Uma tática de guerra bastante conhecida por qualquer militar que se preze é a cortina de fumaça. A estratégia consiste em produzir artificialmente uma fumaça espessa, cujo propósito é encobrir a visão dos oponentes para os enganar. Essa parece ser a estratégia adotada também pelo presidente Jair Bolsonaro e sua equipe nos seus primeiros meses de mandato. No campo de batalha das redes sociais, a substância escolhida para compor a fumaça bolsonarista é clara: a pauta dos costumes. Circulando por temas laterais, e muitas vezes até de foro íntimo/individual, a comunicação presidencial adotada nesse primeiro momento é uma arma importante para um governo que tem muito mais problemas a esconder do que realizações a exibir.
Longe da liturgia ou da seriedade que se espera de quem ocupa o cargo mais alto da república, o presidente tem dedicado grande parte do seu tempo a (tentar) incitar grupos mais radicais, facilmente atiçados pela pauta dos costumes. O ápice (ou fundo do poço) dessa estratégia ocorreu na semana passada, com a divulgação, via Twitter, de um vídeo com conteúdo sexual ocorrido durante o carnaval de São Paulo.
Apontada como uma tentativa clara de resposta às manifestações contrárias ao seu governo ocorridas durante o carnaval, nos quatro cantos do país, a cena escatológica repercutiu negativamente, tanto na mídia internacional, quanto dentro do governo. A impressão geral, obviamente, é a de que a postagem foi “desnecessária” e “de baixo nível”.
Devo lembrar, caro leitor, que enquanto o presidente se debruça em estigmatizar artistas, professores, formadores de opinião, imprensa, universidades e até o carnaval, boa parte da população brasileira ainda segue sufocada em questões básicas da existência humana. Questões como saúde, educação, emprego e moradia digna são as demandas mais reais e urgentes da sociedade. Vejamos alguns exemplos.
Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento para o ano de 2016, mostram que no Brasil ainda havia 35 milhões de brasileiros sem acesso à água e mais de 100 milhões sem coleta de esgoto.
O Indicador do Alfabetismo funcional de 2018, calculado para brasileiros entre 15 e 64 anos, apontou que 29% da população, cerca de 38 milhões de pessoas, são consideradas analfabetos funcionais. Isso significa que eles têm elevada dificuldade em compreender textos simples ou realizar operações matemáticas.
Segundo dados do IBGE, para o ano de 2017, havia 54,8 milhões de pessoas em situação de pobreza no Brasil (de acordo com a definição do Banco Mundial, são pessoas com renda de até R$ 406 por mês). Já a população na condição de extrema pobreza (com renda inferior a R$140 por mês) era de 15,3 milhões. Do total da população, 7,4% estavam abaixo da linha da pobreza no mesmo período.
O quadro é mais preocupante se lembrarmos da trajetória ainda errática da economia brasileira e mundial.
A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou relatório pouco animador, reduzindo as projeções de crescimento para quase todos os países do G-20. Esta é uma clara sinalização de que o ciclo de expansão da economia global está perto do fim.
Para o Brasil, a projeção de crescimento do PIB em 2019 foi revisada para baixo, de 2,1% para 1,9%. A OCDE, em setembro do ano passado, chegou a prever que, em 2019, o PIB brasileiro cresceria 2,5%.
Diante da cortina de fumaça que nos foi lançada nesses três meses, apenas uma coisa é clara: as demandas reais da população não serão solucionadas da maneira simplista e imediatista como tem sido proposto na gestão atual.
A resolução dos principais problemas nacionais exige foco, estudo aprofundado e planejamento estratégico de longo prazo.
Mas o que esperar de um governo que mal consegue se equilibrar em 280 caracteres?


[i] Estudante de Economia da UFPB e pesquisador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; jomarandradefilho@gmail.com).

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