quarta-feira, 21 de agosto de 2019

A desaceleração global


Semana de 12 a18 de agosto de 2019

Nelson Rosas Ribeiro[i]
           
Há mais de um ano que alertamos os nossos leitores para a formação das condições de uma nova crise na economia mundial. Nas últimas duas Análises que publicamos, os professores Lucas e Rosângela chamaram a atenção para os novos dados que confirmam a aproximação do fenômeno. As condições estão amadurecendo rapidamente e tudo indica que estamos nos aproximando do momento da explosão.
E não é sem tempo. Todos sabem, embora algumas ideologias econômicas tentem esconder, que a economia capitalista se move em ciclos de expansão e retração. São os chamados ciclos econômicos ou ciclos de Juglar que nós definimos como crises cíclicas de superprodução.
As estatísticas podem mostrar que estes ciclos tem uma duração de 7 a 11 anos, envolvem a maioria dos países capitalistas e ocorrem desde 1825. A partir dos anos 1970 eles passaram a ter uma frequência quase decenal, ocorrendo no início de cada década. O ciclo de 2010 resolveu antecipar-se dois anos e explodiu em 2008 envolvendo o Brasil um ano depois. Enquanto a economia mundial voltou a crescer, o que era previsível, a economia local continuou no buraco. Esta foi a nossa especificidade. Agora a nossa estagnação deverá integrar-se no novo mergulho que certamente nos arrastará.
Já dissemos antes e voltamos a repetir. Quando o bonde da economia mundial passa subindo a ladeira é possível embarcar ou não, mas quando ele passa descendo todos vão juntos. Coitado do Guedes e seus “Chicago oldies!”
Mas parece que estamos atrasados em nossas previsões. A colunista do Financial Times de Nova York, Rana Faroohar, desta vez nos antecipou. Para ela, o “crash” já começou só que os analistas fazem questão de não ver. Ela cita Ulf Lindahl, presidente executivo da consultoria AG Bisset Associates, que prevê a transformação dos mercados em um “bear market” e que teremos um “verão do medo”.
Com efeito, as notícias reforçam estas previsões. Na Ásia, EUA, União Europeia (UE) e China cresce o número de empresas-zumbi, aquelas cujos rendimentos não pagam o custo de suas dívidas. Do total de 26 mil empresas estudadas pela Nikkei com dados da consultoria QUIKFactSet, 20% não conseguem cobrir os custos de suas dívidas. Na Índia esta porcentagem era de 26%, na Indonésia 24% e na Coreia 18%.
No segundo trimestre a Alemanha informou que o PIB encolheu 0,1%, afetando toda a região do Euro, já abalada com a saída do Reino Unido (Brexit), cuja economia também encolheu 0,8%. Na China, o desemprego voltou a crescer e a economia desacelerou o que tende a piorar como consequência da guerra comercial com os EUA.
Os acontecimentos políticos abalaram as bolsas de valores que desabaram ao redor do mundo. Wall Street caiu 3,05%. O Índice de volatilidade VIX chamado “termômetro do medo” disparou subindo 26,14%. A bolsa de Londres recuou 1,42%, a de Frankfurt, 2,19% e a de Paris 2,08%. O índice pan-europeu Stoxx 600 caiu 2,6%.
A Organização do Comércio (OMC) publicou no “Barômetro do Comércio de Mercadorias” que o comercio mundial se encontra no seu mais baixo nível desde 2010. O índice apontou 95,7 (abaixo de 100 significa desaceleração). Também mostraram desaceleração os indicadores de transporte internacional de cargas (91,4), encomendas de exportação (97,50), venda de automóveis (93,5) e de produtos agrícolas (97,1). A OMC prevê que o terceiro trimestre também apresentará dados de desaceleração.
Há outro fenômeno de grande importância, mas que as manchetes não refletem. No mundo há US$15 trilhões de bônus que rendem juros negativos. Isto significa que os “investidores” pagam uma taxa para comprar os títulos em vez de receberem rendimentos. Isto representa cerca de 25% de todos os títulos emitidos pelos governos. O mundo está abarrotado de capitais, entupido. Diante da impossibilidade de aplicá-lo para obter rendimentos e da ameaça de perder tudo, os possuidores da riqueza, enlouquecidos, estão pagando para salvar pelo menos uma parte dela.
Eis a crise em marcha. Vão-se os anéis, mas fiquem os dedos.

[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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