quarta-feira, 16 de outubro de 2019

A realidade econômica que só o Paulo Guedes vê


Semana de 07 a 13 de outubro de 2019

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Enquanto esta coluna estava sendo produzida, o segundo partido em representação no Congresso Nacional, o PSL, continuava a “administrar” a crise interna gerada pelo seu principal integrante, o presidente da República. Flagrado em vídeo em que subliminarmente acusa o presidente do partido, Luciano Bivar, Bolsonaro sussurra a um apoiador que o Bivar “está queimado pra caramba”.
As pautas não prioritárias são a prioridade deste governo. O presidente, sua prole, seu partido, se regozijam na grosseria, na mania de perseguição e na apologia ao ódio em tudo o que fazem. Enquanto a população se distrai com as picuinhas governamentais, a dura realidade econômica se impõe. Internamente, as vendas do varejo estagnaram em agosto e o resultado decepcionou. O varejo restrito cresceu apenas 0,1% entre julho e agosto e o varejo ampliado (que inclui as vendas de veículos e material de construção) ficou estável. Para piorar, o IBGE revisou de 1% para 0,5% o crescimento das vendas do varejo restrito em julho.
Já o indicador de inflação oficial, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) caiu 0,04% em setembro. Três dos nove grupos que compõem o IPCA tiveram deflação. Os setores de Alimentação e Bebidas (com queda de 0,43%) e artigos de Residência foram os responsáveis pela deflação de setembro. A deflação melhora o poder de compra da população, mas pode ser um indicador de desaceleração econômica.
O fato é que todos os dias os dados dão uma rasteira na “recuperação gradual”. O mercado de trabalho ainda não se recuperou. A taxa de desemprego continua alta (11,8%), atingindo 12,6 milhões de trabalhadores. A pequena melhora do mercado de trabalho se deu pela ocupação de trabalhadores em atividades precárias. Além disso, o endividamento doméstico subiu pelo 9º mês seguido, chegando a 65,1% do total das famílias, segundo a Confederação Nacional do Comércio.
Ora, como se consolidará a tal recuperação? A esperança vem da “possível” recuperação do mercado de trabalho e da liberação de recursos das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Luiza Helena Trajano, presidente do conselho de administração do grupo Magazine Luiza, assegurou que o varejo já apresentou sinais de recuperação em setembro. Tendo como referência a sua rede, que vem apresentando desempenho acima da média do setor, ela vê “...uma luz no fim do túnel.”
Em nível mundial, a nova diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva em seu discurso inaugural, afirmou que a economia global está em uma desaceleração sincronizada. EUA, Japão, Zona do euro, Índia e Brasil, foram utilizados como exemplo. Mais de 90% dos países apresentam desaceleração este ano. O discurso serviu de alerta às autoridades globais para uma resposta caso a crise piore. Mas, a equipe econômica brasileira ainda não tomou conhecimento do fenômeno que se avizinha.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou, durante a abertura do Fórum de Investimentos Brasil 2019, que nossa economia, provavelmente, vai muito bem, obrigada. Em suas palavras: “Estamos com o crescimento subindo, a inflação descendo e retomando provavelmente agora um longo ciclo de crescimento. Num momento em que o mundo sincronizadamente desacelera, entrando em uma clínica de reabilitação após um período de excessos, o Brasil está saindo da clínica de reabilitação.”
Chamemos o Paulo Guedes à realidade. Primeiro, com os dados que temos até setembro, não dá para afirmar que estamos saindo da “reabilitação”.
Segundo, se a crise econômica global se concretizar, porque o ministro acha que a economia brasileira que está integrada ao mundo iria escapar de seus efeitos?
E por fim, Guedes elogia a política internacional do governo, dizendo que Bolsonaro “começou a revolução em relação ao que há de melhor no mundo ocidental”, já que “o presidente determinou desde o início uma aproximação com países que dão certo no mundo.” Como se não bastasse a crença de que tudo está/irá bem na economia, o ministro também confia que por osmose alcançaremos o desenvolvimento!

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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