Semana de 02 a 08 de dezembro de 2019
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
Não há qualquer mau agouro no título da presente
análise. É de conhecimento amplo a notícia de que a economia brasileira cresceu
nos últimos meses. Há diversas formas de mensurar esse crescimento: comparando
um trimestre contra o imediatamente anterior; o trimestre do ano presente com o
mesmo trimestre do ano passado; os últimos 4 trimestres com os 4 imediatamente
anteriores; o acumulado ao longo do ano...
Em todos esses comparativos da pesquisa divulgada
pelo IBGE, referente ao 3ª trimestre de 2019, cresceu a soma de tudo o que foi
produzido dentro das fronteiras do Brasil. Contudo, o olhar atento ao histórico
dos dados nos faz ligar um alerta para a consistência do que está sendo chamado
de “retomada do crescimento sustentado”.
Para começar, só agora o PIB brasileiro está melhor
do que o observado no começo de 2015. Ou seja, há um atraso de mais de 4 anos
na produção de hoje em relação à passada. Em segundo lugar, desde o fundo do
poço da crise, atingido no último trimestre de 2016, a economia brasileira não
foi capaz de chegar sequer a um crescimento acumulado de 2%. Aquilo que hoje se
chama de recuperação, na verdade é uma reprodução do pífio “crescimento”
econômico iniciado em 2017. Em terceiro lugar, isto é consequência da forma
como as políticas neoliberais foram aprofundadas desde 2015.
Historicamente, o Estado sempre participou
ativamente do processo de dinamização da economia brasileira. Dadas as nossas
particularidades históricas, dentre outros fatores, ele teve que atuar
diretamente em diversas atividades onde o setor privado não atuou (sobretudo,
por falta de interesse econômico). Por isso, boa parte das indústrias de base e
quase toda infraestrutura brasileira foi provida pelo Estado. Além disso, a
principal instituição de financiamento também tem origem estatal, a saber, o
BNDES.
Pois bem, diante desse fato secular e absolutamente
relevante, o que tem se tentado no Brasil é implementar a máxima do “menos
Estado e mais mercado”. A questão que se coloca, então, é: será que o Brasil
mudou tanto que, com a retirada do Estado de certos pontos da economia, o setor
privado vai passar a ocupá-los?
Falemos do setor de máquinas agrícolas, que nos 11
meses já transcorridos de 2019 viu suas vendas caírem 6,8% e a produção 15,4%.
Com as mudanças ocorridas no BNDES nos últimos anos, as linhas de crédito
subsidiado foram diminuindo. Como consequência, ficaram aquelas onde os juros
se aproximam das taxas de mercado (mais elevadas). Por isso mesmo, junto com
incertezas futuras, os produtores agrícolas reduziram a tomada de dinheiro
emprestado. Resultado, essa indústria fornecedora da agricultura reduziu suas
atividades.
Esse não é um problema isolado. Recentemente o presidente
da Confederação Nacional das Indústrias, Robson Braga de Andrade, manifestou
sua insatisfação com o sistema bancário nacional. Dentre os elementos que
embasaram sua crítica, estão os seguintes: o spread bancário no Brasil
(diferença entre o custo de captação de dinheiro pelo banco e a receita com os
empréstimos ao público) é o segundo maior do mundo (32%); a taxa de recuperação
judicial de crédito (aquilo que o credor consegue de volta do devedor na
justiça) é de apenas 14% (isto ajuda a encarecer os juros); a alta concentração
do setor bancário brasileiro, onde 5 instituições detêm 85% do total das
operações; e o fato de que o crédito total ofertado no país equivale a apenas
47% do PIB, enquanto no resto do mundo a média é de 130%.
Outro elemento importante, que vem do setor
industrial, é a necessidade dos investimentos em infraestrutura. Entre 2007 e
2018 os investimentos no setor somaram expressivos R$ 953,7 bilhões. Muitos dos
quais tiveram origem estatal, como os do Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC). Contudo, isto não foi suficiente. Segundo a Fiesp, entre os anos de 2019
e 2030, seriam necessários R$ 1,5 trilhão para se eliminar o déficit de
infraestrutura do país. Quem toparia investir, além do Estado?
Sem mencionar o desaquecimento da economia global,
dá para acreditar que com a atual gestão econômica esse crescimento é mesmo o
início de uma nova era?
[i] Professor
do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto
Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)
Não existe projeto de desenvolvimento no radar do Paulo Guedes.
ResponderExcluirO projeto é impulsionar o setor privado para preencher o espaço anteriormente ocupado pelo setor público.
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