Semana de 10 a 16 de fevereiro de 2020
Rosângela Palhano Ramalho
[i]
Caro leitor, o mundo continua lidando com as
consequências do surto do coronavírus que ameaçam se estender também à
economia. Empresas sediadas na China, onde o surto se iniciou, mesmo
autorizadas a voltar a produzir, prorrogaram férias e adotaram o trabalho
remoto. Escolas continuam fechadas e consultorias já começam a rever as
projeções para o crescimento daquele país. A doença já custou mais de um bilhão
de euros à Alemanha, por exemplo. O setor industrial alemão que vem
apresentando dificuldades pode liderar uma recessão na economia. Lá, já se
espera uma contração para o quarto trimestre de 2019 e o resultado do primeiro
trimestre deste ano é incerto, segundo levantamento feito pelo Deutsche Bank.
Enquanto isso, no Brasil, o governo, seus apoiadores
e alguns economistas, continuam surfando na onda de “otimismo” que eles mesmos
criaram. O presidente já declarou várias vezes que a economia “vai muito bem”.
Sendo assim, gasta seu tempo fazendo o que sabe efetivamente fazer: atacar de
maneira vil e rasteira jornalistas, oposição, ambientalistas e todos os que
considerar inimigos.
Os recentes números só respaldam a percepção
defendida em nossas análises anteriores. O cenário rosa que alguns querem
pintar mostra-se cinza, sua cor real. O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística), divulgou uma queda do varejo de 0,1% em dezembro em relação a
novembro, após sete meses seguidos de alta. O número retrata o recuo das vendas
no mês de Natal e deu uma rasteira no mercado que previa alta de 0,2% nas
vendas. Pelo segundo mês consecutivo, a realidade atropelou os “otimistas” e de
novo já se cogita que a recuperação pode não ser “tão sólida”. Como
consequência, o dólar bateu novo recorde e chegou a R$ 4,35. Só neste ano, o
dólar acumula alta de 8,4%, tornando o real a moeda que mais se desvalorizou no
período.
Como as coisas “estão indo muito bem”, o ministro da
Economia, Paulo Guedes, reafirmou durante esta semana que o real desvalorizado
é positivo para a economia e para as contas do governo. E de quebra,
“ilustrou”: “Não tem negócio de câmbio a R$ 1,80. Vamos exportar menos,
substituição de importações, turismo, todo mundo indo para a Disneylândia,
empregada doméstica indo para Disneylândia, uma festa danada. (...)”. Pessoas
de quinta, como os parasitas dos funcionários públicos e as atrevidas
domésticas que se aventuram na Disney, incomodam o Posto Ipiranga. E para
coroar seu ranço, lacrou (afinal está na moda): “Vai passear ali em Foz do
Iguaçu, vai passear ali no Nordeste, está cheio de praia bonita. Vai para
Cachoeiro do Itapemirim, vai conhecer onde o Roberto Carlos nasceu, vai passear
o Brasil...”.
Com seu profundo conhecimento do poder de compra das
domésticas brasileiras e sua grande sapiência em mercado cambial, o ministro
contribuiu para que a moeda estrangeira alcançasse um novo recorde, fechando a
R$ 4,38. O Banco Central, liberal que é, aplicou o liberalismo de Guedes e fez
uma intervenção surpresa no mercado de câmbio para conter a alta.
Enquanto o ministro se diverte, assim como seu
chefe, atacando pessoas, a divulgação do resultado do Índice de Atividade do
Banco Central (IBC-Br), que funciona como uma prévia do PIB, confirma a
fragilidade da economia brasileira. O IBC-Br registrou queda de 0,27% em
dezembro quando comparado a novembro e crescimento de apenas 0,89% em 2019.
Vale lembrar que a expectativa de crescimento oficial que estava prevista no
orçamento, era de 2,5%.
E, pelo visto, a situação só está piorando.
Levantamento feito pela Pesquisa Industrial Mensal do IBGE, mostra que apenas 3
dos 15 estados investigados apresentaram produção industrial acima do nível
registrado em 2013. Pará, com alta acumulada de 35,3% no período, Mato Grosso
com 10,4% e Santa Catarina com 0,2%, se destacam num cenário de piora da
produção industrial nacional que registrou queda de 1,1% em 2019, segundo o
IBGE.
Gostando ou não, esta é a realidade conjuntural da
economia brasileira, que sempre se impõe às grosserias, achismos e torcidas.
[i] Professora
do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização
e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br)
Contato: rospalhano@yahoo.com.br
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