Semana de 09 a 16 de março de 2020
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
Agora é oficial: a crise pela qual o Brasil passa já
virou a “Crise do Coronavírus”. Segundo Paulo Guedes, um dos ministros
anacrônicos de Bolsonaro, a economia estava saindo da crise quando veio a
pandemia e empurrou o Brasil ladeira a baixo. Ele afirma isto apesar do PIB do
país ter crescido, em 2019, menos do que em 2017 e 2018.
Não é novidade que o Estado brasileiro tem
apresentado déficit fiscal desde 2014. Apesar desta situação, o anacrônico
anunciou um conjunto de medidas de enfrentamento à crise. O valor totaliza R$
147,3 bilhões (com B). O leitor apressado logo diria: que ótimo! E é! Contudo,
e sempre há essa conjunção adversativa, isto não significa que as coisas
mudaram, de fato, na condução da política econômica brasileira.
Aos que não se lembram, em 2019 foram liberados
saques extraordinários do FGTS. Esta medida transferiu aos trabalhadores um
valor que já lhes era devido pelo Estado e que só seria pago em situações mais
restritas. Nada mais foi do que um adiantamento via flexibilização de regras.
Pois bem, 54,5% das medidas, só agora, anunciadas por Guedes são desse tipo.
Serão adiantados um total de R$ 46 bi do 13º dos aposentados (cada parcela em
momentos diferentes), R$ 12,8 bi serão adiantados do abono salarial e será
utilizado um total de R$ 21,5 bi do PIS/PASEP para reforçar o FGTS.
Tais medidas são aquelas que vão afetar diretamente
a capacidade de consumo de uma parte da população. A ideia é dar um “choque” na
demanda via antecipação do consumo. Isto seria possível com a liberação
antecipada de dinheiro. A questão do “seria” (futuro do pretérito) é a
seguinte: quem garante que o consumo será realizado, de fato, num país onde
deveria prevalecer a reclusão como forma de contenção do vírus? Claro que esse
dinheiro é muito bem-vindo. Mas sua efetividade é questionável. Além disso, que
dinheiro as pessoas vão usar no fim do ano, se boa parte do extra foi
adiantada?
Como forma de estimular a economia pelo lado da
oferta, algumas medidas também foram anunciadas. Um total de R$ 59,4 bi será
concedido às empresas através de alguns mecanismos: adiamento temporário do
recolhimento do FGTS (esse mesmo, que é direito do trabalhador e que não será
pago pelas empresas) e de parte do SIMPLES Nacional; redução do percentual de
recolhimento ao Sistema S (Sesi, Senai, Senac, Sebrae, etc.); e facilitação da
concessão de crédito via FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador, novamente o
trabalhador) a micro e pequenas empresas.
A ideia dessas medidas é fazer com que a facilitação
burocrática e a redução/suspensão temporária no pagamento de tributos garantam
o funcionamento das empresas e, consequentemente, a manutenção dos empregos.
Mas, novamente, como reagirão as empresas nesse momento em que a restrição do
ir e vir de pessoas é uma das medidas fundamentais para se preparar de forma
efetiva para a epidemia? Será que o trabalhador ser obrigado pelo patrão a ir
trabalhar, usando transporte coletivo e se aglomerando com os demais empregados
é realmente uma boa saída?
Falta ser detalhado um total de R$ 7,6 bi dos R$
147,3 bi. Por incrível que pareça, esse valor deve ser o mais efetivo para se
combater o Coronavírus. Para o fortalecimento do SUS, serão remanejados R$ 4,5
bi do DPVAT (aquele que Bolsonaro ia extinguir por conta de uma briga interna
no PSL). Isto corresponde a apenas 3,1% do total. Das medidas apresentadas até
aqui, nenhuma representa uma efetiva pressão sobre o orçamento estatal. Isto
porque significa remanejamento, adiantamento ou adiamento de valores.
Porém, inestimáveis R$ 3,1 bi (2,1% do total) serão
destinados à ampliação do Bolsa Família. Até aqui, esta é a medida que exige
maior “sacrifício” fiscal do governo, pois precisará tirar dinheiro de outro
lugar para que 1 milhão de famílias tenha acesso ao benefício. A outra medida
que exigirá “sacrifício” no orçamento estatal é a isenção de impostos na compra
de produtos médico-hospitalares. O custo disso não foi estimado.
A partir do que foi dito até aqui, podemos chegar à
seguinte conclusão: as prioridades no combate à “Crise do Coronavírus” são a
economia e o equilíbrio fiscal. De resto, como tem sido, o povo que se vire...
[i] Professor
do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto
Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com;
lucasmilanez@hotmail.com)
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