quarta-feira, 8 de abril de 2020

A crise do coronavirus


Semana de 30 de março a 05 de abril de 2020

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           
Aí está ela, devidamente batizada. Ninguém já lembra ou fala que está em marcha uma profunda recessão mundial, mais uma fase de crise do ciclo econômico que vinha sendo gestada há mais de 1 ano. Para os analistas dos movimentos de conjuntura o fenômeno perdeu a graça. Está completamente descaracterizado e, com tais especificidades, torna-se muito difícil analisá-lo. Boa razão tem o Ipea quando em seu documento “Visão Geral de Conjuntura” afirma que “Dado o ineditismo do choque sobre a economia mundial, fazer projeções macroeconômicas com nível razoável de confiança tornou-se tarefa muito difícil.”
Se bem que as formas de manifestação que assistimos na economia mundial e local sejam as mesmas de uma fase de crise cíclica, os acontecimentos seguem outra ordem. Em uma crise cíclica a economia para porque se produziu demais. A economia está saturada de capitais sob todas as formas: mercadoria, dinheiro, produtiva e financeira. Agora, embora a saturação pelo capital financeiro esteja presente, a produção está paralisada por falta de força de trabalho. Os trabalhadores, ou vão para os hospitais e morrem, ou ficam em suas casas e não trabalham nem consomem. E a sociedade não tem outra alternativa senão recomendar o isolamento social, pois o vírus é muito democrático, afeta burgueses e proletários. Os setores de serviços em geral, turismo, transportes, hospedagem, restaurantes etc., param totalmente. O setor informal desaparece. As fábricas vão parando. Sem rendimentos as pessoas limitam o consumo ao mínimo. Sem consumo, não há produção. Impõe-se a terrível realidade: sem proletários o capitalismo não existe.
Agora, urge salvar o sistema e para salvá-lo será preciso salvar a humanidade. Embora haja líderes religiosos, astrólogos e mesmo presidente que consideram que os fortes e puros (entre os quais eles se incluem) sobreviverão, com a graça do senhor Jesus. A demência primitiva dos terraplanistas, criacionistas que desprezam a ciência, cortam as verbas das Universidades e dos pesquisadores e perseguem os professores, contagia as camadas mais ignorantes da população. Charlatões e pregadores exploram a boa-fé das camadas mais pobres e marginalizadas. O mais espantoso é que pessoas com mais cultura e formação que não podem concordar com essa insensatez, calam-se e são cúmplices. Aí estão intelectuais, militares, capitalistas, profissionais liberais, políticos etc. O que os une é o sentimento de classe de defesa do capitalismo e esmagamento dos direitos dos trabalhadores. Eles terão de pagar o preço desta opção. A conciliação de classes está com os dias contados. A guerra está declarada. O inimigo comum coronavirus será dominado e a economia voltará ao seu rumo normal. Enquanto isso, como na música, vamos “escrevendo em uma conta pra juntos a gente cobrar, no dia que já vem vindo todo o mundo vai mudar”. Será a “volta do cipó de aroeira no lombo de quem mandou dar”.
Na economia local e internacional o quadro é desolador e tende a se agravar. A pandemia espalha-se nos EUA onde o número de desempregados já atinge 6% da força de trabalho. Em uma semana 6,6 milhões de trabalhadores pediram seguro desemprego. Na França, nas últimas semanas, o número de desempregados aumentou 4 milhões, 20% da força de trabalho. Na China, no primeiro trimestre, 500.000 empresas fecharam. São exemplos do que se espalha pelo mundo. Por cá a situação não é melhor. O presidente do Banco Central (BC) tornou sua a estimativa do The Economist Intelligence Unit de queda de 5,5% para o PIB do país. Antes, a estimativa era de crescimento de 2,4%. A bolsa de valores já perdeu R$1 trilhão e o déficit orçamentário previsto de R$124,1 bilhão subirá agora para R$419,2 bilhões, 5,5% do PIB. Todas as montadoras estão paradas e os trabalhadores informais que somam 117,5 milhões, ou seja 55% da população não têm rendimentos. O governo aprovou R$442,6 bilhões de amparo a trabalhadores e empresas na esperança de conter a queda na sua reprovação que passou de 26% (5/3) para 37% (1/4). É difícil prever como sairemos desta.

[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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