quinta-feira, 18 de junho de 2020

Crise e democracia


Semana de 08 a 14 de junho de 2020

Nelson Rosas Ribeiro[i]
          
A fase de crise do ciclo econômico em que nos encontramos continua em marcha, agravada fortemente pela covid-19. Este é a novidade da crise atual. Não é uma crise provocada pelo coronavírus, mas deflagrada e aprofundada por ele. Esta particularidade facilita a vida dos economistas oficiais pois os absolvem de qualquer culpa. O capitalismo foi atacado por uma enfermidade que lhe é externa. Foi um capricho da natureza ou uma punição divina pelos pecados da humanidade, a exemplo de Sodoma e Gomorra.
Nestas circunstâncias, analisar a conjuntura torna-se muito fácil. É só consultar o manual e lá está o que costuma ocorrer. Continuamos a lembrar que a crise já se apresentava a partir de janeiro, com a desaceleração da economia, que continuou em fevereiro e março. Como sabemos, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), que em 2019 foi de 1,1%, no primeiro trimestre de 2020, caiu para -1,5%. Esta queda não se deveu ao vírus que só começou seu ataque a partir de março. A partir daí, a covid-19 manifestou-se e a situação se precipitou. O curioso é que o “mercado” não viu isto. As previsões sobre as taxas de crescimento do PIB, feitas pelo Banco Central (BC), sem seu Boletim Focus, foram de 2,3% em 10 de janeiro, manteve-se em 2,3% em 7 de fevereiro, em 2,0% em 6 de março e só a partir de 10 de abril caiu para -2,0%. Parece que a ficha finalmente caiu. Estava instalado o terror. Em 8 de maio a previsão foi para -4,1% e em 5 de junho para -6,5%.
Por todos os lados o pessimismo cresce. Para o Banco Mundial (BM), a queda do PIB anual será de -8,8%. A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE) prevê uma queda de -7,4% mas, se houver uma segunda onda da covid-19, a queda será de 9,1%. No Brasil, os bancos estimam em -7,7%. O Ipea, em sua Carta de Conjuntura, propõe -6% sendo só no segundo trimestre uma queda de -0,5%. Para o segundo trimestre as quedas atingem quase todos os setores: Indústria -13,8%, serviços -13,8%, Investimentos -18,7%, Importações -14,9%, Exportações -10,9%, consumo das famílias -11,2% e do governo -0,8%. As consequências disto para o emprego são visíveis. Só em maio foram feitos 960,3 mil pedidos de seguro desemprego. Um crescimento de 53% em relação ao mês anterior.
Para o agronegócio a situação não é melhor. O Centro de Estudos em Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Agro) divulgou a queda de -5,1% no seu Índice de Produção Agroindustrial Brasileira (PIMAgro), em abril. As quedas foram de -5,8% para produtos alimentícios e bebidas, de -27,4% para produtos não-alimentícios e de -16,5% para a agroindústria.
A nível interacional a situação é igualmente adversa. O Federal Reserve (Fed), Banco Central americano, afirma que manterá suas taxas de juros próximas a zero diante da catástrofe econômica. A retração para a economia dos EUA é estimada entre -5,5% e - 7,5%, para o ano, e não se atingiu ainda o fundo do poço. O desemprego cresce e permanecerá elevado mesmo depois da retomada.
Tal quadro adverso deveria levar o governo a concentrar todas suas forças no combate à pandemia e na tomada de decisões para minorar os efeitos da crise econômica o que tem sido feito em todo o mundo. Infelizmente tal não ocorre. O presidente diverte-se continuando a sabotar o combate à enfermidade contribuindo com sua atitude irresponsável para a morte de milhares de brasileiros. Ainda lhe sobra tempo para fazer todo tipo de provocações aos outros poderes da república. Executa seu projeto de instalar uma ditadura, sob seu comando, apoiado por um bando de fanáticos fascistoides, cada vez mais armado, e por parte de uma burguesia extremamente reacionária. Chantageia ainda a sociedade com o apoio de um grupo de generais de pijama saudosista dos anos da ditadura militar dos anos 64 e que ainda não lavaram as mãos do sangue dos torturados e assassinados na época em que o exército esteve no poder.
Fácil é prever a evolução da economia: vai piorar. Difícil é saber o que ocorrerá com a nossa débil democracia tutelada por forças armadas reacionárias.

[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Daniella Gonçalo, Ingrid Trindade, Matheus Quaresma e Monik H. Pinto.

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