Semana de 15 a 21 de junho de 2020
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
No final de semana, ao noticiar a morte de mais de
50 mil pessoas pela covid-19, o Jornal Nacional da TV Globo iniciou enfatizando
que a “história fica para sempre”. Os fatos ficam marcados e mostram quem
enfrentou e quem se acovardou ou se aproveitou perante esse que deve ser o
maior desafio de uma geração.
Por exemplo, para termos uma dimensão do problema
nos EUA, em quatro meses o novo coronavírus já matou mais que o dobro dos
militares americanos mortos na Guerra do Vietnã, que durou mais de uma década.
No Brasil, como não temos um histórico de beligerância, tal comparação é
difícil. Mas, como somos um República Federativa, podemos comparar o número de
mortos no país com alguns entes da federação.
Se buscarmos quantas cidades com menos de 50 mil
habitantes o Brasil tem, chegamos ao número de 4.897. Ou seja, já morreram mais
pessoas do que a população de mais de 87,9% de todos os municípios brasileiros.
Se somarmos a população das menores cidades brasileira até totalizar 52.771
pessoas, chegamos ao número de 39 municípios. Ou seja, o número de mortos no
país até o momento em que estou escrevendo o presente texto equivale ao total
da população das 39 menores cidades brasileiras.
Apenas um lunático não reconhece que o Sistema Único
de Saúde brasileiro, o famoso SUS, foi e é o grande responsável por esse número
não ser ainda maior. Mas, será que a coisa poderia ter sido diferente, para
melhor?
Quando se falava lá no começo da pandemia acerca da
necessidade de realizar a quarentena e fazer o famoso achatamento da curva de
contaminação, dizia-se que o mais grave do covid-19 era o fato dele ser novo e
os sistemas de saúde não estarem preparados. Então, a quarentena era necessária
para que se desse tempo de aprontar os hospitais e as equipes de atendimento.
Como consequência, quase tudo iria parar: aulas, empresas, transporte público,
áreas de lazer coletivas, etc. Claro, o resultado seria um caos na economia,
justificável apenas pela situação crítica como a que estamos vivendo.
Mas quem iria pagar por isso? Os agentes privados.
Aí que entraram em ação os agentes públicos, capitaneados pelos governadores (e
não pelo capitão, como até hoje). Depois de verem algumas figuras se destacarem
mais do que o próprio presidente, Jair Bolsonaro e Paulo Guedes anunciaram uma
série de medidas para enfrentar a pandemia. As somas anunciadas ultrapassaram
R$ 400 bilhões. Contudo, depois de três meses de quarentena (cada vez mais mal
feita), vemos que os valores ainda não se tornaram realidade. Até aqui, foram
pagos apenas R$ 175,6 bilhões.
Para os ministérios, sobretudo o da Saúde (que não
tem ministro titular há mais de um mês), estavam previstos gastos na ordem de
R$ 50 bilhões. Até meados de junho, foram gastos apenas 26,4% desse valor
(lembrando que o governo federal só entregou, até agora, um hospital de
campanha). Do total de R$ 76,2 bilhões de auxílio federal aos estados e
municípios, foram repassados apenas 28,4%. Isto é ainda mais grave quando
lembramos que são esses entes da federação que estão no enfrentamento real à
pandemia. Com todos os problemas que já conhecemos, o auxílio emergencial tem
saído com algum grau de sucesso. E por falar em sucesso, apenas os R$ 900
milhões destinados à Conta de Desenvolvimento Energético foram 100% gastos.
Como já dissemos em análises passadas, está claro
que o presidente Bolsonaro está pouco interessado em ajudar a massa da
população brasileira. Porém, ele cada vez mais mostra que, de fato, é diferente
dos seus antecessores. Não por conta da sua “nova política”, que perde
completamente o sentido quando ele repete Michel Temer e compra o “centrão”
para não sofrer impeachment. Não por conta da moralização da coisa pública,
ainda mais desmoralizada na grotesca estória do “exílio” de Weintraub nos EUA.
O que dizer de Fabrício Queiroz ser achado na casa do advogado e conselheiro da
família Bolsonaro em Atibaia? Nem nisso parece ter originalidade...
Mas, o que o torna diferente? A diferença só “o
gado” consegue ver.
[i] Professor
do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto
Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com).
Colaboraram os pesquisadores: Daniella Alves, Ingrid Trindade, Matheus Quaresma
e Monik H. Pinto.
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