quarta-feira, 10 de março de 2021

O PIB da pandemia

Semana de 01 a 07 de março de 2021

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Em 2017, o PIB do Brasil cresceu em torno de 1,32%. Pelo lado da produção, a maior contribuição veio da atividade Agropecuária, responsável por 63,8% do crescimento da produção naquele ano. Isto ocorreu porque houve uma supersafra agrícola. Em seguida, vieram as atividades de Comércio e Indústria de Transformação, responsáveis por 23,8% e 23,0% do crescimento da produção em 2017, respectivamente. Pelo lado da demanda, quem puxou o PIB em 2017 foi o Consumo das Famílias, seguida das Exportações e dos Investimentos (sobretudo formação de estoques).

Em 2018, sem a supersafra, os setores que mais contribuíram para o crescimento da economia brasileira foram Outras atividades de serviços (que vão desde serviços especializados prestados a pessoas jurídicas até serviços domésticos e alguns “bicos”), Atividades imobiliárias e Comércio. Juntos, eles contribuíram com 73,2% do crescimento da produção. O quarto setor que mais contribuiu foi a Indústria de Transformação, com apenas cerca de 9,9%. Pelo lado da demanda, o Consumo das Famílias continuou sendo o carro chefe do PIB. Se bem que em 2018 todos os componentes puxaram o PIB para cima, com exceção das Importações: Exportações, Investimentos e Consumo do Governo.

Em 2019, antes mesmo da descoberta do novo coronavírus, já vínhamos chamando a atenção para a desaceleração da economia mundial (atentamos para isso ainda em 2018). As principais economias do mundo estavam entrando em “rota de pouso”. Como consequência, a contribuição das exportações para o crescimento do PIB do Brasil foi três vezes menor do que o observado em 2018 e quatro vezes menor do que em 2017. Quem puxou o crescimento do PIB brasileiro em 2019 foi o Consumo das Famílias, novamente. Outro componente da demanda que contribuiu positivamente foi o Investimento, tanto a Formação Bruta de Capital Fixo quanto os Estoques. Pelo lado da produção, continuaram como principais setores: Outras atividades de serviços, Atividades imobiliárias e Comércio, que juntos foram responsáveis por mais de 70% do crescimento.

Esse retrospecto serve para entendermos a dimensão do que ocorreu em 2020, com o PIB resultante da pandemia de Covid-19. Como já foi anunciado nesta coluna na semana passada, o PIB de 2020 caiu 4,1% e o valor adicionado pelos setores da economia (a produção em si) caiu 3,4%. Isto era de se esperar, pois inúmeros fatores “atrapalharam” o setor privado: isolamento social, adoecimento dos funcionários, redução da demanda... Mas surpreende o papel do setor público nesta queda.

Pelo lado da produção, dois setores se destacam como os principais responsáveis pelo tombo: Outras atividades de serviços e Serviços Públicos (gastos em Administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social). Isto é um formidável representante da política austericida e de caráter genocida que tem sido adotada por Jair Bolsonaro e Paulo Guedes. Por mais que se reduzam os gastos com alguns serviços públicos, contribuir com 21,0% na queda da produção do país é um dado alarmante. É uma contribuição menor do que Outras atividades de serviços, que contribuíram em 55,4% para a redução da produção, mas é mais do que a Indústria de Transformação, que ficou em terceiro lugar e foi responsável por 12,8% da queda.

Pelo lado da demanda a situação não foi melhor. Como era de se esperar, o componente interno que mais contribuiu para a queda no PIB foi o Consumo das Famílias. Em segundo lugar ficou o Consumo do Governo. Da queda de 4,1%, a redução dos gastos governamentais foi responsável por 0,94 pontos percentuais. Claro que não somos os EUA, mas, como comparação, lá foi anunciado um terceiro pacote de estímulos, de US$ 1,9 trilhão. Juntando com os outros dois do ano passado, os estímulos somam US$ 5 tri.

Enquanto isso, Bolsonaro defeca: “Chega de frescura, de mimimi. Vão ficar chorando até quando? Temos que enfrentar os nossos problemas”. A debilidade cognitiva é tamanha que ele não se dá conta de que ele próprio não enfrenta os problemas do país. Ou ele não quer enfrentar? E olhe que nem falei da vacinação...


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

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