Semana de 06 a 12 de dezembro de 2021
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
De uma
forma geral, os economistas gostam muito de manual. Isso é um fato! Neles podemos
encontrar as descrições e definições mais sintéticas e sistematizadas sobre
coisas fáceis e difíceis do cotidiano. Tudo muito bem apresentado e seguindo
uma lógica impecável.
Dentre
as “coisas de manual” está o entendimento de que o crescimento das economias
capitalistas (“economias de mercado” nos manuais) oscila entre fases de maior e
menor intensidade. Essas fases são: 1) crise, onde ocorre o desaquecimento da
atividade econômica (podendo até ser um decrescimento); 2) depressão, onde a
atividade chega ao nível mínimo; 3) reanimação, onde a economia volta a crescer
e intensifica-se a criação de produtos, emprego, renda, etc.; e 4) auge, onde a
atividade econômica atinge seu pico de crescimento e se preparam as condições
para uma nova reversão para baixo. Nesta sequência, isto se repete
incessantemente (historicamente, desde o começo do século XIX). Este é um dos
traços mais marcantes das economias capitalistas, elas se desenvolverem por
meio de um movimento cíclico, chamado de ciclo econômico.
Cada
uma das quatro fases citadas tem suas características. Como sugere o título da
análise, falaremos apenas das que definem a fase de crise. A primeira coisa é
inelutável: as crises no capitalismo são crises de abundância. A produção para
porque não tem a quem vender. Com isso os estoques sobem, o desemprego aumenta,
os preços caem, a renda também, a falta de confiança se generaliza, os bancos
dificultam a concessão de crédito, os juros se elevam e os calotes aumentam. A
crise se instala e o caos toma conta...
Certamente,
essa abundância não é absoluta, ou seja, a abundância não se refere à
totalidade das necessidades sociais. Também é uma característica do capitalismo
haver riqueza e miséria ao mesmo tempo. Nas
crises, os excessos (de produtos, de
capacidade produtiva, de dinheiro, enfim, de capital em suas variadas formas)
se referem à capacidade de compra da sociedade naquele momento histórico. De um
lado, há uma quantidade enorme de riqueza, mas, do outro, não há demanda
suficiente para absorver toda essa opulência. Por isso, as crises parecem se
manifestar como um desequilíbrio entre oferta, em excesso, e demanda, “em
falta”.
A
partir dessas descrições, podemos ver as peculiaridades da Crise da Covid-19.
Como dissemos algumas vezes nesta mesma coluna ao longo de 2019, a crise
econômica já estava começando a se manifestar antes mesmo da Pandemia. Porém,
como fator externo à economia e fora da lógica de funcionamento do capitalismo
(apesar de, provavelmente, ser um produto deste), o coronavírus veio para
“esculachar” os manuais.
A
primeira coisa é que as necessárias e indispensáveis medidas de isolamento
social para a contenção da contaminação resultaram numa piora muito mais
intensa na produção, nos empregos, na renda, nos preços, etc. Do ponto de vista
do desequilíbrio entre oferta e demanda, o que antes era uma falta relativa de
demanda se tornou, também, numa redução drástica da oferta. Como medida
compensatória, os Estados Nacionais passaram a distribuir renda para a
população. Isto fez com que a demanda voltasse a ter poder aquisitivo, mas
ainda sem haver uma oferta capaz acompanhar. Por isso e por muita especulação,
os preços de produtos básicos voltaram a subir (commodities), elevando também
os preços de quase todos os outros produtos (inflação no mundo todo). Com o fim
das primeiras ondas da Pandemia, a produção foi se “normalizando” em alguns
setores, mas não em outros. Por isso mesmo, aquilo que era pra ser um excesso
geral de oferta sobre a demanda (uma crise “normal”) foi se transformando em
uma demanda aquecida com falta de produtos essenciais para a vida cotidiana
(insumos da tecnologia da informação e navios de carga, por exemplo). Não é
nenhuma novidade o desmantelo das cadeias produtivas globais. Soma-se a isso o
fato de que novas variantes têm causado novas ondas de contaminação, fazendo
com que novas medidas sejam adotadas e, novamente, as economias sejam afetadas.
Diante deste cenário, não há mais o que discutir: ou se faz o controle devido da pandemia ou a crise econômica jamais será controlada. A não ser que você seja um jumento de faixa presidencial ou um hipócrita chefiando o ministério da saúde.
[i] Professor
do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e Coordenador do PROGEB –
Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com).
Colaboraram os pesquisadores: Nertan Gonçalves, Mariana Alves, Roberto Lucas e Guilherme
de Paula.
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