sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Estagflação e crise do coronavírus

 Semana de 13 a 19 de dezembro de 2021

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

Nas duas últimas Análises discutimos dois assuntos controversos que caracterizam a situação atual: a estagflação e a crise. O Professor Lucas apontou algumas peculiaridades da chamada “crise do covid” mostrando que ela é uma crise econômica com peculiaridades especiais. No capitalismo as crises econômicas são crises de superprodução. Superprodução de capital sob todas as formas: mercadoria, produtiva e financeira. A sociedade entra em crise por ter criado riqueza demais. Isto não significa que todas as necessidades estejam satisfeitas. Nas condições do capitalismo, só consome quem tem dinheiro e as relações capitalistas de produção se encarregam de produzir uma gigantesca concentração de renda que empobrece os possíveis consumidores.

A crise manifesta-se pelo acúmulo de mercadoria que não encontra consumidores. Com o covid as coisas mudaram e novas características apareceram como bem referiu o Professor Lucas na Análise passada. Isto por si já é inusitado e dificulta o trabalho dos estudiosos. Com este novo tipo de crise surgiu, porém, outro problema: a inflação. Segundo a teoria oficial a elevação dos preços só ocorre quando há uma grande pressão da procura que a oferta não consegue atender. Mas uma pressão de demanda muito forte estimula os empresários a aumentar a produção. Por outro lado, esta demanda é resultado de pleno emprego e salários elevados, ou seja, quando o desemprego é muito baixo. O nosso caso é o oposto. Temos uma grande massa de desempregados, de subempregados, de desalentados e os salários são muito baixos. O número de pobres e miseráveis cresce, a fome se alastra e os empregos informais e de baixa qualidade com baixos salários superam os empregos de melhor qualificação e mais bem remunerados. Apesar disso a inflação continua a disparar. Eis o mistério que o sinistro Guedes e sua equipe de “Chicago oldies” não consegue decifrar.

O Banco Central (BC) comandado pelo Roberto Campos Neto, (neto do conhecido Roberto Campos chamado de Bob Fields nos velhos tempos pela sua subserviência aos americanos) e leitor da mesma cartilha, arranca os cabelos. Aplica a única receita que sua ideologia econômica lhe recomenda: a elevação dos juros. Os documentos do próprio BC reconhecem que as maiores causas da inflação atual, vêm do exterior ou de fatores naturais: preços das commodities (petróleo), crise hídrica, preços da energia, entraves ao comércio internacional, pandemia do covid, etc., sobre os quais os juros não exercem qualquer efeito. Por outro lado, sabem também que a elevação dos juros dificulta o financiamento dos negócios e entrava a retomada da produção. Mesmo assim, na sua demência ideológica prometem continuar a elevação da Selic até “ancorar as expectativas” dos agentes que deixariam de subir os preços. É isto que devemos esperar nos próximos tempos: juros contra o coronavírus, São Pedro e as condições climáticas, o comércio mundial etc.

Passemos então à parte mais chata da nossa análise. O que mostram os dados da semana? Citaremos apenas os que se referem às questões tratadas anteriormente.

As previsões de bancos e consultorias dizem que o BC vai elevar a Selic, dos atuais 9,25 para 11,75% ao longo de 2022 provocando aumento do custo fiscal para o setor público e dificultando empréstimos e financiamentos com consequências negativas para a recuperação da economia. Lembremos que em janeiro a Selic era 2%.

A Câmara Brasileira da Indústria de Construção (CBIC) estima que o PIB do país em 2022 terá crescimento entre 0,5% e 1% e que o PIB da construção civil cairá dos 7,6% atuais para 2% no próximo. O endividamento dos consumidores chegou a 60% em agosto e tende a piorar. A queda da renda do trabalho chega a -6,5% em 2021 Também na agroindústria, nosso carro chefe, a situação é grave. A FGVAgro divulgou seu índice PIMAgro para outubro mostrando queda na produção de -11,3% em relação a 2020. Estre as causas apontadas estão juros, inflação, covid, aumento de custos de produção, mercado de trabalho fraco. Todos consideram que a inflação continuará a crescer o consumo com a produção a cair e o desemprego aumentar. Eis a estagflação. Juros nela!  


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Alan Gomes, Ana Isadora Meneguetti.

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