Semana de 02 a 08 de maio de 2022
Nelson Rosas Ribeiro[i]
Desde os finais do século passado,
particularmente a partir da década de 60, os economistas debatem o fenômeno da
inflação, tão terrível que já foi associado à figura de um dragão. O dragão da
inflação tem sido combatido, mas é considerado invencível. Ninguém se propõe a
exterminá-lo, mas a domá-lo, controlá-lo. Terminada a guerra observa-se que o
fenômeno se tornou inerente à economia capitalista. Depois dos anos 70, porém,
este dragão sofreu uma mutação: transformou-se em uma hidra, a hidra da
estagflação, muito mais terrível. O processo inflacionário se caracterizava
pela elevação generalizada dos preços, mas acompanhada da expansão da economia.
Havia o aumento da produção. Para isto, a duras penas, a ideologia econômica
oficial encontrou um remédio: a taxa de juros. O manual diz que quando a
inflação aumenta eleva-se a taxa de juros. Quando a inflação diminui, reduz-se
a taxa de juros. Como eles acreditam que a inflação é causada por excesso de
demanda em relação a oferta, a solução é comprimir a demanda. Com a elevação
dos juros dificultam-se os investimentos e o financiamento ao consumo. Com a
redução da demanda os preços caem. É simples assim.
A partir dos anos 70 esta lógica é
subvertida. Surge um aumento de preços, mas acompanhado de uma queda na produção
e no consumo por falta de consumidores. A demanda encontra-se deprimida. Com a
economia em desaceleração, desemprego e baixos salários, acentua-se a queda da
demanda, mas, para surpresa de todos, os preços continuam a subir. É inflação
na desaceleração. É a hidra da estagflação. Como diz a diretora gerente do FMI
Kristalina Georgieva, “o crescimento cai e a inflação aumenta”, “a renda das
pessoas cai e as dificuldades aumentam”.
Com o seu fanatismo ideológico as
autoridades dos bancos centrais aplicam a única receita que a bíblia indica: os
juros. Foi isto que ocorreu na recente reunião do Copom, órgão do Banco Central
do Brasil (BC) encarregado da gestão da moeda e controle dos preços. Decidiram
elevar a taxa Selic, taxa de juros de referência do governo, para 12,75% ao
ano. Lembremos que em agosto de 2020 ela era 2%. Curiosamente o próprio BC
afirma que a inflação no país é decorrente da pandemia do covid-19, do
consequente desequilíbrio entre oferta e procura, do surto de covid na China,
com os lockdowns e da guerra na Europa com a invasão da Rússia, todos fatores
externos. Perguntaria o desavisado: e como a taxa de juros elevada pode afetar
estes acontecimentos? A China, o covid, a Rússia, todos tremem diante da
autoridade do BC brandindo ameaçadoramente sua poderosa taxa Selic?
Nesta marcha, sob o comando do sinistro da
economia Paulo Guedes, e sua equipe de “Chicago oldies”, a recuperação da
economia que se esboçava, abortou. Quais os prognósticos então? A economia vai continuar desacelerando, a inflação
prosseguirá esmagando a capacidade de consumo das pessoas, a situação econômica
do país vai piorar. Tudo isto agravará a avaliação do governo e influenciará o
resultado nas urnas.
O ambiente internacional vai evoluir na mesma direção. Diante das proclamações e decisões da União Europeia e da NATO a guerra vai continuar até o último ucraniano. Como bem diz Martin Wolf, editor e principal analista de economia do Financial Times, “O objetivo da política econômica é apoiar o esforço de guerra”. “O desafio é defender a civilização liberal da Europa.” É nestes termos que a situação está sendo tratada na Europa que, praticamente já está em guerra para destruir a Rússia. Apenas algumas organizações internacionais continuam a alertar para o perigo que se aproxima. A Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) cortou suas previsões para o crescimento do PIB mundial de 3,6% para 2,6%. Chamou a atenção para o perigo do aumento da insolvência e da crise global, paralização do desenvolvimento, aumento da inflação e da fome e surgimento de conflitos e revoltas. É neste clima que caminhamos para as eleições seriamente ameaçadas. Sinceramente, não acreditamos que o monstro e sua matilha esperarão sentados a derrota e marcha para a prisão. Não é por acaso que já aparecem nos veículos com bandeirinha o cartaz “Recuar jamais”.
[i] Professor
Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na
Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram
os pesquisadores: Guilherme de Paula, Ana Isadora Maneguetti, Mariana Araújo e Nertan Alves.
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