quinta-feira, 5 de maio de 2022

PNAD contínua vs Copom

Semana de 25 de abril a 01 de maio de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida[i]

           

De acordo com a PNAD contínua de abril, que traz os dados sobre janeiro, fevereiro e março de 2022, no Brasil havia 11,95 milhões de brasileiros desocupados, 8,35 milhões que se encontravam na chamada “força de trabalho potencial” (pessoas que desejavam trabalhar, mas, por algum motivo, estavam fora do mercado de trabalho) e outros 6,51 milhões de subocupados por insuficiência de horas trabalhadas. No total, foram 26,81 milhões de brasileiros que poderiam estar contribuindo para a geração de riqueza no Brasil, mas que não puderam fazê-lo no primeiro trimestre de 2022.

Segundo a mesma PNAD contínua, a média do rendimento nominal das ocupações no Brasil foi de R$ 2.584, um valor inferior ao observado no mesmo período de 2021 (1º trimestre), quando o rendimento médio foi de R$ 2.789. A queda foi registrada em todas as categorias, desde o serviço público ao trabalhador doméstico com carteira assinada. A única elevação foi na remuneração mensal do trabalhador doméstico sem carteira assinada, que aumentou em R$ 14, chegando a um total de R$ 870. Olhando para as remunerações pela ótica da atividade econômica, apenas os ocupados na agropecuária e da construção civil tiveram aumento no rendimento médio mensal habitual: R$ 29 e R$ 113 a mais na comparação entre os primeiros trimestres de 2021 e 2022, respectivamente. As ocupações que perderam na remuneração mensal foram as da Administração Pública (-R$ 671), da Indústria (-R$ 198) e de alguns Serviços prestados às Empresas (-R$ 175).

Pois bem, esse é o contexto onde se dão os preparativos para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom). Nesta reunião, é dada como certa a elevação na taxa básica de juros brasileira, que deve chegar a 12,75% ao ano. Como já dito nesta coluna em ocasiões anteriores, o motivo da elevação da Selic é sempre o combate à inflação, que chegou a 12,03% nos 12 meses encerrados em abril desse ano (pelo IPCA-15). Como agravante, dos 367 itens pesquisados, 289 tiveram aumento no mês de abril, ou seja, há uma difusão no aumento dos preços.

Obviamente, a inflação é péssima para a população, ainda mais ela superando os dois dígitos. O motivo é que isto piora o consumo da classe trabalhadora em geral, mas mais ainda o das classes mais baixas (D e E), que já representam mais de 51% dos domicílios brasileiros. Segundo o boletim Salariômetro da FIPE, apenas 17,7% das negociações coletivas realizadas entre abril de 2021 e março de 2022 resultaram em aumento salarial superior à inflação medida pelo INPC. Enquanto isso, para 35,6% das negociações, os aumentos foram iguais à inflação e, para 46,7%, a inflação aumentou mais do que o salário.

Como desgraça pouca é bobagem, há a possibilidade de os gargalos nas cadeias globais piorarem, tanto por causa da guerra entre Rússia e Ucrânia, quanto pela política de covid zero e lockdowns da China. Além disso, os EUA estão aumentando seus juros básicos, o que leva os especuladores daqui pra lá e encarece o dólar. Isto deve piorar a “inflação importada”, aquela que é causada por motivos externos ao Brasil. Por sua vez, no cenário interno, o Índice de Preços ao Produtor cresceu 3,13% apenas em março de 2022. Dentre os “vilões” dessa fortíssima inflação de custos estão: os derivados do petróleo, os alimentos, a indústria extrativa e alguns produtos químicos. Tudo isso na esteira de uma elevação de preços ao consumidor que ainda não dá sinais de cessão. Muito pelo contrário. Segundo o jornal Valor, há uma tendência para manter o repasse da elevação dos custos, tanto pelas indústrias quanto pelas empresas do comércio varejista. A previsão é de aumentos desde o aço à geladeira, dos eletrônicos aos refrigerantes, de nacionais à multinacionais.

Voltando ao Copom, sabendo que a inflação atual não tem sua origem em um excesso de demanda, peço que o caro leitor reflita: para além de melhorar a vida dos rentistas, aumentar os juros vai ajudar em que o Brasil?


[i] Professor do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Maria Cecília Fernandes, Eduardo Oliveira e Alan Gomes.

Share:

0 comentários:

Postar um comentário

Novidades

Recent Posts Widget

Postagens mais visitadas

Arquivo do blog