Semana de 01 a 07 de agosto de 2022
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
Talvez
inspirado no sucesso que tem feito o remake de “Pantanal”, o governo federal
inventou sua própria versão de um programa já consagrado: o Auxílio Brasil. Com
diferenças pontuais, esta é uma versão diferente do programa Bolsa Família (que
já é um remake turbinado, tipo Vingadores, de outros programas de transferência
de renda). Como valor base, será pago R$ 400 às famílias em situação de pobreza
e extrema pobreza.
Por
sua vez, como já foi extensamente noticiado, foi aprovada uma legislação
(apelidada de PEC Kamikaze) que garantiu um valor adicional de R$ 200 para o
programa. Com isso, será dado um valor mensal mínimo de R$ 600 para cerca de 20
milhões de famílias brasileiras até dezembro de 2022. Fazendo algumas contas
por cima, o Auxílio Brasil vai distribuir mais de R$ 12 bilhões por mês entre
agosto e dezembro. No total, serão transferidos mais de R$ 60 bilhões até o fim
do ano de 2022.
Com
isso, o governo dá o necessário auxílio a uma parte da população mais
necessitada. Mas, em governo de Bolsonaro e Guedes, o que se dá com uma mão, o
setor financeiro pega com a outra. No dia 04 de agosto foi publicada a Lei
14.431/22, que possibilita aos beneficiários do Auxílio Brasil realizarem
empréstimos consignados (modalidade que retira o dinheiro direto na origem, sem
nem passar na mão do devedor) em que as parcelas não ultrapassem 40% do valor
base mensal (R$ 400). Isto significa que uma família poderá pedir um empréstimo
em que a parcela do pagamento chegue até a R$ 160.
O
resultado disso é que parte considerável do Auxílio será desviada para os
bancos e outras instituições financeiras. Para piorar, o governo federal não
estabeleceu um teto para os juros que serão cobrados. Cada banco cobrará o
quanto quiser e o tomador terá que pechinchar. Porém, na correlação de forças
entre bancos e beneficiários, não é difícil prever o vencedor da barganha sobre
o tamanho dos juros.
A
questão é que, para receber o Auxílio, uma família deve ter renda per capita
(renda total dividida pelo número de familiares) entre zero e R$ 200. Ou seja,
quem vai receber o benefício são pessoas com baixíssima ou nenhuma renda e, por
isso, com o consumo reprimido. Os bens que já lhes faltam são bens não-duráveis
(alimentos, bebidas, vestuário, calçados, limpeza, higiene, etc.) e,
principalmente, bens duráveis (eletrodomésticos, eletrônicos, móveis, etc.).
Vamos
supor uma situação conservadora, onde uma família pega emprestado R$ 1.200 para
dar uma melhorada na casa. Considerando uma taxa de juros razoável para os
padrões brasileiros, de 50% ao ano, em 12 meses a família teria que pagar ao
banco um total R$ 1.800. Desse, R$ 1.200 seria a devolução do empréstimo e R$
600 os juros. Por mês, o valor seria de R$ 150, sendo R$ 100 de valor devido e
R$ 50 de juros. Com isso, até o fim de 2022, o valor do Auxílio que ficaria na
mão do beneficiário seria de R$ 450. De janeiro de 2023 até o fim do pagamento,
restaria apenas R$ 250 por mês.
Diante
da possível queimação de filme que é participar de um golpe desses (endividar e
comprometer a renda dos mais pobres entre os pobres do Brasil), alguns dos
maiores bancos privados que operam no país não vão participar desta sacanagem.
Segundo a grande mídia, Bradesco, Itaú, Santander, Nubank e BMG já tiraram o
time de campo. Mas, se individualmente alguns não entram, há aqueles que
representam a clássica posição social de banqueiro: extrair dinheiro de quem
quer que seja, doa em quem doer. O Banco Safra, por exemplo, já tem página só
pra isso (link).
E o
que isso tem a ver com as eleições? Tudo! Com os empréstimos as pessoas compram
bens que não poderiam naquele momento, fazem a economia girar. O PIB do
comércio cresce. Talvez, estimule até alguns setores produtivos. Bolsonaro acha
que respira nas eleições.
Mas, o que acontece aos pobres endividados no futuro? Para Bolsonaro e Guedes pouco importa (nunca importou), pois a partir de 2023 eles não estarão mais no poder.
[i] Professor
do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e Coordenador do PROGEB –
Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com).
Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan
Gonçalves.
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