quinta-feira, 25 de agosto de 2022

A fome e a nossa elite, têm jeito?

Semana de 15 a 21 de agosto de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Em outubro do ano passado, publicamos uma análise de conjuntura intitulada “O capitalismo e a fome” (https://progeb.blogspot.com/2021/10/o-capitalismo-e-fome.html). Nela, o leitor pode ver argumentos que mostram como a fome é um elemento que está na base do capitalismo. É o medo de passar fome que obriga uma pessoa a submeter seu trabalho a outras, tais como, Luciano Hang, popularmente conhecido como “véi da Havan”, e Marco Aurélio Raymundo, o “famoso” Morango da Mormaii.

No texto de hoje, vale a pena focar nos sintomas que atualmente influenciam, não só a fome no Brasil, mas a insegurança alimentar em geral.

O primeiro é um “velho” e indesejado conhecido, a inflação. Mesmo com a queda no índice de inflação entre junho e julho passados (queda de 0,68% no IPCA), o total da cesta de alimentos que são consumidos em casa (cereais, legumes, farinhas, frutas, verduras, carnes etc.) teve aumento de preço (1,47%). Este movimento se confirma com a divulgação do IPCA-15 (que é uma prévia do IPCA) pelo IBGE. O indicador registrou uma redução geral de 0,73% nos preços consultados entre os dias 16 de julho e 15 de agosto. Porém, no item Alimentação no domicílio, a subida de preços foi de 1,24%. Pelo IPCA-15, os alimentos consumidos em casa ficaram 17,4% mais caros em 12 meses.

O segundo fator que influencia o bolso e a barriga dos brasileiros são as negociações salariais. De acordo com o DIEESE, 47,3% dos reajustes salariais celebrados no mês passado foram menores do que a inflação (medida pelo INPC). De janeiro a julho de 2022, apenas 20,7% das negociações foram capazes de trazer ganhos reais para os trabalhadores (nesses casos, o salário aumentou mais que a inflação). No mesmo período, em 43,9% das negociações o aumento salarial foi menor do que o aumento dos preços. Como agravante, já que o setor é o maior em termos de emprego e PIB, os trabalhadores do setor de Serviços tiveram perdas reais de salário em 52,6% das negociações.

O terceiro fator que gera insegurança alimentar na população é a informalidade. Como mostrou a última PNAD Contínua, há 34,7 milhões de pessoas na informalidade. Isto significa que elas não estão resguardadas por qualquer direito trabalhista, tais como férias, seguro-desemprego, FGTS, previdência, 13º salário e outros mais. Isso corresponde a 40% dos trabalhadores brasileiros. Para além destes, tem os microempreendedores individuais, que são pessoas com CNPJ, mas que na maioria das vezes tem renda próxima de um ou dois salários-mínimos, não emprega ninguém além dele próprio e não goza de direitos trabalhistas.

Por fim, mas não menos importante, estão os beneficiários dos programas assistenciais, em especial os do Auxílio Brasil. São pessoas que estão em situação de pobreza ou extrema pobreza e que têm de se virar com um recurso que, por enquanto, é de R$ 600. Nas capitais analisadas pela Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos do DIEESE, apenas em Aracaju (R$ 542,50), João Pessoa (R$ 572,63), Salvador (R$ 586,54) e Natal (R$ 587,58) este valor é suficiente para comprar a cesta básica de alimentos. Mesmo assim, não devemos esquecer que esse dinheiro também serve para pagar aluguel, água, energia, transporte, medicamentos, vestuário etc.  Por sua vez, em outras 13 capitais pesquisadas, a cesta básica de alimentos custa mais do que o benefício (sendo a mais cara em São Paulo, que sai por R$ 760,45).

Voltando à análise que citei no início do texto. Lá meu argumento foi de que o medo da fome (não só de alimentos, mas de não consumir tudo o mais que precisamos para viver) impele os trabalhadores a venderem sua força de trabalho. Isto faz parte do capitalismo em qualquer lugar do planeta. Mas, no Brasil a coisa é pior. Por aqui, para além dessa característica comum aos demais países, a atividade econômica não é capaz de gerar oportunidades para uma sobrevivência digna de seus trabalhadores.

Para completar, parte da elite econômica fica aí, tentando armar golpe em grupo de zap. Será que o projeto deles é melhorar a vida do trabalhador?


[i] Professor do DRI/UFPB e do PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Gonçalves.

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