Semana de 24 a 30 de outubro de 2022
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
Como é
bem sabido por todos, incluindo o gado derrotado e solto nas estradas do
Brasil, Lula foi eleito com mais de 60 milhões de votos. A diferença percentual
foi a menor da história: 50,9% para Lula, o futuro Presidente, contra 49,1%
para Bolsonaro, o futuro ex-Presidente. Mas, será que a diferença foi mesmo tão
pequena? Para responder a essa pergunta, o resultado das urnas deve ser lido
com atenção.
Como
vem sendo destacado por alguns analistas, o pleito foi o mais injusto desde a
redemocratização (quiçá de todos os tempos). Os motivos são diversos, uns mais
e outros menos flagrantes. Em outra ocasião (link), já havíamos mostrado como Jair
Bolsonaro cercou o Supremo Tribunal Federal e cooptou o Congresso Nacional.
Isto começou desde que assumiu o Executivo, em 2019. O fato é que,
premeditadamente ou não, com isso ele teve condições de fazer o que fez antes e
durante essas eleições.
Nos
dois primeiros meses de 2022, os institutos de pesquisa apontavam uma grande
rejeição à Bolsonaro (mais de 60%). Entre março e abril, houve uma redução
dessa rejeição. Até então, o principal instrumento utilizado para garantir sua
reeleição foi o orçamento secreto (criado anteriormente para barrar um provável
impeachment). Porém, como nada de diferente dos anos anteriores foi feito,
entre maio e junho houve uma manutenção da rejeição ao Presidente. Foi quando
anunciaram o Auxílio Brasil no valor de R$ 600 e o aumento do Vale Gás. Em
julho o Congresso aprovou tais benefícios, junto com os auxílios a taxistas e
caminhoneiros. Além disso, foi aprovada a PEC que reduziu o ICMS sobre alguns
produtos básicos. Os benefícios começaram a ser pagos entre julho e agosto. Por
sua vez, a inflação caiu por conta da redução dos tributos sobre os
combustíveis. Nesse meio tempo, a rejeição a Bolsonaro caiu de novo.
Esses
foram os fatores que deram a Bolsonaro uma chance de competir contra Lula e
evitaram uma derrota já no 1º turno. Porém, o segundo lugar mostrou que essas e
outras medidas, implementadas de um jeito jamais visto na história da
República, foram insuficientes. Era preciso ainda mais para fazer alguns
milhões de brasileiros esquecerem o que ocorreu entre 2019 e 2021: os quase 700
mil mortos pela covid-19, a fila do osso, a bandeja de pé de galinha, a
inflação, a desmoralização internacional, enfim... Por isso, entraram em cena
mais fake news, bem como a participação de celebridades evangélicas,
sertanejas, esportistas, ex-BBBs e todo o resto. Além disso, mais medidas de
ordem econômica foram adotadas: crédito e renegociação de dívidas via Caixa
Econômica Federal; aumento do salário-mínimo; pagamento de 13º para
beneficiárias do Auxílio Brasil; liberação de FGTS futuro etc.
Esse é
o contexto que gerou a diferença de 2.139.645 votos entre Lula e Bolsonaro: uma
parte da população votou nele porque suas condições materiais melhoraram, mesmo
que temporariamente. Mas, não podemos deixar de reconhecer que há uma parcela
significativa da população que apresenta elementos fascistóides. No entanto,
ela é uma parcela bem menor do que os 58 milhões de votos em Bolsonaro. Isso
pode ser visto nas patéticas manifestações iniciadas após o anúncio do
resultado de domingo, com o fechamento de estradas em quase todo o país. Isto
só “prosperou” por conta das milícias fardadas infiltradas nas forças de
segurança federais e estaduais. Os metalúrgicos de Angra dos Reis, as torcidas
organizadas Gaviões da Fiel e Galoucura e os moradores de São Mateus (ES) já
mostraram que esses movimentos golpistas são apenas “mimimi” e “frescura” de
quem vai chorar até sei lá quando.
De uma forma geral, o que tomou conta de parte não desprezível dos eleitores de Bolsonaro foi o medo do “Brasil virar uma Venezuela”. Os anos de 2003 a 2010 mostram que Lula está bem longe disso. O máximo que podemos esperar, infelizmente, é um desenvolvimento capitalista nos moldes de um modelo liberal e periférico, nada mais. Sem dúvida, isto será muito melhor do que o que vivemos desde 2019. Por isso, podemos dizer: a esperança venceu a barbárie. Vamos aprender novamente o que é a democracia.
[i] Professor
do DRI/UFPB e do PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com).
Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan
Gonçalves.
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