quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

“Nenhuma bomba explode sem um estopim”

Semana 09 a 15 de janeiro de 2023

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

Depois dos brutais acontecimentos da destruição da praça dos três poderes, as coisas começam a voltar à normalidade. Se é que se pode falar em normalidade em um país tão anormal como o nosso. As apurações e inquéritos estão em andamento, com algumas prisões, bloqueios de recursos, buscas e apreensões e tudo a que se tem direito. Mas, a justiça se move com a costumeira lentidão. Diz-se por aí que a justiça tarda, mas não falha. Esperemos que assim seja.

Como costuma acontecer, os baderneiros, cercados de advogados, choram e protestam pelos seus direitos. Aqueles mesmos que afirmavam dias atrás que “bandido bom é bandido morto”. Há que se destacar que a repressão aos vândalos foi branda e educada e tecnicamente muito bem-feita, sem mortos e poucos feridos. Diferente seria, provavelmente, se eles fossem estudantes, professores, operários ou gente do MST. Curioso é que a maior parte dos marginais presos o foi no acampamento do quartel do exército em Brasília. Conclui-se logicamente que o quartel havia se transformado em um covil de marginais e o coiteiro era o general comandante, que continua impune. Até o artefato que deveria explodir em um caminhão de combustíveis lá foi preparado, quem sabe, com assessoria de técnicos competentes locais. Aliás, não seria de surpreender, pois até o ex-presidente Bolsonaro já havia usado esta expertise para promover atentados contra a própria instituição, sendo por isso reformado, mas acalentado pelos seus algozes e preservado para alguma oportunidade futura. Quem sabe? 

Agora avança-se sobre os financiadores, mandantes e inspiradores da ação entre os quais se encontram certamente políticos, empresários, líderes religiosos, ou seja, homens “de bem”, para não falar de filhos, esposas e parentes de militares, igualmente “gente de bem”.  Mesmo depois da determinação do Alexandre de Moraes para o desmonte de todos os acampamentos de baderneiros em frente aos quarteis, em Brasília, o exército impediu, por algum tempo, a polícia do DF de cumprir a determinação judicial. Quem sabe, se não foi para dar tempo de fuga aos “cidadãos de bem” bombistas, foragidos da justiça, usuários de tornozeleiras eletrônicas etc. Uma coisa é certa: até agora, entre os detidos não apareceram os fardados graduados. Quem vai responder o que estavam fazendo os dois batalhões sediados no subsolo do palácio do planalto para defender os poderes da república? Quem são os comandantes do Regimento de Cavalaria da Guarda e do Batalhão da Guarda Presidencial? Por que não se moveram? Quem os comandava?

Na verdade, o partido do exército continua a mostrar sua força. Continuamos a viver sob a tutela militar que existe desde o início da república e que a sociedade civil ainda não se atreveu a abolir. Na conjuntura atual, nunca as condições internacionais foram tão propícias. Internamente, há provas evidentes da corrupção e dos desmandos da caserna que, vergonhosamente, deixou-se dirigir por um capitão que ela própria excluiu por incompatibilidade com seus princípios. Que vergonha!

Mas a violência dos bolsominions ultrapassou os limites da praça dos três poderes e ocorreu em outras áreas. Foram praticados atos de terrorismo clássicos como o bloqueio de refinarias e aeroportos e sabotagem derrubando torres de transmissão de energia. Com a descoberta da minuta do decreto do golpe, na casa do ex-secretário, Anderson Torres, o quadro ficou ainda mais completo demonstrando que o plano era muito mais ambicioso. Há muito a investigar. Como bem disse o ex-secretário geral da Unctad Rubens Ricupero, “atrás disso tem uma inteligência estratégica. Nenhuma bomba explode sem estopim”.

Na economia também as coisas voltam à normalidade. Como vínhamos falando, a recuperação continua a arrastar-se dificultada pela política econômica do governo anterior e com a colaboração do Banco Central (BC) com sua insensata elevação da taxa de referência Selic. No exterior, enquanto se desenrola o Fórum de Davos na Suíça, a diretora geral do FMI, Kristalina Georgieva, anuncia uma recessão mundial para este ano e o crescimento de 0,5% para os países avançados. Como complemento, o Banco Mundial publica um documento afirmando que a economia mundial “está por um fio”.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares, Nertan Alves e Maria Cecília Fernandes.

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