quarta-feira, 1 de maio de 2024

Pacheco e Lira: verdadeiro fogo inimigo

Semana de 22 a 28 de abril de 2024

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Como vimos nas últimas semanas, a economia brasileira já iniciou a fase de reanimação do seu ciclo econômico há algum tempo. Com maior ou menor intensidade, quase todos os dados têm apresentado melhoras seguidas. Contudo, também destacamos a necessidade de se iniciarem os grandes projetos de investimentos públicos. Assim, para além de melhorar nossa infraestrutura, seriam criados novos estímulos para fortalecer a recuperação econômica desta que tem se mostrado mais uma década perdida para a economia brasileira (de 2014 a 2023).

Por outro lado, como sempre fez desde seu primeiro mandato como Presidente da República, ao formar seu atual governo, Lula tratou de garantir que os gastos federais não extrapolariam as receitas obtidas em cada ano. Por incrível que pareça, o grande responsável por isso tem sido justamente Fernando Haddad, aquele a quem todos (na imprensa e nos “mercados”) acusavam de ser um irresponsável orçamentário. Como Ministro da Fazenda, os principais feitos fiscais de Haddad são o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária (sobre o consumo).

Ambos os projetos já foram debatidos no Congresso Nacional. Na ocasião, através dos Presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, as propostas foram amplamente elogiadas e devidamente moldadas aos interesses dos grupos que compõe cada casa legislativa. Porém, ao que parece, eles esqueceram que a função de propor e executar o Orçamento da União não lhes cabem. A prerrogativa, como o próprio nome sugere, é do Poder Executivo. Contudo, o que estamos vendo no momento é um intenso ataque do Poder Legislativo às verbas federais.

Para entender a dimensão do problema, precisamos recorrer a alguns dados sobre as despesas do governo federal. No orçamento, há um conjunto de gastos que são obrigatórios, pois são garantidos pela Constituição. São despesas com saúde, educação, salários, aposentadorias, etc. Só aí já vai cerca de 90% do gasto primário, que está em cerca de R$ 2 trilhões. Sobra apenas 10% do orçamento para as despesas discricionárias, aquelas em que o Poder Executivo pode gastar com projetos e propostas que atendam aos mais diversos interesses sociais (desde as elites até as camadas populares). É um valor em torno de R$ 200 bilhões que podem ser alocados em investimentos, pesquisa, aumento de salários, melhoria de serviços públicos, programas sociais, etc.

No caso de Arthur Lira, a cobiça pode ser vista nas pressões que ele tem exercido para aumentar em R$ 5,6 bilhões as emendas parlamentares de 2024. Esse valor até estava previsto no projeto orçamentário aprovado em 2023, porém Lula vetou o trecho da lei que garantia o recurso. Essa verba parece pequena, mas não é. O problema é que o Poder Legislativo já está autorizado a gastar, de acordo com os critérios que bem entender, um total de R$ 44,7 bilhões do orçamento de 2024. Este valor fica em torno de 22% das despesas discricionárias. Ou seja, Pacheco e Lira já tem uma grande soma de dinheiro que passa longe dos projetos propostos por Lula e sua equipe.

Por falar em Rodrigo Pacheco, na última semana foi a sua vez de sair para a briga pública com Lula e sua equipe. Para além da briga com o STF, por conta do fim das desonerações da folha de pagamento, e da derrubada dos vetos que reduzem as emendas parlamentares, outras ações do senador prometem comprometer o orçamento federal. A mais famosa é a PEC do Quinquênio, que dá aumento salarial automático de 5% a cada 5 anos para servidores públicos do Poder Judiciário e do Ministério Público (e, em cascata, TCU, AGU, PF e outros). O custo disso pode chegar a R$ 82 bilhões até 2026. Além disso, Pacheco articula um acordo de renegociação das dívidas dos estados com a União. Isto trará novas limitações orçamentárias nos próximos anos.

Enfim, longe de ser um fiscalista inveterado ou de momento, o que é procuro nesta análise é jogar luz sobre um problema que certamente vai interferir na recuperação da economia nacional na atual década: a falta de coordenação nos gastos discricionários. A experiência mundial mostrou no passado e tem mostrado no presente que, para superar os gargalos e limitações que caracterizam o atraso econômico, é preciso um amplo e articulado projeto de desenvolvimento.

Apesar de o governo Lula ainda não ter apresentado um plano desse tipo, mas medidas mais ou menos amplas, os presidentes das casas legislativas estão atuando para tornar as coisas um pouco mais difíceis. Nada de novo no front. É o fogo inimigo minando um governo progressista. Resta saber se haverá contra-ataque ou não...


[i] Professor do DRI/UFPB, do PPGCPRI/UFPB e do PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Maria Fernanda Vieira, Guilherme de Paula, Lara Souza, Valentine de Moura, Gustavo Figueiredo e Paola Arruda.

Share:

0 comentários:

Postar um comentário

Novidades

Recent Posts Widget

Postagens mais visitadas

Arquivo do blog