Semana de 02 a 08 de dezembro de 2024
Paola Teotônio Cavalcanti de Arruda[i]
O mercado, sempre tão entusiasmado com
promessas de austeridade, recebeu o anúncio do pacote de corte de gastos do
Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com insatisfação e estardalhaço. O motivo
da fúria? A inclusão inesperada da isenção do Imposto de Renda, para quem ganha
até R$5 mil, no pacote. A preocupação era a de que tal medida reduzisse a
arrecadação dos cofres públicos e diminuísse o efeito da redução de despesas
gerado pela implementação dos cortes.
A “grande” preocupação dos rentistas
brasileiros não se materializa nem na teoria, nem na prática, uma vez que,
junto à proposta, já havia uma solução para a questão, baseada em números: a
taxação na alíquota de 10% para quem possui renda acima de R$ 50 mil por mês -
ou R$ 600 mil por ano. Assim, teoricamente, a contramedida agiria como um
neutralizador, fazendo com que a arrecadação não fosse alterada.
Já na prática, boa parte dos “problemas” e
“preocupações” do mercado com o gasto público seria resolvida com a redução dos
gastos com os juros da dívida. De acordo com dados da Agência Brasil, estes
gastos ficaram em torno de R$ 111,564 bilhões, até o mês de outubro deste ano,
equivalendo a quase metade do orçamento público e a praticamente o dobro dos R$
61,947 bilhões registrados em outubro de 2023.
Assim, pode-se dizer que, hoje, há no
Brasil, um novo programa de transferência de renda, só que voltado à elite
rentista: uma parte muito grande do orçamento fica retida no pagamento de juros
altíssimos, enquanto despesas com saúde e educação são alvo de restrição. A
contenção de gastos parece só ter serventia, se significar retirar de quem tem
menos, ou seja, dar menos educação ao filho do pobre, piorar o acesso à saúde
de quem não tem dinheiro para custear o próprio tratamento. Enquanto os cortes
só podem atingir a parcela mais vulnerável da população, as receitas do Estado
não devem, jamais, alcançar a parcela 1% mais rica do país, e os juros não
podem, em hipótese alguma, cair – pois isso implicaria grande perda à elite do
capitalismo financeiro.
Para o discurso econômico dominante, a
“culpa” pela “inflação” brasileira e pelos “desequilíbrios fiscais” advém do
próprio povo. O salário-mínimo aumentou, o nível de desemprego é o menor desde
2014, e a pobreza atingiu o menor patamar da série histórica, desde 2012. O
brasileiro está comendo mais, comprando mais e, consequentemente, demandando
mais. A economia está girando, o país está crescendo – acima do esperado – e a
pressão sobre os preços pode ser contida com uma expansão da oferta. Coisa boa,
correto?
Para o COPOM, erradíssimo! Veja bem, caro
leitor, não sou eu quem está dizendo, foi o próprio Comitê de Política
Monetária. Em nota, o Comitê registrou que o aumento na taxa de juros é
necessário para atuar “na suavização das flutuações do nível de atividade e do
pleno emprego”. Isso quer dizer que, para o órgão, nem o PIB pode subir muito,
nem o desemprego descer demais. Através de eufemismos, o que o Comitê quis
dizer foi que não se deve permitir que o país cresça.
O desespero vem em conjunto com os dados do
desempenho econômico recente, que mostram que o crescimento do PIB superou
consistentemente as previsões nos três últimos trimestres, indicando uma
economia mais resiliente que o esperado. No primeiro trimestre, a projeção era
de 0,7%, mas o crescimento real atingiu 1,1%. No segundo, a expectativa de 0,9%
foi superada com um crescimento de 1,4%, enquanto no terceiro trimestre, o PIB
cresceu 0,9%, acima da previsão de 0,8%.
Esse contexto revela um paradoxo: enquanto a economia brasileira dá sinais de vigor e supera expectativas, os atores do mercado financeiro e o próprio COPOM pretendem conter o crescimento e não o celebrar. A insistência em políticas que priorizam juros altos e cortes nos serviços essenciais reflete a escolha política de proteger os interesses de uma elite financeira em detrimento do bem-estar da maioria da população. Essa postura conservadora diante de avanços econômicos apenas reforça a desigualdade e limita o potencial de progresso coletivo.
[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduanda em Relações
Internacionais (UFPB). (paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Rubens Gabriel, Miguel Oliveira,
Guilherme de Paula e Maria Júlia.
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