Semana de 05 a 11 de maio de 2025
Lucas Milanez de Lima Almeida [i]
Caro leitor, a análise desta semana traz
uma reflexão mais profunda que nos ajuda a entender a qualidade do atual
crescimento econômico brasileiro. Como tem sido (relativamente mal) noticiado,
o Brasil apresentou significativa melhora nos indicadores econômicos. O emprego
informal é o menor dos últimos cinco anos, o nível de subutilização da força de
trabalho é a segunda menor desde 2012, as exportações estão batendo recorde, a
indústria tem crescido de forma sustentada e disseminada, a desigualdade de renda
caiu, o comércio com a China se ampliou. A situação do Brasil melhorou ao ponto
de subirmos cinco posições no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento
Humano), sendo puxado pelo aumento da renda.
Afinal, diante disso tudo, por que não
estamos surfando na onda desse crescimento? A resposta tem a ver com a forma
como a indústria se organiza atualmente.
No passado, a estrutura produtiva dos
países industrializados tinha um enraizamento muito forte no próprio território
ao qual pertencia. Na prática, grande parte dos fornecedores de insumos estavam
próximos, frequentemente nos arredores das grandes fábricas. Estas, por sua
vez, formavam o centro em torno do qual se constituíam os grandes polos
produtores de bens de uma mesma família: automobilístico, têxtil, petroquímico,
etc. Soma-se a isso um conjunto de serviços que se formavam para a manutenção
dessas atividades: bancos, comércio, saúde, beleza, educação, transporte, etc.
Como resultado, quando determinados setores
entravam em rota de crescimento, essa expansão se espalhava para outros setores
nacionais e, com isso, toda a economia se aquecia. O auge do crescimento
econômico sempre foi um momento de euforia, que, diante da bonança
generalizada, preparava as condições para a chegada da superprodução.
Entretanto, para a maior parte dos países
capitalistas, isto não é mais a regra. Dentre outros fatores, um dos motivos
fundamentais está na forma como se produz e se distribui a riqueza hoje. Cada
vez mais, liderada por grandes conglomerados, a produção da maior parte dos
bens que consumimos percorre uma ampla gama de países antes de chegar às nossas
mãos.
Comandadas pelas chamadas empresas
transnacionais, o que temos hoje são cadeias produtivas fragmentadas e
dispersas em diversos países. A concepção do produto ocorre em um local, a
produção das partes em outro, a montagem em outro e, por fim, o consumo pode
ocorrer em qualquer lugar do planeta.
A grande novidade disto é que essas
transnacionais conseguem acessar os locais mais remotos da Terra, se
aproveitando das vantagens que cada um pode proporcionar: é mão de obra barata
num lugar, leis trabalhistas flexíveis em outro, falta de legislação ambiental
em outro, domínio exclusivo de jazidas minerais em outro e assim por diante.
Como resultado, as empresas transnacionais
têm acesso aos fornecedores mais baratos e, consequentemente, têm custos mais
baixos que as concorrentes. Assim, do ponto de vista empresarial, o padrão da
organização industrial dessas empresas tem o melhor dos mundos, pois garante a
elas a maior rentabilidade possível. Porém, isto traz consequências
macroeconômicas importantes.
Limitando-se ao tema proposto nesta curta
análise, o principal problema está no que chamamos de vazamento dos efeitos
multiplicadores da produção. Quando uma empresa amplia sua produção, ela compra
mais máquinas, equipamentos, matérias-primas, insumos auxiliares, etc. de
outras empresas. Estas, por sua vez, também precisam comprar mais meios de
produção para atender àquela empresa inicial. Cria-se, assim, um “círculo
virtuoso” de crescimento.
Sob os padrões tradicionais da
industrialização, quando a maior parte deste efeito multiplicador era
concentrado nos polos produtores dos bens, isto resultava num forte crescimento
da economia local. Mas isto não é mais observado na atualidade. Por exemplo, em
2024, a indústria automobilística do estado de Pernambuco buscou partes dos
seus veículos nos EUA, Alemanha, Japão, França, Suécia e México, trouxe pneus
de Taiwan, motores da Itália, laminados da Coreia do Sul, partes elétricas e
eletrônicas da China. Em outras palavras, no atual padrão de industrialização,
baseado em cadeias produtivas globais, os estímulos ao crescimento de um país
são canalizados para fora
Nesse contexto, indo além de uma análise superficial da qualidade da propaganda do governo, é preciso compreender que a qualidade do próprio crescimento econômico brasileiro mudou nas últimas décadas. O efeito multiplicador dos nossos investimentos passou a se dispersar internacionalmente e, por isso, não mais gerar a mesma bonança de outrora. Este, por exemplo, é um dos principais motivos para debatermos a importância da nossa “reindustrialização”. Ela é fundamental para que o crescimento volte a acontecer de forma abrangente e ampla, alcançando mais elos da cadeia produtiva nacional.
[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e
Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Antonio Queirós, Brenda Tiburtino, Camylla
Costa, Guilherme de Paula, Icaro Moisés e Lara Souza.
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