quinta-feira, 15 de maio de 2025

O BRASIL ESTÁ INDO BEM, MAS POR QUE NÃO ESTAMOS AINDA MELHOR?

Semana de 05 a 11 de maio de 2025

   

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Caro leitor, a análise desta semana traz uma reflexão mais profunda que nos ajuda a entender a qualidade do atual crescimento econômico brasileiro. Como tem sido (relativamente mal) noticiado, o Brasil apresentou significativa melhora nos indicadores econômicos. O emprego informal é o menor dos últimos cinco anos, o nível de subutilização da força de trabalho é a segunda menor desde 2012, as exportações estão batendo recorde, a indústria tem crescido de forma sustentada e disseminada, a desigualdade de renda caiu, o comércio com a China se ampliou. A situação do Brasil melhorou ao ponto de subirmos cinco posições no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), sendo puxado pelo aumento da renda.

Afinal, diante disso tudo, por que não estamos surfando na onda desse crescimento? A resposta tem a ver com a forma como a indústria se organiza atualmente.

No passado, a estrutura produtiva dos países industrializados tinha um enraizamento muito forte no próprio território ao qual pertencia. Na prática, grande parte dos fornecedores de insumos estavam próximos, frequentemente nos arredores das grandes fábricas. Estas, por sua vez, formavam o centro em torno do qual se constituíam os grandes polos produtores de bens de uma mesma família: automobilístico, têxtil, petroquímico, etc. Soma-se a isso um conjunto de serviços que se formavam para a manutenção dessas atividades: bancos, comércio, saúde, beleza, educação, transporte, etc.

Como resultado, quando determinados setores entravam em rota de crescimento, essa expansão se espalhava para outros setores nacionais e, com isso, toda a economia se aquecia. O auge do crescimento econômico sempre foi um momento de euforia, que, diante da bonança generalizada, preparava as condições para a chegada da superprodução.

Entretanto, para a maior parte dos países capitalistas, isto não é mais a regra. Dentre outros fatores, um dos motivos fundamentais está na forma como se produz e se distribui a riqueza hoje. Cada vez mais, liderada por grandes conglomerados, a produção da maior parte dos bens que consumimos percorre uma ampla gama de países antes de chegar às nossas mãos.

Comandadas pelas chamadas empresas transnacionais, o que temos hoje são cadeias produtivas fragmentadas e dispersas em diversos países. A concepção do produto ocorre em um local, a produção das partes em outro, a montagem em outro e, por fim, o consumo pode ocorrer em qualquer lugar do planeta.

A grande novidade disto é que essas transnacionais conseguem acessar os locais mais remotos da Terra, se aproveitando das vantagens que cada um pode proporcionar: é mão de obra barata num lugar, leis trabalhistas flexíveis em outro, falta de legislação ambiental em outro, domínio exclusivo de jazidas minerais em outro e assim por diante.

Como resultado, as empresas transnacionais têm acesso aos fornecedores mais baratos e, consequentemente, têm custos mais baixos que as concorrentes. Assim, do ponto de vista empresarial, o padrão da organização industrial dessas empresas tem o melhor dos mundos, pois garante a elas a maior rentabilidade possível. Porém, isto traz consequências macroeconômicas importantes.

Limitando-se ao tema proposto nesta curta análise, o principal problema está no que chamamos de vazamento dos efeitos multiplicadores da produção. Quando uma empresa amplia sua produção, ela compra mais máquinas, equipamentos, matérias-primas, insumos auxiliares, etc. de outras empresas. Estas, por sua vez, também precisam comprar mais meios de produção para atender àquela empresa inicial. Cria-se, assim, um “círculo virtuoso” de crescimento.

Sob os padrões tradicionais da industrialização, quando a maior parte deste efeito multiplicador era concentrado nos polos produtores dos bens, isto resultava num forte crescimento da economia local. Mas isto não é mais observado na atualidade. Por exemplo, em 2024, a indústria automobilística do estado de Pernambuco buscou partes dos seus veículos nos EUA, Alemanha, Japão, França, Suécia e México, trouxe pneus de Taiwan, motores da Itália, laminados da Coreia do Sul, partes elétricas e eletrônicas da China. Em outras palavras, no atual padrão de industrialização, baseado em cadeias produtivas globais, os estímulos ao crescimento de um país são canalizados para fora do seu território, atingindo outras economias.

Nesse contexto, indo além de uma análise superficial da qualidade da propaganda do governo, é preciso compreender que a qualidade do próprio crescimento econômico brasileiro mudou nas últimas décadas. O efeito multiplicador dos nossos investimentos passou a se dispersar internacionalmente e, por isso, não mais gerar a mesma bonança de outrora. Este, por exemplo, é um dos principais motivos para debatermos a importância da nossa “reindustrialização”. Ela é fundamental para que o crescimento volte a acontecer de forma abrangente e ampla, alcançando mais elos da cadeia produtiva nacional.


[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Antonio Queirós, Brenda Tiburtino, Camylla Costa, Guilherme de Paula, Icaro Moisés e Lara Souza.

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