sexta-feira, 20 de junho de 2025

CONFLITO ANUNCIADO, APOIO CONDICIONAL E SILÊNCIO CALCULADO

Semana de 09 a 15 de junho de 2025

   

Paola Teotônio Cavalcante de Arruda[i]

 

Na última sexta-feira (13), Israel lançou uma série de ataques aéreos contra instalações nucleares iranianas, incluindo os complexos de Natanz e Arak. A ofensiva foi justificada por Tel Aviv como uma ação “preventiva” para conter o avanço do programa nuclear do Irã, que, segundo Israel, estaria próximo de alcançar capacidade armamentista. Em resposta, o Irã iniciou contra-ataques com mísseis e drones, marcando uma escalada direta e inédita entre os dois países, que historicamente vinham se enfrentando por meio de proxies e operações indiretas.

Assim, o atual conflito entre Irã e Israel não ocorre em um vácuo geopolítico, tampouco seus desdobramentos se limitam ao Oriente Médio. Ele reverbera em múltiplas camadas: diplomáticas, militares e, principalmente, econômicas. A análise conjunta desses três elementos permite enxergar a complexidade e os dilemas do sistema internacional diante de uma escalada militar envolvendo dois atores historicamente antagônicos.

No campo diplomático, o comportamento das potências globais expõe uma ambiguidade estratégica. Os Estados Unidos, tradicional aliado de Israel, oscilam entre um apoio tácito à ofensiva de Netanyahu e tentativas de dissociação retórica. Isso fica evidente nas declarações ambíguas de Donald Trump, que ao mesmo tempo em que exaltou o poderio militar americano e insinuou ter o líder iraniano sob mira, também recuou, ao afirmar que não tomaria medidas imediatas e adotou um tom sarcástico diante das reações do Irã. Sua retórica beligerante, ao mesmo tempo em que ameaça diretamente o líder iraniano, também sugere a busca por uma "rendição completa" como solução. Já Rússia e China, ainda que aliadas do Irã em discurso, também não apresentam sinais de envolvimento ativo. A retórica de mediação desses países parece mais orientada à manutenção de influência regional e proteção de seus próprios interesses estratégicos – como as sanções que enfrentam – do que a qualquer real disposição de confronto com Israel ou os EUA.

O Irã, por sua vez, adota um discurso de resistência que ecoa seu histórico de confrontos indiretos com o Ocidente, mas a rejeição ao ultimato americano pode ser interpretada tanto como firmeza nacionalista, quanto como uma jogada calculada para evitar negociações em posição de fraqueza. A cautela na resposta – ainda que envolta em ameaças – indica que Teerã entende os riscos de uma guerra aberta com o aparato militar americano.

Essa hesitação generalizada pode ser entendida como um sinal de que ainda não existe grande interesse entre as potências em transformar o embate em uma guerra regional de grandes proporções. Por enquanto, os aliados ideológicos parecem agir com parcimônia. A guerra parece isolada no plano formal, mas certamente será acompanhada de efeitos colaterais e transnacionais profundos.

No campo econômico, um dos impactos sobre o qual mais se fala é o efeito em cadeia, desencadeado via preços. O conflito afeta diretamente o preço do petróleo, um dos ativos mais sensíveis ao risco geopolítico. Como o Fed, o BCE e outros bancos centrais encontram-se acuados entre inflação, volatilidade cambial e risco sistêmico. Paralelamente, a instabilidade no Golfo Pérsico tende a elevar a volatilidade nas bolsas de valores e a comprometer a previsibilidade dos bancos centrais. Uma das consequências disso poderá ser a ruptura de modelos tradicionais de política monetária: os BCs perderão capacidade de previsão, as moedas se tornarão erráticas e os investidores passarão a operar em modo defensivo.

Esse cenário impõe uma leitura pragmática. Nenhuma potência parece querer, de fato, entrar em guerra; mas os países também não podem se mostrar passivos, sob pena de perder influência. O resultado é um teatro de declarações firmes, que inflamam as tensões, enquanto a economia global paga o preço da instabilidade. A “guerra que não interessa a ninguém” torna-se, paradoxalmente, um fator de desorganização estrutural dos mercados e da ordem global.

Enquanto isso, em um timing digno de roteiro político mal escrito, um grupo de prefeitos brasileiros decidiram embarcar rumo a Israel justamente no auge da escalada militar com o Irã. Entre eles, Cícero Lucena, prefeito de João Pessoa. Em vez de priorizar agendas locais urgentes — como saneamento básico, saúde pública e educação — o prefeito optou por visitar um país em guerra, sob o pretexto de “troca de experiências” e “inovação tecnológica”. Aparentemente, a gestão de conflitos armados entrou no currículo da administração municipal. Resta saber se os gestores voltarão com drones, escudos antimísseis ou apenas com selfies ao lado de bunkers, enquanto suas cidades seguem enfrentando problemas bem mais concretos e menos cinematográficos.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduanda em Relações Internacionais (UFPB). (paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Antonio Queirós, Camylla Martins, Julia Bomfim, Julia Dayane e Nelson Rosas.

 

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