Semana de 13 a 19 de outubro de 2025
Lucas Milanez de Lima Almeida [i]
Como o caro leitor certamente já viu nos
noticiários, e contrariando a histeria tresloucada dos bolsonaristas, enfim
acontecerá o encontro entre Lula e Donald Trump. Marcada para o próximo
domingo, a conversa acontecerá em Kuala Lumpur, na Malásia, durante a 47ª
cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean). O evento principal
acontecerá entre os dias 26 e 28 de outubro, mas Lula já inicia suas conversas
com líderes da região no dia 23, na Indonésia, seguindo para Malásia no dia 24.
Esta viagem, e o que nela vai acontecer,
simboliza algumas coisas, das quais, duas se destacam e se conectam. A primeira
é o baixo impacto do Tarifaço sobre a balança comercial brasileira. A segunda é
a evolução da relação comercial entre o Brasil e os países da Asean nas últimas
décadas. Vejamos em detalhe.
Antes de mais nada, é válido refletirmos
sobre a mudança de atitude de Trump frente ao Brasil. Quase que do nada, como
se um esbarrão no corredor da ONU fosse suficiente, ele resolveu abrir
conversas com Lula. Na realidade, os dados das exportações brasileiras falam
mais do que o próprio alaranjado.
Nos meses de agosto e setembro de 2025, em
comparação com os mesmos meses de 2024, para 9 dos 20 produtos mais exportados
pelo Brasil aos EUA, a receita com as vendas para o país caiu US$ 375,5
milhões. Em compensação, neste período, o Brasil aumentou as vendas desses 9
produtos em US$ 1,25 bi. Isto foi possível graças ao aumento dos preços e à
ampliação das vendas para outros países. Dentre os produtos que se destacam
estão o café e a carne.
Isto mostra que a política externa
andarilha de Lula está surtindo efeito e o fortaleceu frente à ofensiva
trumpista. Não foram poucos os críticos do presidente no início deste seu
terceiro mandato. Falava-se que ele dava muita atenção à política externa e
pouca à interna. Pois bem, graças a Lula, ao Itamarati e à consequente retomada
do protagonismo brasileiro no cenário internacional, o Brasil pode buscar
alternativas comerciais a determinados produtos. Outros, muito específicos de
cadeias produtivas especializadas, como peças e partes de motores e produtos de
madeira, ainda não tiveram a mesma sorte, já que suas vendas caíram aos EUA e
as vendas ao resto do mundo não compensaram essa queda.
Isto nos leva ao segundo elemento que
remete à viagem de Lula à Asean: quais negócios ele vai fazer por lá?
Em artigo recente (Araújo; Almeida; Leite,
2025), mostramos como as relações comerciais entre o Brasil e o conjunto dos
países da Asean têm reproduzido um padrão desfavorável a nós. Em um primeiro
momento, o texto mostra a mudança nos índices de complexidade econômica de cada
país. Em 1995, por exemplo, Singapura ocupava a 20ª posição dentre os países
com maior complexidade, sendo que o Brasil ficava em 25º e todos os demais
países da Asean estavam abaixo de nós (Malásia em 36º e Tailândia em 49º). Em 2021,
Singapura subiu para a 5ª posição e o Brasil caiu para 70ª (Malásia em 28º e
Tailândia em 23º). Dos países da Asean, apenas Laos, Camboja e Mianmar estavam
abaixo de nós em 2021.
Sobre a relação comercial, o texto mostra
que, entre 1999 e 2003, cerca de 11,2% das nossas exportações para a Asean eram
compostas por produtos primários (agropecuária e extrativa) e cerca de 33,6%
eram de manufaturados de média e média-alta tecnologia. Entre 2019 e 2023, as
vendas de produtos primários subiram para 45% do total e as desses
manufaturados caíram para 6,3%. No caso das importações, daquilo que compramos
dos países da Asean entre 2019 e 2023, 96,2% são produtos manufaturados, sendo
35,5% de alta, 44,1% de média (e média-alta) e 16,5% de baixa tecnologia. Mesmo
assim, desde 2012 o Brasil apresenta sucessivos superávits comerciais com a
Asean, graças à venda de produtos de baixo valor agregado (especialmente,
combustíveis e lubrificantes).
Enfim, vemos que, apesar da situação
externa brasileira não ser ruim, ainda estamos muito longe do ideal. A relação
com a Asean simboliza muito bem a nossa realidade histórica: ainda somos um
país primário-exportador que se insere nas camadas mais baixas da divisão
internacional do trabalho e o interesse de Trump e também da Asean é manter
este padrão. Entretando, certamente,
Silva Araújo, L., Almeida, L. M. de L.,
& Cunha Leite, A. C. (2025). Trade relations between Brazil and ASEAN: an
analysis through the lenses of dependency and deindustrialization. Problemas Del Desarrollo. Revista Latinoamericana
De Economía, 56(222), 27-58. https://doi.org/10.22201/iiec.20078951e.2025.222.70341
[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e
Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Antonio Fontes, Camylla Martins, Jéssica
Brito, Julia Bomfim, Lara Souza, Maria Julia Alencar e Nelson Rosas.



0 comentários:
Postar um comentário