Semana de 08 a 15 de setembro de 2008
Continua a repercutir a grande operação de salvamento do casal Fannie-Freddie. E as dimensões do caso tornam-se cada vez mais visíveis. Para se ter uma idéia, as duas empresas Fannie Mãe e Freddie Mac, que atuam no setor imobiliário americano, são responsáveis por 68% do mercado, o que significa algo como US$ 5,3 trilhões de dólares em garantias a empréstimos concedidos para a aquisição de imóveis. Este montante representa mais de quatro vezes o valor do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro (somatório de toda a riqueza produzida no país) que foi estimado em US$ 1,3 trilhão de dólares em 2007. Isto quer dizer que, somados, Fannie e Freddie valem mais de quatro Brasis.
Mas não é só isso. Os US$ 200 bilhões de dólares que foram injetados apenas nas duas empresas (US$ 100 bilhões para cada uma) equivalem ao total das reservas do Brasil que tão orgulhosamente o ministro Guido Mantega exibe como prova da nossa superioridade. No entanto, este montante é considerado por todos como insuficiente. Além disso, parece evidente que ele não resolverá a crise e que novas intervenções serão necessárias. O secretário do tesouro dos EUA, Henry Paulson, que assumiu o comando da intervenção, justificou as medidas afirmando que a quebra de qualquer uma das agências “causaria grande turbulência ao redor do mundo”. A situação, no entanto,continua se agravando, pois a inadimplência e as execuções de hipotecas nos EUA continuam, ultrapassando os valores máximos atingidos nos últimos 29 anos.
Mas a crise ultrapassa em muito os limites do mercado imobiliário. Já afirmamos, em análises anteriores, que o estouro financeiro era apenas a ponta do iceberg. O pior ainda está vindo por aí. O rastilho de pólvora já atingiu outros paióis. Repercute agora a notícia de que o banco de investimentos Lehman Brothres, o quarto maior dos Estados Unidos, e que atuava há 158 anos, se declarou em quebra. As tentativas para salvá-lo estão em marcha, pois, desta vez, o Federal Reserve (Fed), banco central americano, resolveu não dar cobertura às operações de salvamento. Varias instituições financeiras do porte do Bank of América, Barclay, Citibank, Credit Suisse, Deutsche Bank, J.P.Morgan, UBS e Morgan Stanley, entre outros, reuniram-se para tentar inutilmente uma solução. Mais sorte teve o Merrill Lynch, que, diante da ameaça de falência, conseguiu ser comprado pelo Bank of América por cerca de US$ 50 bilhões de dólares, consolidando ainda mais sua posição de gigante, reforçada já por uma série de compras anteriores que incluem o banco hipotecário Countrywide Financial.
O estouro em cadeia, porém, não dá tréguas e se estende para as seguradoras. Agora foi a AIG que solicitou, ao Fed, um empréstimo de US$ 40 bilhões de dólares.
Observando as repercussões em cascata para toda a economia, Gary Thayer, economista sênior do Wachovia Securities, afirmou que “a economia está claramente se deteriorando”. O presidente do Conference Board, empresa especializada em pesquisa sobre confiança do consumidor, Gail Fosler, comentou que “a economia dos Estados Unidos está estagnada” e deve desacelerar significativamente nos próximos trimestres. Com efeito, a crise se expande ao mercado de trabalho. A taxa de desemprego nos EUA subiu para 6,1% em agosto, o maior nível desde setembro de 2003. O departamento de trabalho informou que, neste mês, foram eliminados 84 mil postos de trabalho, além dos 60 mil, em julho, e os 100 mil, em junho.
As explosivas notícias da semana não podiam deixar de repercutir nas bolsas de valores de todo o mundo. Assistiu-se a quebradeira geral e a nossa Bovespa, apesar dos sólidos fundamentos da economia, não ficou imune. Se, em todo o mês de agosto, ela caiu 6,4%, só no dia 10 de setembro o Ibovespa (índice que mede as atividades da bolsa) caiu 4,5% e no mês de setembro as perdas acumuladas atingiram 13%. No total do ano, as perdas já são de 24,18%. Com isto, o valor de mercado das empresas brasileiras, de maio até agora, caiu 30,8%, o que significa a perda de US$ 432 bilhões de dólares. As ações de empresas como a Vale e a Petrobrás perderam 33,74% e 34,45% de seu valor, respectivamente.
Agora se apressam os analistas a declarar que não são partidários da tese do “descolamento” dos emergentes. O economista Ramón Aracena, especialista em Brasil do Instituto de Finanças Internacionais, por exemplo, declarou que “nunca acreditei na tese do descolamento” e que, apesar dos bons fundamentos, o país “não está imune”.
E cada vez mais o efeito manada empurra os especuladores na direção de maior segurança. Os capitais estrangeiros fogem do país e os pequenos “investidores”, desencantados com o emudecimento da sereia, procuram salvar o que podem. A bolsa oscila e continuará no sobe e desce ao sabor das notícias sobre falências que certamente virão.
Isto é apenas o começo. Quem tinha ações da Petrobrás, por exemplo, já perdeu 34,45% do valor. Somados os prejuízos, a destruição de capitais já está em marcha e pode ser estimada em trilhões de dólares. Continuamos ainda em direção ao fundo do poço.
Mas, imune a tudo isto, como um gigantesco avestruz que esconde a cabeça no solo diante do perigo, o Banco Central do Brasil decidiu aumentar a taxa básica de juros (Selic) em 0,75%, mais uma vez garantindo a rentabilidade do capital financeiro sob a alegação da ameaça da inflação que parece só existir na cabeça do Henrique Meirelles, seu presidente.
Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira
(progeb@ccsa.ufpb.br)
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Mas não é só isso. Os US$ 200 bilhões de dólares que foram injetados apenas nas duas empresas (US$ 100 bilhões para cada uma) equivalem ao total das reservas do Brasil que tão orgulhosamente o ministro Guido Mantega exibe como prova da nossa superioridade. No entanto, este montante é considerado por todos como insuficiente. Além disso, parece evidente que ele não resolverá a crise e que novas intervenções serão necessárias. O secretário do tesouro dos EUA, Henry Paulson, que assumiu o comando da intervenção, justificou as medidas afirmando que a quebra de qualquer uma das agências “causaria grande turbulência ao redor do mundo”. A situação, no entanto,continua se agravando, pois a inadimplência e as execuções de hipotecas nos EUA continuam, ultrapassando os valores máximos atingidos nos últimos 29 anos.
Mas a crise ultrapassa em muito os limites do mercado imobiliário. Já afirmamos, em análises anteriores, que o estouro financeiro era apenas a ponta do iceberg. O pior ainda está vindo por aí. O rastilho de pólvora já atingiu outros paióis. Repercute agora a notícia de que o banco de investimentos Lehman Brothres, o quarto maior dos Estados Unidos, e que atuava há 158 anos, se declarou em quebra. As tentativas para salvá-lo estão em marcha, pois, desta vez, o Federal Reserve (Fed), banco central americano, resolveu não dar cobertura às operações de salvamento. Varias instituições financeiras do porte do Bank of América, Barclay, Citibank, Credit Suisse, Deutsche Bank, J.P.Morgan, UBS e Morgan Stanley, entre outros, reuniram-se para tentar inutilmente uma solução. Mais sorte teve o Merrill Lynch, que, diante da ameaça de falência, conseguiu ser comprado pelo Bank of América por cerca de US$ 50 bilhões de dólares, consolidando ainda mais sua posição de gigante, reforçada já por uma série de compras anteriores que incluem o banco hipotecário Countrywide Financial.
O estouro em cadeia, porém, não dá tréguas e se estende para as seguradoras. Agora foi a AIG que solicitou, ao Fed, um empréstimo de US$ 40 bilhões de dólares.
Observando as repercussões em cascata para toda a economia, Gary Thayer, economista sênior do Wachovia Securities, afirmou que “a economia está claramente se deteriorando”. O presidente do Conference Board, empresa especializada em pesquisa sobre confiança do consumidor, Gail Fosler, comentou que “a economia dos Estados Unidos está estagnada” e deve desacelerar significativamente nos próximos trimestres. Com efeito, a crise se expande ao mercado de trabalho. A taxa de desemprego nos EUA subiu para 6,1% em agosto, o maior nível desde setembro de 2003. O departamento de trabalho informou que, neste mês, foram eliminados 84 mil postos de trabalho, além dos 60 mil, em julho, e os 100 mil, em junho.
As explosivas notícias da semana não podiam deixar de repercutir nas bolsas de valores de todo o mundo. Assistiu-se a quebradeira geral e a nossa Bovespa, apesar dos sólidos fundamentos da economia, não ficou imune. Se, em todo o mês de agosto, ela caiu 6,4%, só no dia 10 de setembro o Ibovespa (índice que mede as atividades da bolsa) caiu 4,5% e no mês de setembro as perdas acumuladas atingiram 13%. No total do ano, as perdas já são de 24,18%. Com isto, o valor de mercado das empresas brasileiras, de maio até agora, caiu 30,8%, o que significa a perda de US$ 432 bilhões de dólares. As ações de empresas como a Vale e a Petrobrás perderam 33,74% e 34,45% de seu valor, respectivamente.
Agora se apressam os analistas a declarar que não são partidários da tese do “descolamento” dos emergentes. O economista Ramón Aracena, especialista em Brasil do Instituto de Finanças Internacionais, por exemplo, declarou que “nunca acreditei na tese do descolamento” e que, apesar dos bons fundamentos, o país “não está imune”.
E cada vez mais o efeito manada empurra os especuladores na direção de maior segurança. Os capitais estrangeiros fogem do país e os pequenos “investidores”, desencantados com o emudecimento da sereia, procuram salvar o que podem. A bolsa oscila e continuará no sobe e desce ao sabor das notícias sobre falências que certamente virão.
Isto é apenas o começo. Quem tinha ações da Petrobrás, por exemplo, já perdeu 34,45% do valor. Somados os prejuízos, a destruição de capitais já está em marcha e pode ser estimada em trilhões de dólares. Continuamos ainda em direção ao fundo do poço.
Mas, imune a tudo isto, como um gigantesco avestruz que esconde a cabeça no solo diante do perigo, o Banco Central do Brasil decidiu aumentar a taxa básica de juros (Selic) em 0,75%, mais uma vez garantindo a rentabilidade do capital financeiro sob a alegação da ameaça da inflação que parece só existir na cabeça do Henrique Meirelles, seu presidente.
Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira
(progeb@ccsa.ufpb.br)
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