quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Os Primeiros Reflexos da Crise no Brasil

Semana de 13 a 19 de outubro de 2008


Quando a tese do descolamento da economia brasileira, em relação à crise econômica internacional, ainda era amplamente defendida, já tínhamos alertado que o Brasil não escaparia ileso, nem estaria imune aos efeitos globais desta crise. Também já havíamos chamado a atenção para os primeiros reflexos da turbulência internacional, na economia brasileira, que agora, estão bem mais visíveis, começando a preocupar empresários e consumidores e fazendo até mesmo o presidente Lula mudar de opinião. Ele que, até poucos dias atrás, insistia em dizer que a crise era um problema dos Estados Unidos, cabendo, portanto, a eles resolvê-la, foi obrigado a reconhecer que “ela é tão profunda que nós ainda não sabemos o que vai ser amanhã”.
Parece que a extensão e a profundidade da atual crise são realmente bem maiores do que todos imaginavam, e, no caso do Brasil, que parecia protegido, essa percepção é ainda mais notória. Alguns exemplos são bem ilustrativos: a) A fabricante de aviões Embraer anunciou recentemente que adiará a entrega de cinco jatos, encomendados por companhias americanas, européias e australianas, por não encontrar financiamento. Há riscos de que o negócio não seja realizado, o que significará uma perda de mais de US$ 160 milhões para a empresa; b) O crédito para o custeio dos produtores brasileiros de grãos foi fortemente reduzido, colocando em risco a próxima safra; c) Os bancos e as montadoras começaram a reduzir os prazos de financiamento, que, para automóveis, já baixaram de 99 para 72 meses; d) Fabricantes de autopeças, que estavam investindo no país para atender o mercado interno aquecido, já estão refazendo seus planos, preparando férias coletivas diante dos cortes de pedidos e da previsão de que a produção de veículos registrará uma queda de 10% a 15% este ano.
Neste quadro, a perspectiva é de que a situação ainda está longe de melhorar. De acordo com pesquisa elaborada pela Quorum Brasil, as empresas brasileiras e multinacionais instaladas no país acreditam que a crise irá durar dois anos e terá um impacto médio sobre a economia. Foram entrevistados 80 presidentes e diretores de companhias de capital nacional e estrangeiro.
No clima de incerteza, com relação à manutenção do nível de investimentos, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), considerado pela ministra Dilma Rousseff como um programa anticíclico capaz de assegurar o nível de investimentos no Brasil, se torna cada vez mais incerto – diga-se de passagem, que o programa já não andava bem das pernas, com projetos que nem saíram do papel – pois boa parte dos recursos depende da iniciativa privada, que já não encontra mais fontes de financiamento como antes.
Para responder à falta de crédito que começa a ser observada, o Banco Central informou que vai liberar mais de R$ 100 bilhões do depósito compulsório para “irrigar o mercado”. Permanece, porém, a seguinte dúvida: com essa medida os bancos vão voltar a conceder crédito para as empresas e os consumidores, ou vão aplicar esses recursos no próprio mercado interbancário, a exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos, onde o governo teve de conceder crédito diretamente para as empresas?
Enquanto aguardamos essa resposta, na Europa, a intervenção dos governos já está ocorrendo de
forma conjunta. Numa operação global de resgate, na segunda-feira (13 de outubro), os governos dos principais países europeus anunciaram que irão comprar ativos e conceder empréstimos multimilionários, para os bancos em dificuldades, no valor de US$ 2,2 trilhões. Somente para citar alguns exemplos, no Reino Unido, o governo anunciou um pacote de US$ 64 bilhões; na França, de US$ 487 bilhões; na Espanha, de US$ 135 bilhões e na Alemanha, de US$ 650 bilhões.
Ou seja, já não se tem mais a noção de qual é o tamanho real do rombo financeiro existente na economia global, e o governo brasileiro, que iniciou a sua intervenção apenas recentemente, parece ainda ter muito a enfrentar. Que se preparem, então, as robustas reservas internacionais.
A Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), já prevê que a atividade econômica da região será significativamente afetada pela escassez de crédito e instrumentos de financiamento. Segundo Osvaldo Luis Kacef, diretor da divisão de desenvolvimento econômico do órgão, a América do Sul tende a ser menos afetada que os países da América Central, pois estes, além da falta de crédito, sofrerão devido à proximidade física com os Estados Unidos e a maior dependência comercial.
E os reflexos da crise já se fazem presentes também no plano político: é o que se observa com a volta a evidencia do Partido Comunista dos Estados Unidos. Cada vez mais pessoas buscam informações sobre o Partido, graças à crise econômica, que sempre acaba por colocar em dúvida a capacidade da economia de mercado em alocar, de forma racional e eficiente, os recursos sociais. Assistimos, portanto, o ressurgimento da tese de “crise do capitalismo”, tal como ocorreu em 1929. Mas não se deve concluir, a partir daí, que esse será o fim do sistema, pois, se trata apenas, de mais uma de suas etapas.

Texto escrito por:
Diego Mendes Lyra: Mestrando em economia, Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb – Projeto globalização e crise na economia brasileira.
(progeb@ccsa.ufpb.br)

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