quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Desta vez, quem será o “bode expiatório”?

Semana de 17 a 23 de agosto de 2009

Embora se acredite que há sinais de recuperação na economia mundial, os dados ainda não dão nenhuma certeza de que isto de fato esteja ocorrendo. Os que apostam que a retomada já se iniciou apegam-se a dados ligados aos mercados financeiros e ao resultado do PIB de algumas economias que, no segundo trimestre do ano, tiveram variação positiva do produto, depois de quatro ou cinco trimestres de queda. São elas: Japão, Alemanha, França, entre outras.
O Fundo Monetário Internacional, FMI, é um dos defensores da tese de que o pior já passou; porém, ao mesmo tempo em que profere um discurso em tom otimista, faz uma série de ressalvas acerca do processo de recuperação. Segundo a instituição, a recuperação já começou, mas a retomada será difícil, porque a crise deixou marcas profundas, que durarão vários anos. Conforme o economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard: “nas recessões normais, tão destrutivas para as empresas e o emprego, as questões melhoram de maneira previsível, mas a recessão mundial atual está longe de ser normal”. Blanchard acrescenta ainda que “o mundo não está passando por uma recessão trivial. A recuperação não será fácil. A crise deixou profundas cicatrizes que terão conseqüências sobre a oferta e a demanda por vários anos”.
Em função de tais perspectivas, o Fundo aconselha às autoridades de todo o mundo a manterem seus programas de estímulo pelo período que for “necessário à retomada do caminho do crescimento”. Resta saber quanto tempo durará este período, se o Estado irá, de fato, ter condições de manter os gastos no ritmo necessário e, caso consiga, se isto irá evitar o pior, isto é, uma nova grande depressão em escala planetária.
O temor do FMI é legítimo, já que não há nenhum forte indício que denote a reversão da fase de crise. Se algumas economias saíram da recessão, porque tiveram ligeiro crescimento no segundo trimestre, outras entraram, como Chile e Argentina. Além disso, os dados de emprego continuaram a piorar, e o consumo dos norte-americanos, responsável por 70% do PIB dos Estados Unidos, não dá nenhum sinal de recuperação. A perspectiva dos economistas é que, se a retomada tiver que passar pelos gastos dos americanos, a situação está complicada, pois a queda dos salários e o aumento do endividamento, combinados ao assustador aumento no desemprego, evidenciam a impossibilidade de serem retomados os gastos de consumo no nível desejado. Assim, sem demanda, não há oferta e vice-versa; uma alimenta a outra, seja para o bem ou para o mal.

Total de salários pagos - Setor privado (indústria e serviços) - Estados Unidos(*)
* Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem.

Fonte: Dados retirados do http://www.bea.gov/

Para Blanchard a solução passará pelo aumento do consumo interno de países asiáticos que têm grandes superávits em conta corrente. Todavia, cabe ressaltar que a renda média nestes países é infinitamente menor que nos Estados Unidos, cabendo ao Estado uma parte significativa da demanda. Mas, o poder de fogo dos governos parece que não manterá o mesmo ritmo. O governo chinês já prevê agora, para o segundo semestre, uma diminuição na compra de commodities e, em julho, reduziu em 70% a concessão de crédito no país. Confirmada a expectativa, as commodities sofrerão nova queda de preços, com conseqüências nocivas para as bolsas de valores e economias de países subdesenvolvidos, como é o caso do Brasil. E uma nova onda de desespero tomará conta dos especuladores, que vêm utilizando justamente as commodities nos “jogos” feitos nas bolsas de valores dos países chamados de emergentes.
Nas últimas semanas, analistas previam uma baixa nas importações chinesas; mas houve novo recorde na compra de minério de ferro (56,5 milhões de toneladas) e de petróleo em julho. Mas, as importações de alumínio e cobre caíram 37% e 15%, respectivamente, no mesmo período, em relação ao mês anterior.
O banco francês Natixis estima que as fortes importações chinesas de julho não são sustentáveis, considerando as projeções para a economia mundial, e alerta que a situação começará a mudar no segundo semestre. O Royal Bank of Scotland também publicou ontem estudo no qual sugere prudência sobre o que esperar da demanda doméstica chinesa nos próximos meses.
Os dados do varejo dos Estados Unidos indicam a permanência da crise no consumo. No mês de julho, a rede Target sofreu queda de 2,7% em suas vendas e o Wal-Mart, de 1,2%. A Saks, que vende artigos de luxo, teve retração de 15,5%, e a Home Depot registrou queda de 9% nas vendas trimestrais. A expectativa dos executivos do setor é que as condições só irão melhorar depois do segundo trimestre de 2010. Em função disto, algumas lojas estão reduzindo os estoques, preparando-se para as fracas vendas que são esperadas nas temporadas de volta às aulas e natalina.

Estimativas de vendas mensais no varejo para os Estados Unidos, excluindo veículos automotores e partes conexas(*)
* Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem.

Fonte: Dados retirados do http://www.census.gov/



Por outro lado, os bancos de pequeno e médio porte continuam quebrando. Neste ano, 72 instituições de crédito foram à falência nos Estados Unidos. Este é o maior número desde 1992. Espera-se que muitas outras instituições tenham o mesmo destino, à medida que a recessão aumentar os calotes e inchar a lista confidencial dos “bancos problemáticos”, que contava com 305 instituições no primeiro trimestre.
Atualmente, mais de 150 instituições de crédito de capital aberto, nos Estados Unidos, têm empréstimos não-quitados equivalentes a 5%, ou mais, do total do crédito concedido. De acordo com pessoas que já trabalharam em órgãos reguladores no país, este nível pode acabar com o capital de um banco e ameaçar a sua sobrevivência. E, segundo dados compilados pela Bloomberg, o número de bancos que ultrapassou esse limiar mais do que dobrou nos últimos 12 meses até junho.
O Governo dos Estados Unidos anunciou que, nos próximos meses, suspenderá os pacotes de ajuda que, só para não “deixar a peteca cair”, já ultrapassaram os US$ 12 trilhões. Isso para não falar no caráter das medidas adotadas, até então inéditas, como: dar garantias ao endividamento de empresas, comprar hipotecas (US$ 682 bilhões) e títulos de agências hipotecárias, “ativos podres” (US$ 105 bilhões de um total de US$ 200 bilhões), emprestar grandes somas de dinheiro aos grandes bancos sem data de vencimento, etc. O que se pode esperar se a promessa for cumprida? Quem será o novo “bode expiatório”? Veremos a verdadeira face da crise! Veremos, para além do debate acadêmico “livre mercado versus intervenção estatal”, para que (ou a quem) serve o Estado.
O problema maior é que a crise atual é tão profunda que, se o Estado conseguir estancá-la (o que não acreditamos que ocorrerá), não lhe restará nenhum centavo em caixa.
A pergunta que fica é: a atual crise quebrará o Estado, o capital ou a morte do capitalismo só poderá evitada ao preço de uma catástrofe do tipo da 2ª Guerra Mundial, com toda a destruição causada e com os milhões de inocentes mortos, como aconteceu após a Grande Depressão?


Texto escrito por:
Águida Cristina Santos Almeida: Professora do Departamento de Economia e Finanças da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG e integrante do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br.

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