segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Uma recuperação sofrida

Semana de 23 a 29 de novembro de 2009


A recuperação da economia mundial continua em marcha. Como vínhamos falando, a fase de crise do ciclo econômico já foi ultrapassada. Passamos à fase de depressão e estamos lentamente entrando na reanimação. Isto parece ser a voz comum a todos os analistas. O problema que se discute agora é o ritmo desta recuperação e sua solidez. O diretor gerente do Fundo Monetário Internacional, Dominique Straus- Kahn, em Londres, reconheceu que os países desenvolvidos continuam vulneráveis e dependentes dos estímulos dos governos e recomendou a manutenção das políticas financeiras, monetárias e fiscais de apoio, a fim de não estrangular a recuperação. Já o economista chefe do mesmo banco, Olivier Blanchard, em entrevista ao jornal “Le Monde”, alertou os países emergentes quanto à formação de bolhas especulativas, acumulação de reservas e movimentos incontroláveis de capitais, atraídos por juros elevados. O medo de possíveis calotes por parte dos governos ricos, endividados com os trilhões de dólares das ajudas concedidas, assumiu uma forma de manifestação com a declaração do pequeno e rico emirato de Dubai de que o conglomerado estatal Dubai World pediu moratória para uma dívida calculada em US$ 59 bilhões. O efeito Dubai, como passou a ser chamado, propagou-se derrubando todas as bolsas que reagiram com intenso nervosismo. Londres caiu 3,28%; Frankfurt, 3,25%; Zurique, 2,16% Amsterdã, 3,62%, etc. A quebradeira continuou por todo o dia seguinte.
Este pessimismo é agravado pelas notícias do desempenho da economia dos EUA. O desemprego continua a crescer; as previsões de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foram reduzidas, de 3,5%, para 2,8%; o número dos bancos com problemas elevou-se para o mais alto nível dos últimos 16 anos, atingindo 552; 50 bancos já quebraram no terceiro trimestre deste ano e o Federal Deposit Insurance Corp. (FDIC), órgão que garante os depósitos bancários, determinou o fechamento de mais bancos, chegando a 124 o número de fechamentos só em 2009, nível mais elevado dos últimos 17 anos.
Na zona do euro, há sinais de recuperação, mas os analistas também demonstram preocupação. A taxa de desemprego subiu, de 9,5% em agosto, para 9,7% em setembro, patamar mais alto desde 1999; a valorização de 18%, do euro frente ao dólar ameaça as exportações do bloco; o ritmo de crescimento das encomendas da indústria caiu em novembro, em relação a outubro e o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, alertou que a economia deverá recuperar-se “gradualmente” em 2010. No outro lado do mundo, vários ministros do governo japonês pressionam o Banco Central exigindo uma intervenção mais dura para combater uma nova ameaça, a deflação.


Taxa de desemprego para a zona do euro - Nov.09 (***)

(*) Dados para o 3º trimestre de 2009
(**) Dados para o mês de setembro de 2009
(***) Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem


Neste ambiente, contraditoriamente, os dados apontam para uma retomada mais sólida em alguns setores da economia brasileira. Desta vez, parece que o ministro Mantega ainda continua mantendo a liderança na determinação das linhas da política econômica. A redução de IPI para os carros flex foi prorrogada até março de 2010. Os veículos com motores a gasolina seguirão a tabela progressiva já anunciada. Para os caminhões, a alíquota será zero até 30 de junho de 2010. Para os fabricantes de móveis, a alíquota também será zero até 31 de março do próximo ano e, para materiais de construção, até 30 de junho. Os produtos da linha branca também continuam com o IPI reduzido. Somadas as benesses, a renúncia fiscal será de R$ 25,66 bilhões apenas neste ano. O ministro promete ainda analisar a redução dos impostos para os materiais escolares e desonerar as folhas de salários das empresas.
Mas, a fúria do governo não fica por aí. O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) resolveu financiar a compra de caminhões e camionetes com juros de 2% ao ano, 10 anos para pagar e três de carência. Ao mesmo tempo, o ministro da Defesa anunciou a aquisição de 2.000 blindados de um novo modelo, o Guarani, para reequipar as forças armadas nacionais, a serem fabricados pela Fiat/Iveco, em Sete Lagoas (MG), e ao custo de US$ 1,5 milhão cada um.
No mercado de trabalho, também é comemorado o saldo positivo de empregos cujo número atingiu 933 mil até setembro. Lamentavelmente, destes novos empregos, 99,8% correspondem a salários até dois mínimos, dos quais 45% foram vagas de um salário mínimo. Entre os demitidos, 425 mil correspondiam a salários superiores a dois mínimos. Observa-se, portanto, uma certa degradação nos níveis de salários, o que pode ser justificado pela alta da participação da construção civil, que bateu recordes de admissão de novos trabalhadores.
No setor financeiro, continuando a política de bombeiro dos bancos oficiais, que durante a crise socorreram, com empréstimos, a Sadia e o banco Safra, o Banco do Brasil comprou o Banco Votorantim, e a Caixa Econômica adquiriu 49% do capital votante do Banco Panamericano, entregando R$ 750 milhões ao grupo Silvio Santos.
O desespero do governo para estimular a economia, a qualquer custo, antes das eleições, vemcomprometendo o superávit primário, antes, tão defendido por ele próprio como imprescindível ao bem da1,17%, para 1% do PIB, afastando-se ainda mais da meta que era de 2,5% para todo o ano. Por outro lado,o déficit nominal do setor público continuou crescendo, passando, de 4,29%, para 4,61% no mesmoperíodo. Neste caso, os juros da dívida são apontados como o maior responsável pelo aumento, apesar daqueda da taxa selic de 13,75% para 8,75%. 
E para completar a felicidade nacional, enquanto esperamos o “excelente Natal” prometido pelo presidente do Banco Central, H. Meireles, assistimos, em outubro, ao maior déficit do ano nas contas externas do país e ao desabamento do dólar ao menor patamar dos últimos 16 meses, enquanto nos envenenamos com as nossas emissões de gases estufa que aumentaram 62% nos últimos 15 anos.


Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do Progeb-Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira
Email: progeb@ccsa.ufpb.br


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