Semana de 08 a 14 de fevereiro de 2010
A globalização vem se desenvolvendo ao longo dos tempos através das várias expansões do comércio internacional e de suas seguidas transformações. Grosseiramente, poderíamos defini-la como uma progressiva integração das esferas de produção, distribuição e consumo dos países do globo. O que preocupa em momentos de crise, entretanto, é que esta união, assim como o matrimônio, é válida na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, e todos sabem disto.
Não foi sem razão que o “espectro do nervosismo” rondou a Europa esta semana e espalhou-se pelo resto do mundo, refletindo-se nas bolsas de valores. A ansiedade dos especuladores, que tinha como fonte a situação da dívida pública grega, só diminuiu após o anúncio, nesta quinta-feira, de que, caso o país precisasse, seria socorrido pelos seus parceiros de bloco econômico. Embora tais especuladores não saibam ao certo o porquê, sua preocupação realmente tem fundamento.
A função do dinheiro como Meio de Pagamento consiste em viabilizar o ciclo das mercadorias apenas por intermédio de dinheiro ideal, ou seja, sem a presença física do dinheiro. Durante a crise, esta função do dinheiro foi demasiadamente utilizada na tentativa de minimizar a destruição de capitais e trazer rapidamente de volta o crescimento econômico mundial. O fato que não é do conhecimento da maioria dos “policy-makers” (elaboradores de políticas econômicas) é que a recuperação econômica não depende de suas vontades, mas sim das “vontades” do Modo de Produção Capitalista.
Assim como esta função do dinheiro pode servir para “driblar” momentos ruins, ela também é uma das formas de manifestação das crises. Diante disto, se a destruição de capitais não se completou devido a sua utilização, em virtude dela, a crise voltará. E, ao que tudo indica, é o que está para acontecer.
Não só a Grécia, mas também Portugal, Irlanda e Espanha estão com as contas públicas em situação de risco. A semelhança da situação de tais países foi reconhecida pelos agentes econômicos através da criação da sigla Pigs para fazer referência a eles. Juntos, os Pigs têm uma dívida com bancos europeus que atinge a cifra de US$2 trilhões. Só a Grécia possui US$330 bilhões desta dívida. Assim, caso o país decretasse moratória, deixando de honrar com seus compromissos, esta situação crítica facilmente espalhar-se-ia pelo bloco europeu via sistema financeiro.
A tão glorificada economia chinesa não deixa por menos. Segundo o advogado especialista em falências Niel McDonald, já há “trilhões e trilhões de yuans em empréstimos de difícil recuperação na China, e ninguém está fazendo nada a esse respeito”. Em virtude deste acúmulo de “créditos podres” no país, o advogado não hesitou em afirmar: “Em algum momento deverá haver algum ajuste de contas para isso”.
Mas, isto não é tudo. A situação pode ainda tomar proporções maiores do que se imagina. Isto porque, segundo a consultoria McKinsey, a dívida das dez economias mais desenvolvidas do mundo aumentou 60% desde 2000 e hoje alcança a casa dos 40 trilhões. O fato é que este montante representa 330% do PIB destes países, ou seja, é cerca de três vezes maior do que a riqueza que eles produzem.
Neste caso, portanto, não só é possível, como também é bastante provável que as barreiras que impedem o consumo, conteúdo das Crises Cíclicas de Superprodução, se manifestem através de outra forma e tragam de volta o cenário de crise econômica. Resta-nos saber, contudo, se veremos apenas o desenrolar de uma crise complementar ou de uma catástrofe.
No Brasil, a situação é bem diferente da européia. Em janeiro deste ano, na comparação com janeiro de 2009, a inadimplência da economia caiu 3,14% e houve um aumento de 3,12% nos pedidos de cancelamento de registros no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). Em virtude disto, constatou-se, no mesmo período, um aumento de 7,11% nas vendas a prazo no varejo. Devido a estes e outros estímulos, ocorreu um aumento de 0,54% no emprego na comparação do mês passado a dezembro de 2009. Este aumento representa uma criação de 12 mil postos de trabalho. Por sua vez, o Nível de Utilização da Capacidade Instalada do mês de dezembro, que subiu, de 81,3% em novembro, para 81,7%, já apontava nesta direção.
Todavia, embora se verifique claramente o surgimento das condições para a retomada do crescimento na economia brasileira, esta situação pode ser revertida. Por melhor que esteja a situação da nossa economia frente ao resto do mundo, caso um novo mergulho seja deflagrado pela Grécia, a situação de crise espalhar-se-á não só pela União Européia. Em um segundo momento, ela irá espalhar-se por todo o mundo. A globalização não só é válida para países que integram um mesmo bloco econômico, mas também para as demais economias do globo, pois todas elas estão, de algum modo, ligadas economicamente.
Portanto, em virtude das contradições geradas pelo fenômeno globalização, somos obrigados a anunciar que a recuperação da economia brasileira, se não for revertida, será, pelo menos, deformada pela presença de taxas de crescimento menores que o esperado. E isto ocorrerá com qualquer economia que esteja integrada ao movimento cíclico mundial do capitalismo, pois é assim que são as tão faladas Crises Cíclicas de Superprodução.
Texto escrito por:
Antonio Carneiro de Almeida Júnior: Economista, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico da UFPR, PPGDE/UFPR, e pesquisador do PROGEB - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br
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