domingo, 28 de março de 2010

Por quem os sinos dobram?

Semana de 01 a 07 de março de 2010

No cenário internacional, alguns acontecimentos deram a tônica das principais preocupações da semana. Um deles foi o risco de superaquecimento na China. As previsões, num cenário otimista, eram para um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país de 8,4%. Diante do desempenho da economia chinesa em 2009, alteraram-se as expectativas. Em 2010, num cenário mais pessimista, o PIB daquele país cresceria 9,6% e num cenário otimista, 11,5%.
Este crescimento para além do previsto tem sido atribuído, em grande parte, aos estímulos sem precedentes, como o de 4 trilhões de renmimbis em programas de investimentos (US$ 600 bilhões, ou 12% do PIB), 950 bilhões de renmimbis (US$ 140 bilhões, ou 35% do PIB) de déficits orçamentários e 10,5 trilhões de renmimbis (US$ 1,5 trilhões, ou 31% do PIB) em novos empréstimo. O investimento, que tem sido a chave do crescimento do PIB, subiu 30% em ativos fixos em 2009, 4,6% a mais do que em 2008. A proporção investimento/PIB, estimada em 55% um ano atrás, agora passou para 67%.
Nos Estados Unidos, os fundos de hedge, que são remunerados utilizando a estratégia de fazer operações para garantir outras operações contratadas, lançaram uma forte investida contra o euro, que teve sua cotação reduzida, de US$ 1,51, para US$ 1,35, o que, na perspectiva do mega especulador Geoge Soros, só não levará o euro a bancarrota se a União Européia alterar a sua política monetária e financeira. Poucos são, no entanto, os operadores que acreditam que o valor do euro desmoronará totalmente, como ocorreu com a desvalorização da libra esterlina em 1992, na esteira de uma grande aposta, do mesmo especulador, que naquela ocasião teve um ganho equivalente a US$ 1 bilhão.
Por seu lado, o Banco Central Europeu (BCE) anunciou que retomará o seu formato padrão de agir, retirando gradualmente as medidas extraordinárias de ajuda à economia da zona do euro. Mas, o pesidente do BCE, Jean-Claude Trichet, afirmou que continuará a sua linha de empréstimos e manterá o nível baixo da taxa de juro, 1%. O BCE, além disso, manterá estáveis as previsões para o crescimento e para a inflação da zona do euro neste ano, reduzindo as previsões para o ano que vem. No interior do bloco, o governo da Grécia continuou a agir drasticamente no sentido de eliminar seu déficit de €$ 4,8 bilhões, através de medidas que impõem cortes orçamentários, como o congelamento, por um ano, das pensões dos servidores públicos e a redução de 30% dos abonos salariais além de aumentos gerais de impostos, que devem crescer em 2% sobre o valor agregado, particularmente sobre cigarros e gasolina.
No hemisfério Sul, em conseqüência do tremor de terra, agravou-se a situação econômica do Chile, com seus reflexos nos países com os quais mantém relações comerciais, principalmente os importadores do cobre chileno, que verão afetados os preços dessa matéria-prima. Outros acontecimentos de realce nessa parte do globo foram as assinaturas de um tratado de livre comércio entre o Peru e a China, que já entrou em vigor, e entre Peru e Colômbia, com a União Européia. Nesse último, o principal interesse da Europa parece ser o de exportar automóveis, máquinas, serviços, vinho e produtos lácteos. Estes tratados trarão, sem dúvidas, conseqüências para o Brasil, como por exemplo, a possibilidade de importação de produtos chineses com tarifa zero, através do Peru.
E já que falamos de Brasil, o Banco Central do país prepara uma revisão das normas para operações de câmbio. Henrique Meireles, seu presidente, afirma querer uma limpeza das regras ainda esse ano. O objetivo é o de conter a acumulação de créditos tributários criados no recolhimento dos impostos nas etapas de produção das mercadorias para exportação. Com as medidas se pretende facilitar as exportações brasileiras e aumentar a competitividade do país. Para Meireles, é preciso fazer uma limpeza das normas, eliminando regras anacrônicas e simplificando procedimentos necessários para ingressos e  remessas de moedas estrangeiras.
Enquanto no exterior, se discute o tamanho dos bancos no pós crise, no Brasil, a concentração bancária não para de avançar. Os oito maiores bancos brasileiros concentram, nesse momento, 88,6% do total do sistema financeiro, onde se destaca o Banco do Brasil, que concentra 20,1% de todos os recursos concedidos por meio de empréstimo bancário. A Caixa Econômica Federal responde por 8,8% dos empréstimos. Somando-se os bancos públicos menores e o BNDES, a participação estatal no sistema financeiro supera os 41% do total.
Comenta-se que, antes mesmo do início do ciclo de alta do juro básico pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, a taxa real de juro projetada para 12 meses está em 6%. Mesmo sem a elevação da Selic, congelada desde julho do ano passado, em 8,75%, esta taxa básica já é a maior taxa de juro real do mundo e, de acordo com o ranking organizado pela consultoria UP Trend, vem seguida pela Indonésia, com 3,6%, e pela China, com 3,3%.
Com semelhante taxa de juro aliada à desconfiança crescente no Euro e a pouca confiabilidade na economia americana, os investidores estrangeiros carreiam os seus recursos para aquisição de ativos denominados em reais. A primeira vista, isso pode parecer que a credibilidade da economia brasileira está em alta. No entanto, esta aparência não corresponde à realidade. É bastante observar a economia para constatar que o risco de inflação é uma realidade admitida por todos. A inflação medida pelo Índice de Preços do Consumidor Amplo (IPCA) fechou o ano passado em 4,3%, pouco abaixo da meta de 4,5% pretendida pelo Banco Central. Em janeiro deste ano, houve, no entanto, uma aceleração do índice, que registrou 0,75% de aumento, a maior alta mensal desde maio de 2008. Pode-se observar também que apesar do recorde de exportação, o saldo da balança comercial, em fevereiro, é o menor desde 2000 e que não houve nenhuma inovação substancial para melhorar o desempenho da economia. Esse é um país tão precário que até as multas de trânsito, que supostamente deveriam ser usadas como fundo para salvar vítimas, estão sendo desviadas e usadas para pagamento dos juros da dívida pública.
Afinal, é caso de se perguntar: “Por quem os sinos dobram?”

Texto escrito por:
Elivan Rosas Ribeiro: Professora do Departamento de Economia da UFPB e Pesquisadora do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br

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