quinta-feira, 28 de abril de 2011

Os “cavalos selvagens” do governo Dilma

Semana de 18 a 24 de abril de 2011

Nelson Rosas Ribeiro[i]

A conhecida revista britânica “The Economist” criou a expressão “cavalos selvagens” para identificar os dois grandes problemas a serem “domados” pelo governo atual: a inflação e a valorização do real. Tudo indica que o grande instrumento que o governo continua usando para isto, o juro, é no mínimo contraditório e inócuo. Na quarta-feira da semana passada, o Banco Central (BC), na reunião do Copom, usando como pretexto a ameaça da inflação, brandiu, mais uma vez, os juros elevando a taxa básica Selic em 0,25% e fazendo-a atingir o patamar de 12% ao ano. Com mais esta elevação, o país consolida o incontestável posto de campeão mundial com uma taxa de juros real (juros menos inflação) de 6,2% ao ano. O segundo lugar fica com a Turquia, com 2,2%, ou seja, aproximadamente um terço da taxa brasileira.

Os protestos, paradoxalmente, vieram de burgueses e proletários, em mais uma estranha unanimidade. No setor industrial, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) comentou que a medida “é inadequada” e “causa grandes danos, onera o setor produtivo e encarece o investimento”. Para a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), ela desestimula o setor produtivo, prejudica a geração de emprego e aumenta a dívida pública. Desta vez o setor comercial também protestou. Roque Pellizzaro Junior, presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) afirmou que “o remédio pode matar o doente”, “vai na direção contrária da solução”, “prejudica o investimento” e “aumenta o desequilíbrio entre oferta e procura”.

No outro pólo, as representações dos trabalhadores também não se calaram. A Força Sindical, através do seu presidente Paulo Pereira da Silva, considerou “desastrosa” a decisão e que “o espírito conservador” da política monetária “atende aos interesses do capital especulativo”. A confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), ligada à Central Única dos Trabalhadores (CUT), considerou a medida negativa para o emprego e renda.

As tímidas manifestações de aplauso vieram dos agentes descarados do capital financeiro e de alguns monetaristas fanáticos que desejavam um aperto ainda maior nos juros.

Envergonhado, e com complexo de culpa pelo seu passado heterodoxo, o ministro Mantega timidamente defende a medida adotada, encenando ser mais realista que o rei no combate à inflação. No entanto, todos os argumentos levantados voltam-se contra seus próprios autores. A inflação é de demanda, dizem, e por isso é preciso reprimi-la com os juros. Ora, com juros altos reprimem-se os investimentos e com isso a oferta jamais crescerá perpetuando-se eternamente o desequilíbrio. Além disso, segundo eles, os preços que mais estão afetando o IPCA, são: os das commodities, que são determinados fora do país e não são controlados pela política econômica interna; os dos produtos alimentícios, por causa das condições climáticas e da entressafra (que dependem de São Pedro e não dos juros) e os preços administrados, que dependem de decisões do governo (serviços públicos, energia, saúde, telecomunicações, combustíveis, etc.), e que ele próprio eleva.

Por outro lado, o aumento dos juros desequilibra ainda mais as contas públicas aumentando a dívida. Mesmo se não houvesse mais aumento de taxas, para todo o ano é estimado um total de juros de R$ 230 bilhões, o que significa 15 vezes o que é destinado ao Bolsa Família e cinco vezes todo o orçamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Lembremos que 35% do total dos títulos da dívida do país são remunerados pela taxa Selic e 30% deles, pelos índices de preços.

Ora, se a elevação dos juros é inútil para domar o primeiro cavalo selvagem, a inflação, para o segundo, ela é uma verdadeira bomba, um poderoso estimulante. Contrariamente ao que se costuma dizer, a enxurrada de dólares que encharca o país não se destina a investimentos diretos, mas sim à pura especulação. É capital faminto a procura de juros altos. Por isso, quanto mais altos eles forem, mais dólares cruzarão as fronteiras do país valorizando ainda mais o real. O pseudo remédio para domar um dos animais selvagens, a inflação, é estimulante para o outro, a valorização do real.

Tudo ainda seria suportável se a conjuntura mundial fosse favorável. Infelizmente, ela está “instável, desequilibrada, descoordenada e insustentável” para usar as palavras do premiê chinês Wen Jiabao. Para completar, a agência de classificação de risco Standard & Poor’s, apesar de manter a classificação do crédito dos EUA em AAA, reduziu a perspectiva, de “estável”, para “negativa”, pela primeira vez em 70 anos, fazendo tremer o rochedo americano e apavorando o mercado financeiro.

Pelo visto, os cavalos da presidenta Dilma continuarão selvagens!



[i] Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).

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