quarta-feira, 30 de abril de 2014

Recuperação lenta e desaceleração



Semana de 21 a 27 de abril de 2014


Nelson Rosas Ribeiro[i]


As tendências da economia mundial continuam a evoluir no mesmo sentido que temos apontado nesta coluna: recuperação lenta e contraditória.
Em sentido oposto caminha a economia brasileira que continua desacelerando.
Mais uma vez as esperanças voltam-se para os EUA, embora os analistas considerem que, nesse país, a recuperação, iniciada em junho de 2009 quando a economia voltou a crescer, tem sido “desagradável, brutal, longa” e uma “das mais mornas dos tempos atuais”. Com efeito, nos últimos cinco anos o crescimento médio do Produto Interno Bruto (PIB) foi de 1,8% e, atualmente, a taxa de desemprego é de 6,7%, uma das mais altas para esta fase do ciclo. Estes dados são do Escritório Nacional de Pesquisa Econômica dos EUA (NBER, na sigla em inglês), órgão semioficial que estuda os ciclos no país. O crescimento considerado fraco é, porém prolongado e há quem estime que continuará até 2016 (Federal Reserve – Fed) ou mesmo 2017 (CBO – Escritório de Orçamento do Congresso dos EUA). A dificuldade está em encontrar explicação para o fato. Há mesmo quem utilize a expressão “estagnação secular”, causada pelo desemprego, queda no consumo e na produtividade.
Para piorar a situação, o Fed não pode utilizar os estímulos monetários, pois as taxas de juros estão próximas a zero e o afrouxamento monetário (Quantitive easing – QE) já ultrapassou os limites, exigindo agora a reversão que vem sendo praticada com o “tapering” (redução das compras de títulos pelo Fed).
A lentidão do processo de recuperação e a reversão da política monetária nos EUA desestabilizam o resto do mundo.
A União Europeia (UE) e particularmente os países do euro encontram-se em situação mais difícil. Consideram que a política monetária do Fed vem provocando a valorização da libra (11%) e do euro (7,8%) e criando dificuldades para a sua recuperação. Como a China também continua em desaceleração, a situação internacional afeta diretamente três dos maiores parceiros nas relações comerciais brasileiras: EUA, UE e China. Somando-se as dificuldades que a Argentina atravessa, é improvável qualquer estímulo para a economia brasileira vindo do comércio exterior.
Sem essa válvula de escape e com o agravante de toda a política de estímulos à antecipação das compras que foi praticada pelo governo, a situação torna-se bastante delicada, neste ano eleitoral.
Segundo a Sondagem Industrial feita pela Confederação da Indústria (CNI) a produção da indústria nacional continuou a cair em março juntamente com a utilização da capacidade instalada (71%) e o número de emprego. A situação financeira e o lucro operacional das empresas de manufatura registraram, no primeiro trimestre, em comparação com o último do ano passado, o pior cenário desde 2009. No setor automobilístico a situação é séria. Com a queda nas vendas e a ociosidade alta, as montadoras adiam as demissões recorrendo a todos os tipos de recursos disponíveis: paradas pontuais, antecipação de férias, afastamento temporário, demissão voluntária, férias coletivas, “layoff”, etc. Para a cadeia de fornecedores o efeito é quadruplicado, pois, para cada posto parado nas montadoras quatro são desativados nas fornecedoras. Mesmo assim, de janeiro a março o setor automotivo já demitiu 1.071 trabalhadores, no país, e no ABC a indústria de material de transporte eliminou 1.746 vagas. No setor de calçados a Grendene reportou uma queda nas vendas de 17,5%, no trimestre, e de 19,3% nos lucros e embora não esteja demitindo não contrata nenhum trabalhador para substituir os que se demitem. A Cia Hering do setor de vestuário informou que, em suas lojas, as vendas caíram 4,1% e o lucro líquido 6,9%.
Para surpresa dos economistas, apesar da desaceleração, e embora o ministro Mantega garanta que a inflação ficará abaixo do teto da meta (6,5%), o boletim Focus do Banco Central traz o resultado de suas sondagens, que apontam uma inflação acima deste teto, no final do ano.
A ser verdade, teremos a conjugação de dois fenômenos: desaceleração e inflação. Será o retorno da “estagflação” que ninguém quer admitir?


[i] Professor Emérito da UFPB e Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).
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