quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Mantega volta a prometer o impossível

Semana de 18 a 24 de agosto de 2014

Rosângela Palhano Ramalho[i]

            Desde o ano passado que os termos “confiança”, “credibilidade”, “expectativa”, “humor”, “pessimismo”, vêm sendo utilizados para dar significado ao lento e baixo crescimento brasileiro. Estes termos, ligados aos aspectos psicológicos das decisões individuais, parecem desconectados dos aspectos materiais que norteiam estas decisões. Se déssemos credibilidade a estas alegações, poderíamos tirar a seguinte conclusão: se o “humor” dos agentes econômicos melhorar, toda a atividade econômica se recuperará.
            Mas o fato é que a “confiança”, a “credibilidade”, a “expectativa”, o “humor”, o “pessimismo” dos agentes não derivam deles mesmos. Ou seja, não escolhemos se hoje estamos mais ou menos confiantes, mais ou menos crédulos, mais ou menos humorados ou mais ou menos pessimistas. As decisões econômicas são tomadas a partir da observação, previsão e concretização de uma realidade material.
Por esta razão, caro leitor, ainda não trazemos boas notícias.
Há uma grande expectativa quanto à divulgação das estatísticas referentes ao segundo trimestre, a serem publicadas nos próximos dias pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Mas, os resultados das sondagens realizadas no período e das prévias mensais, sobre os números do Produto Interno Bruto (PIB) e da indústria, não são animadores. O IBC-Br, por exemplo, índice mensal de atividade econômica do Banco Central apurou queda de 1,5% em junho, comparado a maio. Se este número se confirmar, o PIB encerrará o segundo trimestre do ano em queda de 1,2%, comparado ao primeiro trimestre.
A recessão técnica (dois trimestres seguidos de queda) estaria mais próxima com a atualização dos dados do primeiro trimestre que só cresceu 0,2%. Surgiram também sondagens menos pessimistas como a da Mauá Sekular, que espera uma queda do PIB de 0,8% no segundo trimestre e a da equipe econômica do Itaú que prevê uma queda do PIB de 0,4%.
A produção de automóveis (setor que apresenta os números mais críticos) recuou, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), 11,6% no segundo trimestre. O indicador de confiança da indústria da Fundação Getúlio Vargas (FGV) caiu 5,9%, também no segundo trimestre do ano.
            As dificuldades enfrentadas pela indústria estão se refletindo sobre o setor varejista. Segundo levantamento feito pelo jornal Valor Econômico, com base nos balanços de 17 varejistas e grupos de shopping centers, dez cortaram investimentos. Houve uma queda de 20,1% no investimento semestral quando comparado ao semestre anterior. E a Pesquisa Mensal do Comércio ampliada do IBGE, que inclui veículos e materiais de construção, recuou 3,1% no segundo trimestre.
O saldo final da redução da produção e das vendas será, provavelmente, de um semestre estagnado e, mesmo que ocorra uma melhora no segundo semestre, esta não será suficiente para recuperar o estrago ocorrido no primeiro.
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, tratou de adiantar que o ano está perdido para a indústria brasileira. Ele afirma não lembrar “... ter passado um período tão difícil como o deste ano e do ano passado.” Segundo a CNI, o crescimento anual do setor industrial não ultrapassará 0,8%.
            A realidade econômica atual é cruel. O ano para a economia está perdido de novo. Mas, novamente alheio à realidade, o nosso ministro da Fazenda, Guido Mantega, continua a achar que os seus discursos restaurarão a “confiança”, a “credibilidade”, a “expectativa”, o “humor” e debelará o “pessimismo” dos agentes econômicos, em especial dos empresários. Lembre caro leitor, que em maio deste ano, ele tinha, não prometido, mas garantido um ciclo de expansão econômica. Agora, o ministro foi além, declarando que não há uma crise na economia e que já há, no segundo semestre, sinais de retomada do crescimento. Segundo ele “a indústria levou um tombo em junho e em julho já voltou. Agora (com as medidas recentes) vai ter mais crédito, as vendas vão aumentar (...). O que vejo é uma economia saudável, estruturalmente sólida e que se defronta com problemas conjunturais”.
            Será que estamos falando do mesmo Brasil?



[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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