quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Mais um “pacote anticrise” no lombo do povo

Semana de 14 a 20 de setembro de 2015

Rosângela Palhano Ramalho[i]

Após entregar a proposta orçamentária para 2016, deficitária em R$ 30,5 bilhões, o governo muniu a artilharia da Standard & Poor’s, para que esta, finalmente, rebaixasse a nota do Brasil e fornecesse ao país o selo de mau pagador. O pânico se instalou. O Banco Central precisou ficar atento aos movimentos do mercado de câmbio. As empresas que participam do processo de concessões nas rodovias e aeroportos agora se apressam a pedir taxas de retorno maiores. Os caçadores de recompensa, como urubus, passaram a garimpar ganhos nos papeis de alto risco.
Na esteira das críticas, a presidente Dilma tentou minimizar o ocorrido lançando um novo pacote para sanar o déficit de 0,5% previsto no orçamento e transformá-lo em um superávit primário de 0,7% do PIB. R$ 66,2 bilhões é a economia que se pretende fazer ano que vem. Entre as medidas está a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), embora a proposta tenha sido rechaçada há apenas duas semanas. O governo ainda estima usar 30% das receitas do “Sistema S” (Sesi, Sesc, Senac, etc.). A alíquota do Reintegra, programa que devolve impostos pagos nas exportações, será reduzida para 0,1% e será limitada a dedução na distribuição dos lucros que as empresas fazem através da conta de juros sobre capital próprio.
Do corte de despesas de R$ 26 bilhões, R$ 12,4 bilhões figuram apenas como substituição de fontes de receitas. R$ 7,6 bilhões de gastos da Saúde e do PAC migrarão das receitas primárias da União e passarão a ser financiados pelo orçamento impositivo dos parlamentares. E R$ 4,8 bilhões do orçamento do programa Minha Casa, Minha Vida serão cobertos pelo FGTS. O maior corte, de R$ 10,5 bilhões, incidirá sobre o adiamento do reajuste dos servidores federais, de janeiro para agosto, suspensão de concursos públicos e o fim do abono pago àqueles servidores que podem se aposentar, mas que continuam trabalhando. Nas despesas correntes, o corte foi de R$ 2 bilhões e de R$ 1,1 bilhão da política de preços mínimos do setor agrícola.
A justificativa é sempre a mesma. É preciso o equilíbrio fiscal para a retomada do crescimento.
Dos recursos necessários para gerar o superávit, R$ 32 bilhões dependem da CPMF. Cinicamente, no lançamento do pacote, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ao falar sobre a alíquota de 0,2% da CPMF, concluiu: “São dois milésimos da entrada de cinema para fortalecer a Previdência Social, para pagamentos de aposentados, de benefícios a idosos e aos aposentados do Brasil. Os dois milésimos que tem que pagar no sanduíche vão dar bastante energia para a economia”.
O repúdio ao pacote começa a ser registrado. A Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos), a Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção), a Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados), a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) e a Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), registraram que a CPMF e as restrições ao Reintegra trarão mais recessão para a indústria. O vice-presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), Cláudio Bier, engrossa o coro dos que não concordam com as transferências do Sistema S, pois segundo ele, a medida transfere receitas “de quem funciona bem para quem administra mal”. Já os servidores públicos federais vão tentar barrar no Congresso Nacional, as medidas que os afetam diretamente e manifestações estão sendo programadas pelas centrais sindicais. O ex-presidente Lula também criticou as medidas e pressiona Dilma a mudar o foco da política econômica, substituindo o arrocho por uma política de estímulo ao crescimento.
Com baixíssima popularidade, é improvável que o governo consiga aprovar as propostas. A presidente Dilma começou a movimentação para “convencimento” do Congresso, pois dos R$ 66,2 bilhões necessários, R$ 62,2 bilhões dependem da aprovação da Casa. A presidente reforçou que “as medidas são o caminho necessário para que o Brasil volte a crescer e gerar empregos”.
Como ela própria parece não acreditar nisso, está difícil convencer o povo que, mais uma vez, sente o peso no lombo.

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br
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