quarta-feira, 29 de junho de 2016

O “fundo do poço”

Semana de 19 a 26 de junho de 2016

Rosângela Palhano Ramalho[i]

As opiniões sobre a evolução da economia nacional rumam para o consenso de que a atividade econômica estabilizou-se a um nível mínimo, o chamado “fundo do poço”. Instituições e economistas concordam em afirmar que a pior fase do ciclo econômico já passou, mas novos dados da indústria automobilística sugerem o contrário.
Em julho, a montadora chinesa Chery suspenderá a produção da fábrica no interior paulista. A empresa, que estava usando menos de 10% da capacidade instalada, acertou com os 180 trabalhadores da produção um afastamento via lay-off que se inicia em 4 de julho com retorno previsto para 5 de dezembro. As empresas automobilísticas esperavam uma reação até o fim do ano, mas, pelo visto, o ajuste da produção à queda das vendas demorará por mais algum tempo. A Renault deu férias coletivas de dez dias no setor de produção do furgão Master. A General Motors desativou a produção da fábrica de São Caetano do Sul em São Paulo até esta semana. A Iveco, desde 25 de maio, mantém afastados os operários da linha de caminhões pesados e, desde o dia 6 de junho, os operários que produzem furgões e o veículo militar blindado Guarani. A Volvo, recentemente, lançou um programa de demissões voluntárias para sanar o excesso de 400 trabalhadores.
Portanto, a situação econômica continua delicada e preocupante, pois de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o setor automotivo representa no Brasil, cerca de 23% do PIB industrial e, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), cerca de 5% do PIB nacional. Ou seja, o segmento tem grande peso na produção da riqueza nacional, e seu efeito de arrastamento se estende a várias indústrias como a de aços e derivados, máquinas e equipamentos, materiais eletrônicos, produtos de metal e artigos de borracha e plástico. Este é um sinal de que o cenário interno pode sim, piorar.
O impacto maior dá-se sobre o desemprego que não para de crescer. Segundo o Ministério do Trabalho, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), registrou a perda de 72.615 vagas formais de emprego, em maio. Foi o décimo quarto mês seguido de fechamento de vagas com carteira assinada. Nos primeiros cinco meses do ano, o total de postos fechados foi de 448.101 e nos últimos 12 meses encerrados em maio o fechamento de vagas foi de 1.781.906. Dos setores pesquisados só a agricultura e a administração pública abriram novas vagas em maio.
O governo interino ao mesmo tempo em que tenta driblar as intempéries provocadas por seus escolhidos para o comando das pastas, tenta manter vivo o oba-oba inicial. Desta vez, Michel Temer recebeu empresários do setor de bens de capital mecânicos, representados pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ). A indústria que provavelmente encerrará o quarto ano consecutivo de queda nos ganhos tem suas próprias demandas. Na esperança de ampliar as vendas externas, quer um câmbio competitivo. Para saldar suas dívidas quer um refinanciamento e recomenda que se mantenha ativo o papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Por fim, deseja estímulos para investir por meio da queda da taxa de juros. Todas as reivindicações vão contra as políticas do governo.
O Banco Central pressionado pelo discurso de que há a necessidade de retomar a sua “credibilidade” certamente não cortará os juros. Como opina parcialmente Nilson Teixeira, economista-chefe do Credit Suisse: “... o corte de juros no curto prazo prejudicaria o cumprimento da prioridade da instituição, qual seja, a de aumentar a crença de todos de que a inflação no Brasil diminuirá de forma gradual e contínua...”
O governo então se depara com uma imensidão de demandas. Políticas, sociais e econômicas e financeiras. Todas conflitantes entre si. Como não se pode agradar gregos e troianos, quem é que vai pagar o pato?
Não é necessário grande esforço para descobrir.

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br
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