Semana de 22 a 28 de outubro de 2018
Rosângela Palhano Ramalho
[i]
O processo eleitoral de 2018 foi concluído no
domingo, 28 de outubro. Como as pesquisas apontavam, o candidato do PSL, Jair
Bolsonaro, venceu o pleito para o cargo de presidente da República. Com 55,13%
dos votos válidos, o eleito obteve 57.797.847 votos, contra 44,87% de Fernando
Haddad do PT que obteve 47.040.906 votos. Os resultados também chamam a atenção
para o alto nível de abstenção: 21,3% dos eleitores não compareceram às urnas,
ou seja, 31.371.704 de eleitores.
Consolidado o resultado, o presidente eleito fez uma
primeira interlocução, não como de praxe, em espaço público ou na sede do
partido, mas em sua sala de estar, por meio do Facebook Live, o tipo comum de
“comunicação” utilizada ao longo da sua campanha. A fala foi explicitamente
direcionada aos seus eleitores. Sem modéstia, alimentou a posição de salvador
de pátria dizendo não querer “...ocupar a cadeira presidencial por um motivo
pessoal. Ocupá-la sim para que juntamente com uma boa equipe, boas pessoas ao
meu lado, nós pudéssemos ter sim, mais que a esperança, mas a certeza de mudar
o destino do Brasil.”
Usando no total, o nome de Deus 8 vezes, e invocando
a passagem bíblica “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” deu a
entender que o povo brasileiro marchava ignorante para a morte. Mas como o
despertar aconteceu a tempo, o povo entendeu “...que sabia para onde o Brasil
estava marchando e clamava por mudanças.” E, novamente, sem surpresas, deixou
claro quem é o inimigo a ser eliminado: “Não poderíamos mais continuar
flertando com o Socialismo, com o Comunismo e com o Populismo e com o
extremismo da esquerda.”
Mais uma vez, o agora presidente, desnuda sua
intenção. Demonstrando desconhecer noções básicas de história, política,
sociologia e de áreas afins e ignorando que as últimas gestões presidenciais não
passaram nem perto daquilo que é conceituado como socialismo, comunismo,
populismo e extremismo de esquerda, elegeu um inimigo que sequer existe. O tom
de seu discurso foi o mesmo da sua campanha.
Pois bem, minutos depois, ao decidir falar para todo
o povo brasileiro, o tom mudou. Visivelmente desconfortável ao ler um discurso
amaciado, afirmou: “Faço de vocês minhas testemunhas de que esse governo será
um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade.” E completou:
“Liberdade é um princípio fundamental: liberdade de ir e vir, de andar nas
ruas, em todos os lugares deste país, liberdade de empreender, liberdade
política e religiosa, liberdade de informar e ter opinião. Liberdade de fazer
escolhas e ser respeitado por elas.”
Mesmo não fazendo referência aos “supostos inimigos”
do Brasil como o fez na live, Bolsonaro destilou ranço nas entrelinhas:
“Libertaremos o Brasil e o Itamaraty das relações internacionais com viés
ideológico a que foram submetidos nos últimos anos. O Brasil deixará de estar
apartado das nações mais desenvolvidas.” Esta foi uma indireta para a
prioridade que supostamente se dá às relações para com o Mercosul. “Ressalto
aqui que os principais parceiros comerciais da pauta exportadora do Brasil não
estão apenas no Mercosul. São a China, os Estados Unidos, a Argentina, a
Holanda e a Alemanha”. Portanto, não há o que contestar. Haveria, caso o
resultado das urnas fosse o oposto, segundo o próprio Bolsonaro e seus
apoiadores repetiram inúmeras vezes. O pleito representa a vontade da maioria.
Mas, o presidente e sua equipe, como já destacado
nesta coluna, não enfrentarão problemas triviais. Não haverá soluções mágicas,
assim como já foi provado com o impeachment de Dilma Rousseff. O milagre não se
fez. Embora se tente demonstrar o contrário, os dados das nossas análises
anteriores, mostram que o ciclo econômico segue seu curso e que os problemas
sociais não desaparecerão da noite para o dia.
Como cientistas e apoiadores do sistema democrático,
o Progeb e seus pesquisadores continuarão a estudar a realidade e a elaborar
análises de conjuntura numa perspectiva crítica e resistirá às ameaças à livre
manifestação do pensamento.
[i] Professora
do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização
e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br)
Contato: rospalhano@yahoo.com.br