quarta-feira, 27 de março de 2019

Presidente Coca-Cola


Semana de 18 a 24 de março de 2019

Nelson Rosas Ribeiro[i]
           
De tédio não morreremos. A semana que passou foi extremamente rica em acontecimentos para rir e para chorar, para ter vergonha e orgulho. Temos um presidente que “tem colhões”, “gosta de Coca-Cola e da Disneylândia”, se acreditarmos nas palavras do ilustre ministro da economia, Paulo Guedes. Vivaaa!
Que venham os investidores americanos e os turistas (sem visto). Aqui há empresas a preços de liquidação e nossas belezas naturais são capazes de satisfazer os gostos e exigências mais sofisticados. E há espaço para japoneses, canadenses e australianos, todos igualmente sem vistos. Welcome! Podemos oferecer ainda abertura unilateral da economia, simplificação tributária, privatizações, bases para lançamento de foguetes (ou apoiar a invasão da Venezuela), e um brinde de 750 mil toneladas de trigo a serem importadas com tarifa zero. Eis o saldo da visita do presidente aos EUA.
Claro que a Argentina não gostou do presente do trigo e já enviou um protesto junto com ameaças de retaliação.
A escala do avião presidencial no Brasil foi curta e a decolagem em direção ao Chile foi imediata, para mais uma rápida missão patriótica: enterrar a UNASUL (“de esquerda”). Em seu lugar, mas mudando de sinal, surgiu a PROSUL (“de direita”).
O presidente voou tanto que não teve tempo de se inteirar da queda de seu prestígio junto ao eleitorado tupiniquim. Uma pesquisa do Ibope, feita nos dias 16 e 19 de março, apontou a queda do prestígio do governo. Sobre a gestão, em comparação com janeiro, a pesquisa mostrou que os que consideravam boa ou ótima caíram de 49% para 34%. Os que consideravam ruim ou péssima subiram de 11% para 24% e os que consideravam regular passaram de 26% para 34%. A forma de governar, aprovada por 67%, em janeiro, passou para 51% e a desaprovação subiu de 21% para 39%. Os que confiavam no presidente, que eram 62%, agora são 49%.
Do Chile a comitiva voltou de mãos abanando brandindo apenas o PROSUL.
Enquanto as autoridades passeavam o pau quebrava aqui dentro entre ministros e Congresso. Acirraram-se os debates sobre a reforma da Previdência com a chegada da proposta para os militares. Azedaram as relações entre o ministro Moro e o presidente da Câmara Rodrigo Maia. Moro queria empurrar o seu projeto sobre segurança junto com o bolo da Previdência. Maia desqualificou-o como funcionário do governo sem autoridade para discutir com ele, presidente. Com o conhecimento da proposta para os militares e os privilégios que lhes são concedidos a situação se complicou.
No Ministério da Educação o caos é ainda maior com nomeações e demissões sucessivas para cargos de chefia ao sabor das influências dos vários grupos em choque.
Há mais conflitos deflagrados entre o Senado e o STF com a proposta de uma CPI contra os ministros (CPI da toga) e conflitos entre Rodrigo Maia e o presidente Bolsonaro por conta da campanha de hostilidades deflagrada pelos bolsominions liderados pelos filhos do capitão.
A agitação da semana culminou com as prisões do Michel Temer e do ex-ministro Moreira Franco com as consequentes queda da bolsa e subida do dólar.
É difícil imaginar como se vai restaurar a confiança e melhorar as expectativas dos agentes econômicos em tamanha desordem e baderna.
Claro que em tal ambiente não haverá investimentos e o próprio governo colabora para isto com sua política suicida de austeridade e destruição dos bancos públicos. A economia continua dando sinais de desaceleração e o último deles foi medido pelo Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) que, entre dezembro e janeiro mostrou uma retração 0,41%. O BC reagiu a isso mantendo a taxa de referência Selic em 6,5% em sua última reunião.
Por outro lado, os indicadores internacionais também mostram a tendência para a desaceleração da economia mundial. Os maiores bancos centrais do mundo encerraram suas políticas de elevação dos juros e começam a retomar os estímulos monetários (BCE, Fed. BoE, Banco do Japão, etc.).
Eis o preço que estamos pagando pela eleição de um presidente Coca-Cola.

[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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quarta-feira, 20 de março de 2019

A crise econômica internacional está cada vez mais próxima


Semana de 11 a 17 de março de 2019

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Nos últimos dois anos, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foi de 1,1%. Os resultados não foram suficientes para superar a queda acumulada de 6,8% de 2015 e 2016. É inegável que a recuperação da economia vem acontecendo de forma lenta, porém os analistas não esperavam que os derradeiros resultados anuais fossem tão frustrantes. No ano passado, por exemplo, a previsão de crescimento para o PIB era de 3,5% e, embora os “culpados” tenham sido elencados, o pífio resultado de 2018 lançou um sinal de alerta para 2019. E o resultado do quarto trimestre, mostrou que a desaceleração vem se propagando. A acanhada alta de 0,1% nos últimos meses do ano passado, lançou um balde de água fria nas projeções de crescimento para este ano.
Entretanto, a desaceleração já era esperada, pois não há indícios de que a debilidade do mercado de força de trabalho, robustecida pelo alto desemprego e alto índice de informalidade, além da ociosidade do setor produtivo igualmente alta, serão superadas de imediato.
E o primeiro número oficial da atividade econômica de 2019 reforça esta conclusão. Em janeiro, segundo o IBGE, a produção industrial recuou 0,8% perante dezembro. Pelo terceiro mês consecutivo o setor de bens de capital apresentou queda. Recuou 3% sobre dezembro, após queda de 3,5% e 4,1% em outubro e novembro.
Por estas razões, e não porque a Reforma da Previdência demorará a ser aprovada, um grupo cada vez maior de analistas projeta uma expansão de apenas 2% para o PIB deste ano. Resumo aqui as principais revisões de projeção feitas: a A.C. Pastore & Associados reduziu a projeção de crescimento de 2,4% para 2% com viés de baixa; o Banco MUFG Brasil, de 2,5% para 2%; o Bank of America (BofA) Merrill Lynch, de 3% para 2,4%; o Banco Fibra (mais pessimista), de 2,5% para 1,7%; o Santander, de 3% para 2,3%; o Banco Safra de 2,3% para 2% e o Itaú Unibanco revisou de 2,5% para 2%. O Boletim Focus do Banco Central (BC), registrou queda das projeções pela segunda vez consecutiva, de 2,3% para 2,28%.
Mas, ainda há aqueles grupos que depositam na fé, a esperança de uma recuperação mais robusta. É o caso do economista-chefe da gestora Legacy Capital, Pedro Jobim, que, apesar de reduzir a estimativa de expansão do PIB deste ano de 3,1% para 2,5%, segue “torcendo”, otimista. Segundo ele, “...o quarto trimestre foi ruim, o primeiro trimestre não está com uma cara tão boa e o mercado de trabalho está um pouco pior do que se imaginava. Mas nós acreditamos que a economia vai engatar com a melhora da confiança, que vai permitir mais consumo e um novo ciclo de endividamento de empresas e famílias.”
A ciência nos chama de volta à realidade. E a economia mundial entrou, definitivamente, nos rumos de uma nova crise. O Federal Reserve (Banco Central dos EUA), na figura de seu presidente, Jerome Powell, comunicou que não mudará sua política de juros no momento. Os preços americanos continuam baixos e o crescimento global mais lento, requer, segundo a instituição, devido cuidado. A economia da China vem desacelerando rapidamente. A produção industrial cresceu 5,3% em janeiro-fevereiro, em relação ao mesmo período do ano passado, padrão considerado baixo para o gigante e segundo pior resultado para os meses de janeiro e fevereiro desde 2009. A maior economia da Europa, segundo o instituto alemão Ifo, vai desacelerar para 0,6% este ano. Antes, a previsão de crescimento do PIB da Alemanha era de 1,1%, e o indicador foi revisado em virtude da queda de 0,8% na produção industrial em janeiro comparado a dezembro.
Enquanto isso, o governo brasileiro continua a gerir crises criadas de dentro para fora, atacando o carnaval, os ministros do Supremo, jornalistas e atendendo pedidos de um tal guru que dita os rumos das nomeações no Ministério da Educação e o paralisa.
O tal “mito” continua alheio aos urgentes problemas do país e à chegada de uma crise internacional que insiste em bater à porta.

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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quarta-feira, 13 de março de 2019

“Cortina de Fumaça”


Semana de 04 a 10 de março de 2019

Jomar Andrade da Silva Filho [i]

           
Uma tática de guerra bastante conhecida por qualquer militar que se preze é a cortina de fumaça. A estratégia consiste em produzir artificialmente uma fumaça espessa, cujo propósito é encobrir a visão dos oponentes para os enganar. Essa parece ser a estratégia adotada também pelo presidente Jair Bolsonaro e sua equipe nos seus primeiros meses de mandato. No campo de batalha das redes sociais, a substância escolhida para compor a fumaça bolsonarista é clara: a pauta dos costumes. Circulando por temas laterais, e muitas vezes até de foro íntimo/individual, a comunicação presidencial adotada nesse primeiro momento é uma arma importante para um governo que tem muito mais problemas a esconder do que realizações a exibir.
Longe da liturgia ou da seriedade que se espera de quem ocupa o cargo mais alto da república, o presidente tem dedicado grande parte do seu tempo a (tentar) incitar grupos mais radicais, facilmente atiçados pela pauta dos costumes. O ápice (ou fundo do poço) dessa estratégia ocorreu na semana passada, com a divulgação, via Twitter, de um vídeo com conteúdo sexual ocorrido durante o carnaval de São Paulo.
Apontada como uma tentativa clara de resposta às manifestações contrárias ao seu governo ocorridas durante o carnaval, nos quatro cantos do país, a cena escatológica repercutiu negativamente, tanto na mídia internacional, quanto dentro do governo. A impressão geral, obviamente, é a de que a postagem foi “desnecessária” e “de baixo nível”.
Devo lembrar, caro leitor, que enquanto o presidente se debruça em estigmatizar artistas, professores, formadores de opinião, imprensa, universidades e até o carnaval, boa parte da população brasileira ainda segue sufocada em questões básicas da existência humana. Questões como saúde, educação, emprego e moradia digna são as demandas mais reais e urgentes da sociedade. Vejamos alguns exemplos.
Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento para o ano de 2016, mostram que no Brasil ainda havia 35 milhões de brasileiros sem acesso à água e mais de 100 milhões sem coleta de esgoto.
O Indicador do Alfabetismo funcional de 2018, calculado para brasileiros entre 15 e 64 anos, apontou que 29% da população, cerca de 38 milhões de pessoas, são consideradas analfabetos funcionais. Isso significa que eles têm elevada dificuldade em compreender textos simples ou realizar operações matemáticas.
Segundo dados do IBGE, para o ano de 2017, havia 54,8 milhões de pessoas em situação de pobreza no Brasil (de acordo com a definição do Banco Mundial, são pessoas com renda de até R$ 406 por mês). Já a população na condição de extrema pobreza (com renda inferior a R$140 por mês) era de 15,3 milhões. Do total da população, 7,4% estavam abaixo da linha da pobreza no mesmo período.
O quadro é mais preocupante se lembrarmos da trajetória ainda errática da economia brasileira e mundial.
A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou relatório pouco animador, reduzindo as projeções de crescimento para quase todos os países do G-20. Esta é uma clara sinalização de que o ciclo de expansão da economia global está perto do fim.
Para o Brasil, a projeção de crescimento do PIB em 2019 foi revisada para baixo, de 2,1% para 1,9%. A OCDE, em setembro do ano passado, chegou a prever que, em 2019, o PIB brasileiro cresceria 2,5%.
Diante da cortina de fumaça que nos foi lançada nesses três meses, apenas uma coisa é clara: as demandas reais da população não serão solucionadas da maneira simplista e imediatista como tem sido proposto na gestão atual.
A resolução dos principais problemas nacionais exige foco, estudo aprofundado e planejamento estratégico de longo prazo.
Mas o que esperar de um governo que mal consegue se equilibrar em 280 caracteres?


[i] Estudante de Economia da UFPB e pesquisador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; jomarandradefilho@gmail.com).

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quarta-feira, 6 de março de 2019

A era do Pibinho


Semana de 25 de fevereiro a 3 de março de 2019

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

Durante o primeiro mandato da “presidenta” Dilma Rousseff, falava-se sempre no que ficou conhecido como “Pibinho”. Este foi o termo utilizado para se fazer referência às baixas taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Só para refrescar nossa memória, nesse período as taxas de crescimento da produção foram de 3,97% (2011), 1,9% (2012), 3,0% (2013) e 0,5% (2014). Em seguida veio a desgraça. Nos anos de 2015 e 2016 a atividade produtiva nacional sofreu uma retração acumulada de 6,98%. Foi apenas em 2017 que a economia do Brasil botou a testa para fora do buraco, crescendo 1,1%.
Um ano atrás, em 23 de fevereiro de 2018, o Banco Central do Brasil (BC) esperava que o crescimento do PIB brasileiro fosse de 2,9%, em 2018. Isto significaria colocar, além da testa, os olhos e o nariz para fora do atoleiro. Contudo, no dia 28 de fevereiro de 2019, semana passada, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciou que o Brasil ainda está com as ventas na lama. Na realidade, o PIB de 2018 só cresceu 1,1%.
Os dados já divulgados nos permitem analisar a economia nacional através de duas óticas: quais setores mais contribuíram para o crescimento da produção (ótica da produção) e quais foram os principais destinos do que foi produzido (ótica da demanda).
Pela ótica da produção, os três grandes setores ajudaram no crescimento total. A indústria interrompeu os quatro anos de queda e cresceu 0,6%, entre 2017 e 2018. Dentro da atividade industrial, o destaque ruim são as atividades da construção civil, que têm se mantido no campo negativo e decresceu 2,5%, em 2018. Já os serviços, que correspondem a mais de 75% do PIB nacional, cresceram 1,3%. O destaque aqui foi para o comércio e os transportes. A agricultura, que garantiu o “bom” desempenho de 2017 com uma “supersafra”, quase ficou estagnada em 2018, crescendo ínfimos 0,1%.
Pela ótica da demanda, tivemos crescimento em quase todos os componentes. O destaque vai para a formação bruta de capital fixo (investimentos) e para as exportações: ambas cresceram 4,1%, entre 2017 e 2018. No caso dos investimentos, a boa notícia é que isso representou uma interrupção nas quatro quedas seguidas desde 2014. Por sua vez, o consumo das famílias brasileiras ampliou-se em 1,9%. As importações, entretanto, cresceram 8,5%. Isto significa que o PIB poderia ter crescido mais, caso as compras externas de alguns tipos bens tivessem sido menores. A economia poderia ter crescido mais, também, caso a administração pública tivesse ampliado seus gastos. O consumo do governo ficou praticamente estável, com uma taxa de 0,02%.
Dentre os destaques que devemos dar aos dados da economia brasileira, precisamos chamar a atenção para a trajetória deles. Além disso, devemos associá-los a outras informações relevantes sobre o início de 2019.
Comparando o comportamento do último trimestre de 2018 com o anterior, vê-se que os setores indústria, comércio, transportes e serviços financeiros apresentaram redução na atividade. Pela ótica de demanda, caíram o consumo do governo, as importações e, principalmente, a formação bruta de capital fixo. Soma-se a isso a elevação do desemprego no trimestre encerrado em janeiro de 2019. No total, são 12,7 milhões de desempregados, quase 500 mil a mais do que na contagem anterior. Já os desalentados (desistiram de procurar emprego) e os subocupados (teriam disponibilidade de trabalhar mais horas) somam 11,5 milhões de pessoas. Do total dos trabalhadores brasileiros, 23,9 milhões são os que trabalham por conta própria, dentre os quais, destacam-se os motoristas de aplicativos...
Não sei se o prezado leitor se lembra, mas a reforma trabalhista de Temer foi feita para a economia voltar a crescer. Isso não aconteceu. Agora, tentam fazer o povo brasileiro acreditar que a (contra)reforma da previdência é a solução para a estagnação econômica. Não é. Pelo contrário. Mantendo-se a atual orientação de política (e reforma) econômica e a ideologia de que o “mercado” é capaz de levar à superação dos problemas do país, tenha certeza de que nos manteremos numa verdadeira e longa era do Pibinho.
Com todas as consequências sociais que isso representa.

[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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