quarta-feira, 24 de julho de 2019

Aniquilada mais uma fábula


Semana de 15 a 21 de julho de 2019

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Caro leitor, não há grandes novidades em relação à conjuntura econômica internacional, pois o mundo continua a desacelerar. A Europa, os Estados Unidos e alguns países da Ásia cogitam reduzir os juros e lançar um novo pacote de expansão monetária para estimular o crescimento. A conjuntura brasileira também mantém o ritmo de desaceleração. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) apresentou alta de 0,54% em maio em relação a abril, mas não foi comemorado, pois a prévia dos indicadores de junho mostra que caminhamos para a recessão técnica caracterizada pela queda consecutiva do PIB em dois trimestres.
Há algum tempo, a nossa coluna lança duras críticas à Reforma da Previdência. Criticamos a forma como foi concebida, o cálculo do tal déficit, os interesses que atende e a falácia de que ela salvaria a nossa economia. Agora recordemos o comentário do ministro Paulo Guedes, em 31 de maio deste ano, diante da retração de 0,2% no PIB no primeiro trimestre: “Com a reforma da Previdência teremos um horizonte fiscal de 15, 20 anos de estabilidade e os investimentos privados serão retomados.”
Nosso leitor assíduo jamais acreditou neste conto da carochinha. Pois bem. Aqueles que são os responsáveis pelas decisões de investimento e que defenderam ferrenhamente a aprovação da reforma admitem agora, só depois que a aprovação aconteceu em primeiro turno na Câmara dos Deputados, que a “mágica” não acontecerá.
Em reportagem elucidativa publicada em 17 de julho pelo jornal Valor Econômico de título “Previdência não traz investimento”, apenas a JCB, fabricante de máquinas de construção e agrícolas ratificou um plano de investimentos de R$ 100 milhões, para os próximos três anos. Nenhum dos demais empresários ou organizações ouvidas pelo jornal, confirmou o aumento dos seus investimentos. Para estes, a reforma aprovada é apenas uma “injeção de ânimo” que pode reduzir a alta capacidade ociosa industrial que gira em torno de 25%. Foram ouvidos Walter Schalka, presidente da Suzano, maior produtora mundial de celulose de eucalipto; João Carlos Brega, presidente da Whirlpool América Latina, maior fabricante da linha branca na região; Rubens Menin, fundador e presidente do conselho da MRV, segunda maior construtora residencial do país; Alexandre Schmidt, diretor comercial da Brametal, maior fabricante de estruturas metálicas do país para o setor de energia; Paulo Prignolato, diretor financeiro do grupo Randon, maior fabricante de reboques e semirreboques da América Latina; Eduardo Ribeiro, presidente da Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM); Hector Gusmão, presidente da Fábrica de Startups do Brasil; Márcio Utsch, presidente do conselho da Cemig; Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) e Marcelo Silva, presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV), que reúne as maiores redes varejistas do país. O discurso dos citados acima é o mesmo: a reforma tem que ser feita, mas... recuperar os investimentos, reduzir o desemprego, aí já é uma outra história.
Cresce o clamor empresarial de que agora são necessárias “outras microrreformas” e que novos investimentos só virão após recuperação da demanda. O setor financeiro já adiou a recuperação para 2021. E enquanto marchamos para o buraco, o governo aprofunda o “austericídio”. Gustavo Henrique Montezano, novo presidente do BNDES, comprometeu-se em continuar o desmonte da instituição, abrindo a tal “caixa preta” do banco, em dois meses, acelerando a venda da carteira de ações do banco e devolvendo R$ 126 bilhões este ano ao Tesouro Nacional. Também a Caixa Econômica Federal se comprometeu a devolver R$ 20 bilhões este ano.
E para quem caiu no conto do vigário, mais um grande número. No fechamento desta análise, registro o número mais recente apurado no Boletim Focus do Banco Central. As previsões de crescimento finalmente voltaram a crescer em 2019. Após 20 semanas consecutivas de queda, a previsão aumentou de 0,81% para (pasmem...) 0,82%! Será este o primeiro grande feito da Reforma da Previdência?
Viva o 0,01% de crescimento!

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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quarta-feira, 17 de julho de 2019

Os desafios de uma economia de industrialização tardia


Semana de 08 a 14 de julho de 2019

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

A industrialização só chegou ao Brasil, de fato, no século XX. Porém, neste momento da história, a economia mundial já havia passado por profundas mudanças.
Nos séculos XVIII e XIX, aquilo que era uma profusão de capitais de médio e pequeno porte atuando nos espaços econômico nacionais ainda disponíveis, na virada do século XIX para o XX se transformou numa grande disputa entre potências econômicas em busca do mercado mundial. A grande razão está no fato de que, pelas próprias características inerentes ao capitalismo (por exemplo, as crises econômicas e o desenvolvimento de tecnologias que requerem grandes investimentos), o que antes era uma dispersão de empresas manufatureiras agora se transformou em grandes conglomerados oligopolistas dominando boa parte dos setores produtivos. Por sua vez, com o fim da disponibilidade dos espaços livres nas nações mais avançadas, foi um movimento quase natural a expansão dos negócios para além das fronteiras nacionais.
Este é o pano de fundo da “revolução industrial” brasileira, que ficou conhecida como processo de industrialização por substituição de importações. Como o nome sugere, aos poucos a economia nacional foi deixando de importar alguns produtos manufaturados, pois passou a produzi-los internamente. Em alguns setores, como o comércio, os demais serviços e a indústria de bens de consumo não duráveis (alimentos, higiene, vestuário, etc.), os recursos nacionais puderam financiar boa parte dos empreendimentos.
Contudo, para continuar a substituição de importações, seria necessário trazer para dentro do país outros setores importantes, como a indústria de bens de consumo duráveis (automóveis, eletrodomésticos, etc.), de bens intermediários (insumos) e, principalmente, de bens de capital (máquinas, equipamentos, etc.). Era necessário, pois, realizar a industrialização pesada. Por suas próprias características, esses são os setores de maior dinamização da atividade econômica, pois requerem grandes investimentos em pesquisa e desenvolvimento, serviços e mão de obra especializados, acesso a insumo de alta intensidade tecnológica, dentre outros fatores. E esse era o grande problema: no Brasil não existiam recursos para esta empreitada.
A solução veio de fora, juntando a fome com a vontade de comer: os capitais que formavam as economias mais desenvolvidas buscavam mercados estrangeiros onde pudessem investir e o Brasil buscava capitais externos para poder continuar seu processo de industrialização. Assim, o grosso dos setores mais dinâmicos da economia brasileira foram sendo dominados por empresas estrangeiras, seja em sua origem, em meados do século XX, ou com as privatizações das décadas de 1990 e 2000.
É justamente aí que está o problema do desenvolvimento capitalista em economias como a nossa (as economias dependentes, em geral). Se são as multinacionais que tendem a gerar os maiores impulsos dinamizadores da produção, considerando que elas têm estratégias de investimentos em escala internacional, surgem as perguntas: 1) como convencê-las de que o Brasil é um local que, de fato, lhes trará retorno, sobretudo com a atual fragmentação do processo produtivo, a formação das cadeias globais de valor e a concorrência com as economias asiáticas (em especial países como Vietnã, Bangladesh, Laos, Camboja e Índia), que apresentam “custos” trabalhistas, sociais e ambientais muito menores do que o Brasil? 2) Como convencer as multinacionais de que elas deveriam redirecionar seus investimentos, que iriam para os centros tradicionais de pesquisa e desenvolvimento, e passar a investir em ciência aqui no Brasil?
A resposta está sendo dada nas reformas propostas pelo governo Bolsonaro. De um lado, a saída é reduzir custos ligados aos direitos e às condições de vida da classe trabalhadora (que vão além da aposentadoria e de regras básicas de contratação e passam por um meio ambiente minimamente habitável). De outro, através do projeto “Future-se”, que pretende conceder a estrutura pública universitária já consolidada à iniciativa privada, de preferência estrangeira (típica “privatização à brasileira”) e deixar ela tomar os rumos do que será pesquisado no país de acordo seus próprios interesses.
De qualquer forma, o resultado tende a ser o mesmo: “desenvolvimento” que resultará em condições de vida precárias e maior subordinação econômica.

[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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quarta-feira, 10 de julho de 2019

O caminho continua ladeira abaixo


Semana de 01 a 07 de julho de 2019

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           
Há 3 semanas falamos que a economia continuava ladeira abaixo. Infelizmente temos de manter a mesma opinião.
A semana que passou, apesar de todo o tumulto do futebol que prendeu todas as atenções, fornece novos indicadores. A Federação Nacional da Distribuição de Veículos (Fenabrave) reviu suas previsões de venda para baixo, de 11,15%, para 8,37%. Até então o setor das montadoras estava com esperanças que eles escapariam da tendência geral da desaceleração. As expectativas estavam deformadas por causa das vendas diretas efetuadas pelas montadoras aos frotistas e locadoras. Estas vendas, no primeiro semestre, cresceram 23,59%, enquanto as vendas aos consumidores apenas 2,15%. Ocorre que estes grandes compradores só renovam suas frotas a cada 2 anos ou mais e quando o fazem lançam no mercado milhares de veículos usados a baixos preços.
Outro setor a lamentar-se é o de cerâmica e de materiais de construção. A associação Nacional dos Fabricantes de Revestimentos Cerâmicos (Anfacer) reviu sua projeção de crescimento, de 5% para 3,5% neste ano, tanto pela queda do consumo interno como das exportações. Para esta queda tem contribuído as aplaudidas ações da Lava-jato que, não só puniu alguns possíveis corruptos, como destruiu as grandes empresas da construção Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão, Galvão Engenharia, UTC Engenharia, Constran e OAS. Em dois anos a receita destas empresas caiu 75%, passando de R$75,6 bilhões para R$18,3 bilhões, em 2017. Isto significou também a perda de um milhão de empregos formais, entre 2014 e 2019, de acordo com o Sindicato da Construção Pesada e Infraestrutura (Sinicon), quase 40% do desemprego observado neste período. Em 3 anos, de 2015 a 2018, a receita líquida das construtoras encolheu 85%, de R$71 bilhões, para R$10,6 bilhões.
Para agravar a situação, além do Moro com sua Lava-jato, o sinistro Guedes e seus “Chicago oldies”, a elogiada “equipe dos pesadelos” atacam fortemente. As “despesas discricionárias” da União (onde estão incluídos os investimentos), no primeiro quadrimestre de 2019, somaram R$29,8 bilhões, mostrando uma queda de 53,2% em comparação com 2014. A parcela destes gastos referentes ao Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) e ao Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) caíram de R$21,3 bilhões, no primeiro quadrimestre de 2014, para R$4,8 bilhões, no mesmo período de 2019. Uma queda de 78%.
Para reverter este quadro, baseando-se na sua insensata ideologia, o sinistro Guedes lança o seu programa de liquidação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), começando por obrigar o banco a devolver antecipadamente os recursos do Tesouro lá depositados e liquidando a BNDESPar, empresa de participações do BNDES, que em 5 anos deu um retorno de 17,1% acima do índice IBOVESPA.
Sem o investimento privado e com esta queda nos investimentos públicos o resultado não podia ser outro. Segundo dados da Pesquisa Industrial Mensal (PIM) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em maio, a produção industrial caiu 0,2% sendo que a Indústria de transformação recuou 0,5%. O resultado não foi pior porque a indústria extrativa avançou 9,2%. Dos 26 ramos da manufatura 18 registraram queda. No ano, a queda acumulada já atinge 0,7%. André Macedo, gerente da pesquisa do IBGE lamentou-se: “Há uma anemia generalizada na indústria brasileira que levará a outra queda do PIB industrial no segundo trimestre”. E não se deve esperar nenhum refresco externo pois a economia mundial continua sua marcha para uma nova crise.
Para completar a semana, a ação do ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, na sua fúria para destruir a Amazônia, já está destruindo o Fundo Amazônia, patrocinado pela Alemanha e Noruega, que já aportou ao Brasil mais de US$1 trilhão.
Quase ao terminar esta análise recebemos as tristes notícias dos falecimentos do jornalista Paulo Amorim e do economista Francisco Oliveira a quem prestamos nossas homenagens, ao mesmo tempo que lamentamos profundamente.

[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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quarta-feira, 3 de julho de 2019

Falta convencer 68% presidente!


Semana de 24 a 30 de junho de 2019

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Caro leitor, crescem, tardiamente, os argumentos óbvios de que a reforma da Previdência não vai produzir um milagre econômico. Afinal, seus efeitos são contracionistas! Segundo os pesquisadores Armando Castelar, Lívio Ribeiro e Silvia Matos do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), a não aprovação da reforma da Previdência traria problemas à economia, mas a tal reforma por si só não provocaria uma “aceleração significativa do crescimento”, pois apenas “reduziria as incertezas”. Os analistas recomendam que é preciso mais! É necessário simplificar o sistema tributário, para melhorar o ambiente de negócios, e aumentar a previsibilidade. 
Como os argumentos reformistas são mais facilmente tolerados em tempos de crise, a debilidade econômica torna o ambiente “mais propício” para que a sociedade aceite “certos sacrifícios.” Tomemos como exemplo a aprovação do teto para os gastos públicos e a Reforma Trabalhista que prometeu gerar empregos “automaticamente”. Mesmo confirmado que tais medidas não surtiram os efeitos prometidos, o atual governo continua a repetir o clichê: “Menos Estado, mais mercado” e a atividade continua desacelerando. Medidas de estímulo como por exemplo a queda da taxa de juros só virão, diz o Copom (Comitê de Política Monetária), se a Reforma da Previdência for aprovada. Portanto, o que já está ruim pode e vai piorar.
Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o mercado de trabalho criou 32.140 empregos com carteira assinada, em maio, comparado a abril. O número é decepcionante, pois as estimativas apontavam para a criação de 70 mil vagas. E a taxa de investimento do Brasil alcançou nível baixíssimo de acordo com levantamento dos dados trimestrais feito pelo Ibre/FGV. Em média, nos últimos quatro anos, a formação bruta de capital fixo (FBCF), que mede os investimentos em máquinas e equipamentos, construção civil e inovação fechou em 15,5% do PIB. Tal número é tão medíocre que só foi atingido uma única vez: na média dos quatro anos até 1967.
Os resultados negativos logo se refletem nas estimativas de crescimento anual. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revisou de 2% para 0,8% a taxa de crescimento do PIB para 2019. A revisão segue tendência corroborada pelo Boletim Focus que apresentou como projeção mais recente crescimento de 0,87%.
Com desempenho econômico insignificante e muito a fazer, o governo termina seus primeiros seis meses tuitando muito e realizando quase nada. O povo está perdendo a paciência. Pesquisa encomendada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) ao Ibope apurou que 32% dos entrevistados consideram o governo ruim ou péssimo, aumento de cinco pontos percentuais em relação à sondagem realizada em abril. O percentual que considerava o governo bom/ótimo era de 35%, em abril, mas caiu para 32%. Comparada à pesquisa do Ibope Inteligência, de janeiro, com metodologia semelhante, a popularidade do presidente caiu 17 pontos em seis meses. Passou de 49% para 32%.
A queda da popularidade, a falta de avanços e os escândalos em seu entorno, não impediram que Bolsonaro se lançasse como candidato à reeleição. E o pior: na esteira das “manifestações” em favor do parcial ex-juiz Sérgio Moro ocorridas no dia 30 de junho, o presidente disparou no Twitter: “Parabéns a todos que foram às ruas nesse 30/06. A mensagem de vocês é para todas as autoridades: ‘não parem o Brasil, combatam a corrupção, apoiem quem foi legitimamente eleito em 2018.’ Respeito todas as Instituições, mas acima delas está o povo, meu patrão, a quem devo lealdade.”
Há seis meses, o presidente demonstra que odeia a democracia. Quer governar via decretos (por vezes inconstitucionais) e seus anseios ditatoriais são externados quando afronta o Legislativo e o Supremo Tribunal. É preciso que o presidente contenha seus arroubos golpistas, pois a conta é simples: falta o apoio de 68% da população, ou seja, dois terços!

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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