terça-feira, 31 de março de 2020

Combater causa ou efeito da crise atual?


Semana de 23 a 29 de março de 2020

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

Como já foi afirmado nas últimas semanas, a crise econômica chegou com tudo. Ela, por si só, já representa um conjunto de grandes problemas que resultam na contração da atividade econômica. A causa fundamental da crise está nas características que formam as economias de mercado (as economias capitalistas). Os principais efeitos dela são: vendas em baixa, estoques em alta, redução da produção e do consumo, elevação do desemprego e/ou do subemprego, redução da renda, etc.
Mas a crise atual tem uma peculiaridade que, ao mesmo tempo, é um agravante. Sabe-se que ela já é conhecida como a “Crise do Coronavírus”. Como questão de saúde pública, seu principal efeito é matar um percentual de pessoas que forem infectadas (que varia, a depender da idade, das condições de saúde, de moradia, etc.). Além disso, e é o que o torna tão preocupante, o novo vírus tem uma capacidade de disseminação consideravelmente mais elevada que outros vírus já conhecidos. Por exemplo, pessoas infectadas que ainda não tenham febre ou tosse podem contaminar outras.
O principal problema do covid-19 é que, por ser um novo primo da família do coronavírus, a humanidade ainda não sabe lidar com as consequências da pandemia. Dentre elas, a principal é a ausência de equipamentos e instalações hospitalares capazes de suportar o grande número de infectados ao mesmo tempo. É a famosa “curva de infecção”, que tem balizado o debate em todo o planeta (segue um vídeo que ajuda a entender o problema: https://www.youtube.com/watch?v=Y10vCOXxtds).
A ideia é fazer com que as pessoas sejam infectadas de forma gradual ao longo do tempo (ao invés de muitas pessoas simultaneamente) e, assim, “achatar” a curva de infecção. Isto significa que um número menor de pessoas irão procurar atendimento ao longo de um período maior de tempo. Dada a capacidade do sistema de saúde de cada localidade, isto garante que mais pessoas tenham acesso aos hospitais e, com isso, mais chances de sobreviver.
É nesse contexto que surgem os efeitos econômicos da “Crise do Coronavírus”. O isolamento social é a principal forma de achatar a curva de infecção, pois menos pessoas em contato com outras reduz drasticamente o grau de disseminação do vírus. Mas isto significa que os trabalhadores devem ficar em casa. Significa que a produção em muitos setores deve se reduzir ou até parar. Significa que as compras e o consumo de alguns bens não acontecerão. Significa que os empresários não terão porque manter seus empregados. Significa que os salários e os lucros serão reduzidos. Enfim, significa que os efeitos da crise econômica serão potencializados.
Este é o grande dilema entre o Tico e o Teco que ocupam por completo a cabeça de Bolsonaro: garantir que uma parte maior da população possa receber atendimento médico-hospitalar (com isolamento social) ou manter o funcionamento da economia achando que os que morrerem a mais não importam (sem isolamento social).
Duas características pregressas de Bolsonaro já estavam evidentes antes dele ser eleito Presidente da República. Jair Bolsonaro já tinha apresentado sintomas que caracterizam os sociopatas (óbvio que eu não estou diagnosticando ele como tal) e já havia atestado sua absoluta ignorância sobre economia (aqui eu diagnostico ele como tal). Pois bem, todos sabem a resposta dada pelo ignóbil presidente: a de um completo ignorante em economia e de um aparente sociopata.
A ação ideal seria combater a causa do agravamento da crise atual, o coronavírus, e mitigar seus efeitos econômicos. Por um lado, enquanto o isolamento social está sendo feito, por outro, o Estado deve dar uma efetiva assistência monetária aos cidadãos, ampliar a estrutura de saúde e garantir a manutenção de algumas atividades essenciais (e só). Na medida em que a sociedade for se adequando ao “novo normal” da convivência com o vírus, gradativamente as demais atividades iriam sendo liberadas.
Para isso, claro, não se deve medir esforços em termos de orçamento. Como dizem nas redes sociais: a economia se recupera, mas para a vida não há ressurreição.

[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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quinta-feira, 26 de março de 2020

A retração global já começou


Semana de 17 a 22 de março de 2020

Nelson Rosas Ribeiro[i]

Fazer esta afirmação agora é muito fácil. Todos concordam. Jim O’Neil, o criador do temo BRICS, afirmou em entrevista ao jornal Valor: “Nós estamos quase definitivamente em recessão”. Claudia Safatle, colunista deste jornal, também afirmou: “A recessão é inevitável”. Para Kristalina Georgieva, diretora do Fundo Monetário Internacional (FMI) a crise será pior que a de 2008.
E a causa já foi identificada, para a felicidade dos economistas: é o coronavírus. O maldito vírus criado pelos chineses (segundo o filho do presidente) para conquistar o mundo. Consequentemente a culpa é do comunismo e o clã bolsominio está em festa.
Os economistas também comemoram. Há uma causa da crise. Esta é a crise do coronavírus como já havíamos batizado 2 semanas atrás em nossa Análise. Na verdade, já vínhamos acompanhando a aproximação da crise desde meados de 2019. Outros analistas também identificavam a marcha do fenômeno. No dia 13 de agosto do ano passado a colunista e editora do Financial Times, em Nova York, em um artigo publicado no Valor Econômico intitulado “A caminho da desaceleração global”, afirmava: “Não acho que seja uma questão de se veremos um “crash” – a questão é porque ainda não começou”. E concluia: “a retração global já começou”.
Todos se recusavam a ver a aproximação da tempestade apoiados pela ideologia econômica dominante. Como não conseguem encontrar uma explicação para o fenômeno tentam desesperadamente negar sua existência.
Segundo a teoria do ciclo econômico quando as tensões atingem um determinado nível, inevitavelmente a fase de crise começará. O problema é saber quando e qual o agente deflagrador. Deflagrador, repito, e não causador. Para dificultar as análises e prognósticos tivemos agora 2 agentes deflagradores: o preço do petróleo (preço de monopólio) e o coronavírus, um fator não econômico. Se a questão dos preços de monopólio já complica a análise, o fator não econômico, um vírus, absolutamente imprevisível e inusitado, não está considerado em nenhuma teoria e nem seria possível incluí-lo. Esta é a grande novidade que complica as análises e que exigirá muita criatividade dos analistas para fazer prognósticos.
O quadro atual é desolador quer no plano mundial como interno. A propagação do vírus, além dos mortos, enche os hospitais de enfermos e leva à ruptura dos sistemas hospitalares. Frequentemente os médicos são obrigados a definir a quem darão assistência e quem morrerá por falta de recursos. Os governos são obrigados a decretar quarentenas e confinar as populações às residências provocando a paralisação da produção e destruindo as cadeias de valor e de abastecimento.  Em um mundo globalizado caminhamos para a catástrofe econômica. As pessoas confinadas não trabalham. Sem trabalho não há produção nem salários. Sem salários não há demanda e as fábricas e comércio param. Instala-se o caos social e econômico.
Os dados enchem os jornais e seria cansativo citá-los. As fábricas fecham e demitem ou dão férias coletivas ou fazem layoff dos operários. O comércio fecha e age da mesma forma. Sem faturamento as empresas não pagam seus compromissos e a inadimplência se alastra. As ações perdem o valor e as bolsas despencam provocando o efeito manada e o caos financeiro. Para exemplificar, só 3 empresas, CVC, Gol e Azul perderam 81% de seu valor de mercado.
Os governos tomam medidas desesperadas para conter o caos. Socorro às empresas (quantitative easing – QE – novamente) ou mesmo nacionalizações. Fala-se em QE para os trabalhadores (jogar dinheiro de helicóptero) para as pessoas poderem consumir. Já há exemplos disso em Hong Kong, Macau, Singapura. Nos EUA programam pagar US$1.000 a cada pessoa. O FMI já prepara US$1 trilhão para injetar na economia e o Banco Mundial outros US$150 bilhões. Os Bancos Centrais preparam-se. E enquanto o mundo desaba, o presidente Bolsonaro, como um demente, chama a pandemia de gripezinha, desautoriza seu ministro da Saúde, convoca manifestações de rua contra a república e os demais poderes e namora com a ditadura. Até quando?


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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terça-feira, 17 de março de 2020

As prioridades na “Crise do Coronavírus”


Semana de 09 a 16 de março de 2020

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

Agora é oficial: a crise pela qual o Brasil passa já virou a “Crise do Coronavírus”. Segundo Paulo Guedes, um dos ministros anacrônicos de Bolsonaro, a economia estava saindo da crise quando veio a pandemia e empurrou o Brasil ladeira a baixo. Ele afirma isto apesar do PIB do país ter crescido, em 2019, menos do que em 2017 e 2018.
Não é novidade que o Estado brasileiro tem apresentado déficit fiscal desde 2014. Apesar desta situação, o anacrônico anunciou um conjunto de medidas de enfrentamento à crise. O valor totaliza R$ 147,3 bilhões (com B). O leitor apressado logo diria: que ótimo! E é! Contudo, e sempre há essa conjunção adversativa, isto não significa que as coisas mudaram, de fato, na condução da política econômica brasileira.
Aos que não se lembram, em 2019 foram liberados saques extraordinários do FGTS. Esta medida transferiu aos trabalhadores um valor que já lhes era devido pelo Estado e que só seria pago em situações mais restritas. Nada mais foi do que um adiantamento via flexibilização de regras. Pois bem, 54,5% das medidas, só agora, anunciadas por Guedes são desse tipo. Serão adiantados um total de R$ 46 bi do 13º dos aposentados (cada parcela em momentos diferentes), R$ 12,8 bi serão adiantados do abono salarial e será utilizado um total de R$ 21,5 bi do PIS/PASEP para reforçar o FGTS.
Tais medidas são aquelas que vão afetar diretamente a capacidade de consumo de uma parte da população. A ideia é dar um “choque” na demanda via antecipação do consumo. Isto seria possível com a liberação antecipada de dinheiro. A questão do “seria” (futuro do pretérito) é a seguinte: quem garante que o consumo será realizado, de fato, num país onde deveria prevalecer a reclusão como forma de contenção do vírus? Claro que esse dinheiro é muito bem-vindo. Mas sua efetividade é questionável. Além disso, que dinheiro as pessoas vão usar no fim do ano, se boa parte do extra foi adiantada?
Como forma de estimular a economia pelo lado da oferta, algumas medidas também foram anunciadas. Um total de R$ 59,4 bi será concedido às empresas através de alguns mecanismos: adiamento temporário do recolhimento do FGTS (esse mesmo, que é direito do trabalhador e que não será pago pelas empresas) e de parte do SIMPLES Nacional; redução do percentual de recolhimento ao Sistema S (Sesi, Senai, Senac, Sebrae, etc.); e facilitação da concessão de crédito via FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador, novamente o trabalhador) a micro e pequenas empresas.
A ideia dessas medidas é fazer com que a facilitação burocrática e a redução/suspensão temporária no pagamento de tributos garantam o funcionamento das empresas e, consequentemente, a manutenção dos empregos. Mas, novamente, como reagirão as empresas nesse momento em que a restrição do ir e vir de pessoas é uma das medidas fundamentais para se preparar de forma efetiva para a epidemia? Será que o trabalhador ser obrigado pelo patrão a ir trabalhar, usando transporte coletivo e se aglomerando com os demais empregados é realmente uma boa saída?
Falta ser detalhado um total de R$ 7,6 bi dos R$ 147,3 bi. Por incrível que pareça, esse valor deve ser o mais efetivo para se combater o Coronavírus. Para o fortalecimento do SUS, serão remanejados R$ 4,5 bi do DPVAT (aquele que Bolsonaro ia extinguir por conta de uma briga interna no PSL). Isto corresponde a apenas 3,1% do total. Das medidas apresentadas até aqui, nenhuma representa uma efetiva pressão sobre o orçamento estatal. Isto porque significa remanejamento, adiantamento ou adiamento de valores.
Porém, inestimáveis R$ 3,1 bi (2,1% do total) serão destinados à ampliação do Bolsa Família. Até aqui, esta é a medida que exige maior “sacrifício” fiscal do governo, pois precisará tirar dinheiro de outro lugar para que 1 milhão de famílias tenha acesso ao benefício. A outra medida que exigirá “sacrifício” no orçamento estatal é a isenção de impostos na compra de produtos médico-hospitalares. O custo disso não foi estimado.
A partir do que foi dito até aqui, podemos chegar à seguinte conclusão: as prioridades no combate à “Crise do Coronavírus” são a economia e o equilíbrio fiscal. De resto, como tem sido, o povo que se vire...

[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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quinta-feira, 12 de março de 2020

Ela está chegando


Semana de 02 a 08 de março de 2020

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           
Em várias Análises anteriores chamamos a atenção para a aproximação de uma nova fase de crise do ciclo econômico mundial. Como os leitores sabem, nossas análises de conjuntura estão baseadas na teoria dos ciclos econômicos. A economia move-se impulsionada pelas leis que regem este fenômeno.
Já vínhamos apontando os sinais e dados que mostravam que esta nova fase de crise do ciclo estava em gestação. A última crise foi em 2008/2009 e já se passaram 10 anos, que é um tempo mais que suficiente para a repetição da fase de crise. Desde 2008 o comportamento do ciclo teve algumas particularidades a começar pela intervenção maciça dos bancos centrais para conter o estouro, com a injeção de trilhões de dólares e o endividamento acelerado dos estados. A duras penas a economia mundial se recuperou embora o crescimento tenha se dado a taxas mais modestas.
Passados 10 anos as tensões se acumularam e estava chegando a hora de novo estouro. O coronavírus foi a salvação dos economistas. Encontraram uma nova desculpa, uma nova causa da crise. A crise que se inicia ficará conhecida como a crise do coronavírus.
As bolsas estão em pânico.  Em um só dia a Petrobrás perdeu R$91 bilhões em valor de mercado. A semana passada foi a pior semana desde 2008. As bolsas no mundo estouraram US$ 6 trilhões, segundo o Banco de Compensações Internacionais (BIS) espécie de Banco dos Bancos Centrais. A queda das ações na bolsa de Nova York foi pior que nas crises de 2000 e 2008. A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE) reduziu suas estimativas de crescimento da economia mundial de 2,9% para 2,4% admitindo que esta queda poderá ser para 1,5%. O Fundo Monetário Internacional (FMI) já disponibilizou US$ 50 bilhões para ajudar os países atingidos pela epidemia e enviou um comunicado que está pronto para atender a demanda de ajuda. O Banco Mundial (BM) também enviou comunicado com conteúdo semelhante. Prepara-se uma articulação mundial para uma ação coordenada dos bancos centrais e o Federal Reserve (Fed) Banco Central dos EUA já declarou sua intenção de fazer uma redução dos juros de 0,5%. O Banco Central do Japão (Boj) comunicou que agirá para estabilizar os mercados e o Banco Central Europeu afirmou estar preparado para tomar as medidas necessárias para enfrentar a crise.
Por cá a situação foi ainda mais agravada pela divulgação, pelo IBGE, do PIB de 2019. O crescimento foi de 1,1%. A previsão do governo de crescer 2,5% foi reduzida a este pibinho, para desespero da “equipe dos pesadelos” do sinistro Guedes. A construção civil que era a grande esperança caiu 2,5% no quarto trimestre de 2019. O investimento também caiu 3,3% e o consumo do governo cresceu apenas 0,4%. A participação da indústria de transformação no PIB atingiu 11%, o menor nível da série histórica do IBGE iniciada em 1996.
O pânico explodiu a bolsa e o Circuit Breaker, sistema automático que desliga os computadores do pregão, disparou paralisando os negócios. Isto acontece quando a queda nos valores negociados atinge 10% em um só dia. Na contramão, o dólar subiu chegando aos R$ 4,79 obrigando o Banco Central a vender R$ 3 bilhões em um só dia.
Além do coronavírus e do pibinho um novo fator, a queda dos preços do petróleo contribuiu para agravar a situação. Do exterior importamos os efeitos do covid19 que ao atacar os trabalhadores e provocar as quarentenas impediu as pessoas de trabalhar parando a produção. Empresa que não produz não fatura e não pode pagar suas dívidas. A ameaça de quebradeira provoca correria para a venda das ações. As quarentenas impedem o turismo e as viagens. A queda dos preços do petróleo afeta a lucratividade de todo o setor petroleiro. A austeridade fiscal de Guedes impede os investimentos do Estado, sem demanda os investimentos privados param. Só faltavam as trapalhadas ditatoriais e conclamações do governo contra os outros poderes para completar.
Estão assim dadas as condições para a tempestade perfeita. Preparemo-nos.

[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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quarta-feira, 4 de março de 2020

Economia global em tempos de corona vírus...


Semana de 24 de fevereiro a 01 de março de 2020

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

A causa da desaceleração da economia mundial não é o Covid-19. Não estamos fazendo uma suposição, mas uma constatação. Já há algum tempo que a presente coluna vem registrando o que ocorre no cenário global. Como já foi dito anteriormente, o mundo passa por sua primeira desaceleração cíclica desde a “Crise do subprime”. E isso começou bem antes do surto do novo coronavírus assolar a cidade de Wuhan, na China.
Mas esta não é apenas uma constatação nossa. O secretário-geral da OCDE, Ángel Gurría, afirmou que a economia mundial deveria ser estimulada através dos países com maior capacidade de puxar a atividade global. Segundo ele, em entrevista publicada na última semana de fevereiro, “temos que ter estímulos não pelo coronavírus, mas porque já precisávamos antes, porque há uma desaceleração muito clara da economia mundial”.
Na conta de Gurría, o principal elemento causador da desaceleração global é a tensão comercial entre os países, em especial, entre EUA e China. Antes do Covid-19, este era considerado pelos economistas o elemento causador da crise econômica que estava se instalando no mundo. Agora, todos apontam a epidemia como causa. Para nós, essa é uma crise cíclica típica do capitalismo, sendo a guerra comercial apenas o elemento de deflagração dela.
O motivo da transformação da epidemia em causa é que, obviamente, a preocupação dos países e da comunidade internacional com o novo vírus levaram a uma série de medidas que restringiram a atividade econômica nacional e as negociações internacionais. O resultado disso para a China, por exemplo, é que a indústria passa por maus bocados. De acordo com um indicador baseado nas compras industriais, a situação por lá é pior do que a vivida na crise de 2008. Na verdade, o indicador foi o mais baixo desde que começou a ser calculado, em 2004.
Diante disso tudo, devemos ter em mente que o Covid-19 não é causa da crise econômica que já se instalou na economia mundial desde 2019, mas vai aprofundar ainda mais os efeitos negativos dela. E, claro, isso pode agravar a situação de países como o Brasil, que são grandes exportadores de commodities. Se a atividade por lá e por outros países consumidores desses produtos diminui, nossas exportações também diminuem. Na Itália já há fábricas fechando e mais outras fecharão, devido à quarentena.
No Brasil, a especulação nas bolsas e no mercado de câmbio já começou. Só o fato de o país ter confirmado o primeiro caso em nosso território fez o índice Ibovespa cair 7% em um único dia. Isto não acontecia desde maio de 2017.
Já foi registrado por essa coluna que a economia brasileira patina desde 2017, ou seja, desde a crise 2014-2016, nosso “crescimento” econômico mal passa de 1%. Já foi colocado, também, que a política econômica iniciada em 2015 e aprofundada até os dias atuais tem uma larga parcela de responsabilidade nisso tudo. Pois bem, não há qualquer perspectiva de mudança “nisso daí”. Na verdade, fofocas palacianas até cravaram a saída de Paulo Guedes da pasta da economia no fim de fevereiro... A pele da maior parte dos brasileiros já sente há tempos que a situação não está nada boa nesse quesito...
Caso o Brasil tivesse um cenário político e econômico favorável, tecnologia e estrutura produtiva avançadas o suficiente, talvez pudéssemos aproveitar a situação. Como? Como a produção de quase tudo hoje em dia se dá em escala global, as empresas multinacionais serão obrigadas a transferir parte da produção dos países atingidos pelo Covid-19 para outros onde a epidemia ainda não chegou. Com isso, o desaquecimento em um local tenderia a se transformar em aquecimento em outro. Infelizmente, o Brasil não apresenta bons requisitos para isso. Pior será se a quarentena precisar ser adotada.
Assim, com o espalhamento do coronavírus pelo mundo e sua chegada aqui no país, a já fraquíssima economia tende a piorar ainda mais. Não só pela especulação em torno do fato. Mas pelo cuidado quanto à transmissão que o vírus requer. Isso tende a gerar o aprofundamento da crise cíclica que já estava em curso. Do ponto de vista econômico, Brasil que se cuide. Há tempos que o governo não cuida disso...

[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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