Semana de 13 a 19 de julho de 2020
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
No dia 12 de fevereiro de 2020, publicamos no Blog
do PROGEB uma análise que tratava da importância de se incluir, como ponto
central, a taxação da renda em qualquer discussão decente sobre reforma
tributária (https://bit.ly/30vVYEU). Naquele momento, já estavam no Congresso
duas PECs sobre o tema. Nenhuma delas trazia a renda para o debate. Vivíamos a
expectativa do Planalto enviar sua proposta.
Claro, não poderíamos esperar decência ou
engrandecimento com a contribuição de um anacrônico “liberal” dos anos 1970.
Tudo se confirmou com a ida de Paulo Guedes ao Congresso. Lá, o ministro deu
uma de açougueiro e entregou uma fatia, que mais parece um bife de segunda,
daquilo que chama de reforma. E essa reforma do Executivo é um mistério. A
única certeza que temos é a tentativa de reinventar a CPMF.
Como bem sabe o brasileiro, houve um momento da
história em que se pagava uma alíquota sobre quase todas as movimentações
financeiras realizadas no sistema bancário. Todos os cidadãos “bancarizados”
pagavam. Por isso, a volta do imposto sobre transações é vista por seus
defensores como “democrática”. E seria mais ainda agora, com a luz colocada
sobre dezenas de milhões de brasileiros antes “desconhecidos” do Estado e
incluídos no sistema financeiro via auxílio emergencial. Mas é justamente isso
que ilustra a falácia e perversidade desse imposto. Vejamos o argumento.
Talvez, um dos poucos consensos existentes na
sociedade brasileira é que não devemos pagar mais impostos. Até bem pouco
tempo, de consumidores a empresários, todos concordavam que a reinvenção da
CPMF era uma péssima ideia. Pois bem, parece que a coisa mudou e dois são os
motivos para isso. Primeiro, Paulo Guedes sugeriu a unificação de dois impostos
federais e sua simplificação (PIS e COFINS). Do mesmo jeito que as PECs em
tramitação, isso traria benefícios para os setores produtivos, mas prejuízos
aos serviços. O segundo motivo requer uma breve contextualização histórica.
Desde 2014, a economia brasileira oscila entre uma
situação ruim e outra pior. Isso significa que o emprego, a produção, a renda,
etc. também vão mal. Como forma de remediar, os sucessivos governos
deram/renovaram benefícios de diversas ordens aos empresários. Como as coisas
ainda não estão às mil maravilhas (ou sequer a umas duas maravilhas), os
empresários reivindicam a perpetuação de alguns desses benefícios.
Especificamente, eles querem manter e aumentar a desoneração da folha de
pagamentos. Isto porque, o “custo” efetivo de um trabalhador para o empresário
pode chegar ao dobro do salário mensal (incluindo os direitos constitucionais,
como férias e 13º salário).
Não sei se o leitor já captou a mensagem, mas o que
Paulo Guedes pretende é reduzir a tributação “antidemocrática” que incide sobre
as empresas para recriar uma tributação “democrática” que atinge a todos os
indivíduos, inclusive os miseráveis... Esse é o segundo motivo para a mudança
de posição de alguns em relação à volta da CPMF. Empresários como Flávio Rocha,
presidente da Riachuelo, empresa condenada por trabalho análogo ao escravo em
2016, defendem a proposta. É fraca a argumentação de que a redução do custo vai
aumentar a contratação de trabalhadores, pois nenhum empresário compra capital
produtivo só porque ele está mais barato. Só compra se for necessário para
ampliar o negócio e, infelizmente, esse não é o nosso caso. Assim, a
desoneração serve mais para compensar as perdas das empresas do que garantir
maior emprego (vide o que ocorreu após a reforma trabalhista do Temer).
Por isso remeto à análise do dia 12 de fevereiro: é
indecente se falar no Brasil de uma reforma tributária que não tenha como ponto
de partida a tributação sobre a renda e sua progressividade (quem ganha mais,
contribui mais – ou pelo menos igual aos demais). Todos estão chutando pra lá a
chance de minimizar a regressividade da nossa tributação.
Mas, fazer o quê? Essa é a “economia de mercado”, que intrinsecamente oscila entre momentos de maior e menor intensidade do crescimento. O problema é que na crise, quando a farinha é pouca, o pirão do trabalhador sempre fica mais ralo...
[i] Professor
do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto
Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com).
Colaboraram os pesquisadores: Daniella Alves, Ingrid Trindade, Matheus
Quaresma, Monik H. Pinto e Guilherme de Paula.
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