quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

A segunda onda, de negacionismo...

Semana de 07 a 13 de dezembro de 2020

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

No mesmo dia em que permaneceu dez minutos inteiros à beira de uma rodovia de Porto Alegre acenando para os que passavam, todos ouviram o que o Presidente Jair Bolsonaro anunciou: “estamos vivendo um finalzinho de pandemia”. Decretado foi, então, o fim da Covid-19 no país. Simples assim! O Messias disse, está feito. A imprensa que pare de mentir, dizendo que a média de novos casos diários está subindo. Mentiroso também é o dado que diz que no Brasil já morrem, novamente, mais de 600 pessoas por dia.

Talvez, o Presidente tenha afirmado isso tendo em conta um secreto Plano Nacional de Imunização. Este Plano, que deve ter sido elaborado pelos agentes secretos do Ministério da Logística (também conhecido como Ministério da Saúde) garantiria que dezembro de 2020 marcaria o fim da pandemia no Brasil. Ele é tão secreto que sequer se sabe a data para começar ou terminar. Mesmo que diversos países já estejam preparados para a vacinação da sua população.

Isso só pode ser verdade. Os fatos obscuros esclarecem... Tanto que o ministro da Logística (digo, da Saúde), general da ativa e cantor de karaokê, Eduardo Pazuello, foi a uma festa celebrar o fim da pandemia. Ela foi dada pelo governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, e contou até com Zezé Di Camargo, sem o Luciano. Todos sem máscara, mostrando à população brasileira que tudo faz parte de um Plano.

O Plano é tão eficiente que estão até sendo bonzinhos com o Instituto Butantã e com o Governo de São Paulo. Através da Anvisa, o governo federal tem feito o que pode para impedir o desenvolvimento e o uso da Coronavac. Já é uma quantidade de recursos que deixam de ser aplicados pelos paulistas, uma baita ajuda para garantir que não sejam despendidos à toa, já que o Messias tem um Plano. Quem sabe até o Governador de SP não siga os passos de Jair e Michelle Bolsonaro e use o dinheiro economizado numa cerimônia oficial de lançamento dos trajes de gala das festas de fim de ano...

Saindo um pouco do campo do delírio e das ironias, o Itaú fez projeções acerca do futuro da economia brasileira. Com o fim da pandemia, o PIB do Brasil cresceria cerca 4% em 2021, podendo chegar até a 5,7%. Caso o pior acontecesse e a segunda onda de mortes chegasse ao patamar da primeira, a economia cresceria apenas 1,4% em 2021. Por sua vez, se a média de mortes diárias ficar em 400 nos três primeiros meses do ano que vem, a projeção diz que o país cresceria 0,2% no primeiro trimestre de 2021. Caso a média de mortos fosse igual à que temos hoje, de 600 por dia, o PIB do Brasil cairia 1,2% no primeiro trimestre de 2021.

A situação parece não estar muito favorável à economia brasileira. Fora toda desgraça que nos acomete, o clima não está ajudando a lavoura. Apesar de ser um setor constantemente aclamado pelo Presidente, o campo está sofrendo com a seca e com as consequências da pandemia. Por exemplo, apesar de ainda ser esperado um recorde na colheita de 2020/21, a estimativa é de que sejam colhidas 3 milhões de toneladas de grãos a menos em relação às previsões iniciais. Isto porque “La Niña” afetou mais duramente o regime de chuvas, que prejudicou a produção de diversas culturas no Centro-Sul do país: milho e arroz no Rio Grande do Sul, soja em Mato Grosso, laranja em São Paulo e Minas Gerais, cana de açúcar em Mato Grosso do Sul, Goiás e São Paulo, além do café nas regiões do Triângulo Mineiro e Mogiana Paulista. Soma-se a isso o fato de que o abate de bovinos no terceiro trimestre de 2020 apresentou queda de 9,5% em relação ao mesmo período de 2019. Para finalizar, as exportações de soja e seus derivados recuaram em novembro a tal ponto de reduzir em 1,5% as exportações totais do campo em novembro de 2020, quando comparado com novembro de 2019.

Só um louco não percebe que nós brasileiros estamos completamente perdidos na solução dos problemas da pandemia. O nosso poder público é uma piada (literalmente) de mau gosto. Negou a pandemia na primeira onda. Está a negar na segunda. De fato, o brasileiro não tem um dia de paz mesmo...


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula, Monik H. Pinto e Daniella Alves.

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