quinta-feira, 15 de abril de 2021

Quem vai retirar o bode da sala?

Semana de 05 a 11 de abril de 2021

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

As águas continuam correndo na mesma direção prevista em nossas últimas análises. Agravam-se as situações política, econômica e sanitária. A pandemia multiplica os contágios, as internações e as mortes. O sistema de saúde entrou em colapso e estamos à beira do colapso do sistema funerário. O início da recuperação do final do ano foi abortado com as novas paralisações das atividades. Na política as pedras no tabuleiro mexeram-se. O presidente, obrigado a demitir o louco chanceler Ernesto Araújo, aproveitou a oportunidade para alterar o esquema de segurança tentando proteger-se e criar melhores condições para o golpe que não lhe sai da cabeça.

Apesar das pressões de parte das forças que o apoiam, Bolsonaro saiu por aí com sua insensata pregação negacionista. Na viagem pelo Sul, vociferou em Chapecó e Foz do Iguaçu contra o isolamento social, o uso da máscara e a vacinação, conclamando a população a ir para a rua com afirmações do tipo “nossa liberdade vale mais que nossa própria vida”. Mais uma vez apropriou-se do exército afirmando “nosso exército não vai à rua para manter o povo dentro de casa”. Não satisfeito manteve a propaganda da cloroquina como tratamento, usando a África como exemplo da luta contra a pandemia. Mais uma mentira. Ainda justificou os 350 mil mortos: “Qual país do mundo não morre gente? Infelizmente morre em qualquer lugar. ”

O discurso seguinte foi em São Paulo, no jantar na casa do Washington Civel, dono da Cia de Segurança Gocil, que contou com a presença da nata mais reacionária dos empresários paulistas entre os quais Flávio Rocha (Riachuelo), David Safra (Banco Safra), Luiz Carlos Trabuco Cappi (Bradesco), André Esteves (BTG Pactual) e o puxador mor Paulo Skaf. A bajulação foi tão indecente que o jornal Valor Econômico publicou um longo artigo desqualificando a representação presente e citando outro grupo da burguesia paulista que apoiou a carta aberta dos economistas, recentemente divulgada.

Em sentido contrário, solidarizando-se com as posições golpistas de Bolsonaro, manifestou-se o general de pijama Eduardo José Barbosa, presidente do Clube Militar, entidade que envergonha as forças armadas com suas descabidas manifestações. Em um desrespeito à constituição, o general apoiou o alinhamento dos comandos militares com as vontades do governo instigando a tropa a agir contra governadores e estimulando os atos de insubordinação das polícias militares. E tudo em defesa das liberdades das pessoas em ir e vir esquecendo que para a morte só existe o ir. Não há retorno.

No campo econômico os dados mostram que a situação em 2020 não foi pior graças ao Auxílio Emergencial e aos subsídios concedidos às empresas. A pandemia teve consequências diversas para os negócios. Uma pesquisa do Valor Data, com 341 grandes empresas, mostrou que 62% delas aumentaram suas receitas e só 38% tiveram queda. 67% delas tiveram lucro. 339 estão em boas condições para a retomada com um lucro líquido de R$60 bilhões. Claro que o sucesso foi pago pelos milhares de trabalhadores demitidos e empresas fechadas. Alguns setores, como o setor produtor de barcos de luxo, tiveram grande crescimento e as Marinas ficaram lotadas com 690.000 embarcações.

Já no primeiro bimestre de 2021, a situação se agravou. Em janeiro o IBC-Br, do Banco Central (BC), mostrou um crescimento da economia de 1,04%. Em fevereiro, a produção industrial teve uma queda de 0,7%. Em março, o Índice de Confiança do Consumidor (ICC) caiu 9,8 pontos e o Índice de Confiança dos Empresários (ICE) caiu 5,6 pontos. O setor de bens de capital foi favorecido pela safra recorde que puxou a demanda de máquinas agrícolas (crescimento de 36,3% no primeiro bimestre) e de caminhões (12,6%), enquanto a indústria como um todo só cresceu 1,3%.

No mundo há uma unanimidade de que a recuperação econômica só será possível com a vitória sobre a pandemia. Todos clamam pela vacinação, máscara e isolamento social. No Brasil o principal inimigo desta campanha é o próprio presidente, o bode colocado na sala pelo desespero de uma burguesia reacionária e de parte das forças armadas saudosas dos tempos da ditadura. Diante da calamidade atual pergunta-se: Quem agora vai tirar o bode da sala?


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

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