quinta-feira, 23 de setembro de 2021

A realidade e as projeções sobre a economia brasileira

Semana de 13 a 19 de setembro de 2021

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Como vimos em análises passadas, as expectativas de crescimento da economia brasileira para 2021 e 2022 estão se deteriorando semana a semana. Alguns órgãos oficiais, inclusive, passaram o mês de setembro revisando suas projeções. O motivo é que o momento do Brasil e do Mundo, sobretudo da China, não estão nada tranquilos e muito menos favoráveis. Vejamos.

Segundo o Boletim Focus do Banco Central, que reúne as projeções de diversas instituições do “mercado”, agosto passado foi o mês de 2021 mais otimista quanto às expectativas de crescimento do PIB brasileiro este ano. Naquele momento esperava-se um crescimento de 5,3%. Porém, ao longo de setembro o “mercado” foi revendo suas projeções e, hoje, já está em 5% de elevação no PIB (mas estamos bem melhor do que as expectativas do início do ano, que esperavam aumento de 3,5%). Outra variável que também teve suas expetativas pioradas foi a conta de transações correntes, que registra, sobretudo, as transações de bens, serviços e rendas entre o Brasil e o resto do mundo. De uma projeção de equilíbrio, agora espera-se que o saldo das transações correntes feche 2021 no vermelho, em US$ -2,0 bilhões. Por sua vez, as projeções do saldo de investimento estrangeiro direto vêm se reduzindo paulatinamente desde junho, reduzindo-se em cerca US$ 10 bilhões até o presente mês de setembro.

De uma forma geral, analisar projeções é arriscado, pois elas podem não se concretizar. Contudo, faltam pouco mais de três meses para o fim do ano. Isto significa que quase tudo que tinha para acontecer na economia já aconteceu. Por isso mesmo as projeções vão sendo refeitas e se aproximando da realidade. E isso é que é interessante de se observar: o processo de ajuste do que se esperava no passado quanto ao que iria ocorrer no futuro. De uma maneira geral, as expectativas iniciais mostram o “clima” àquela época e, de certa forma, qual a disposição dos tomadores de decisão em investir, produzir, comprar, vender... Se as coisas seguem como o esperado (o que é pouco provável e raramente acontece), expectativa e realidade coincidem e as projeções foram corretas. Caso contrário, as projeções são refeitas e adaptadas, como dito acima.

O ponto de partida é a criação de cenários-base, que trazem as principais expectativas: as reformas que provavelmente serão feitas, como o governo pretende realizar seus gastos e obter suas receitas, como anda o cenário externo... A partir daí estima-se qual deve ser o comportamento da economia. O problema é que são muitos os fatores que podem “atrapalhar” os cálculos daqueles que tentam prever o futuro com alguma exatidão. Atualmente, a pandemia ainda é a grande vilã. Afinal, como se organizar cadeias produtivas (globais ou mesmo nacionais) no meio de um abre e fecha causado pelas variantes da Covid-19? Por sua vez, claro, nunca foi segredo que o presidente Jair Bolsonaro e sua equipe econômica sempre deram sua (enorme) contribuição para a desestabilização da economia brasileira.

O mais esperado nos primeiros meses de 2021 era o desenrolar da vacinação. O início foi lento, mas depois acelerou e parecia que conseguiríamos vacinar num ritmo forte. Ledo engano. Como tem mostrado a CPI da Pandemia no Senado, muitos eram os fatores obscuros que atuavam para travar o processo. Tanto que atualmente a vacinação anda de lado em muitas cidades. Outro fator que decepcionou os analistas foi a bagunça orçamentária, em especial as tentativas de pagar o novo Bolsa Família e de não pagar os precatórios. Sem falar nas Medidas Provisórias que caducaram no Congresso Nacional.

A cereja no bolo foi o acirramento da tensão institucional ao longo do ano, tema tratado há duas semanas nessa mesma coluna. De toda forma, no fundo, os ataques à democracia serviram também para desestabilizar o clima de bonança que se instalou no meio do ano. Por esse e pelo cenário internacional, eu não projetaria uma melhora significativa até o final do ano. Em outras palavras, veremos a realidade impor-se sobre as projeções ainda otimistas para o país.


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

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