quarta-feira, 15 de junho de 2022

Ainda sobre os combustíveis e o desastre político

Semana de 06 a 12 de junho de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Está ocorrendo no Congresso Nacional a tramitação de um projeto de lei que busca limitar o ICMS à 17% para combustíveis, energia, transporte e comunicação. Como já foi dito a duas semanas atrás, nesta mesma coluna, o grande objetivo é baixar os preços do diesel e da gasolina no posto de combustível. Na ocasião, dissemos que esta medida em nada vai servir para conter a escalada dos preços internacionais e do dólar (a verdadeira causa da elevação dos preços), bem como isto trará um rombo de cerca de R$ 100 bilhões aos cofres de estados e municípios brasileiros.

Pois bem, o referido projeto está passando à jato pelo Congresso e prepara o terreno para um absurdo ainda maior: o envio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pretende zerar os impostos federais que incidem sobre a gasolina e o etanol e zerar o ICMS sobre o diesel e o gás natural (que já têm os impostos federais zerados). Naturalmente, isto vai custar uma grande soma de recursos. Assim, espera-se uma inevitável redução na arrecadação, da União, dos estados e dos municípios.

Porém, o governo federal pretende compensar parte dessas perdas. Segundo o sinistro Paulo Guedes, a ajuda aos entes da federação vai variar entre R$ 25 e R$ 50 bilhões. E aí é que está o novo problema, um verdadeiro crime lesa-pátria: parte deste dinheiro deve vir da recente privatização da Eletrobrás, que já rendeu R$ 29,3 bilhões, mas podendo chegar a R$ 33,7 bilhões. Veja bem, caro leitor, isto significa que um patrimônio nacional vai se transformar em dinheiro para bancar a insustentável política de preços da Petrobrás, que beneficia apenas seus acionistas minoritários e suas concorrentes privadas.

Numa conta grosseira, baixar os impostos significaria reduzir em R$ 1,21 o preço da gasolina, saindo da média de R$ 7,25 (a preço médio nacional de hoje) e indo para aproximadamente R$ 6. Já o diesel reduziria em R$ 0,82, caindo de R$ 7,01 para algo em torno de R$ 6,2. O gás de cozinha teria seu preço médio reduzido em R$ 14,73, saindo de R$ 112,64 para algo próximo de R$ 98. Isto mostra que, mesmo com a redução nos impostos, os preços continuarão abusivos. O motivo é que a maior parcela do preço desses produtos fica com a Petrobrás (percentuais ainda maiores no caso das petroleiras privadas): no caso da gasolina, 38,8% hoje fica com a Petrobrás; 48,8% no caso do gás de cozinha; e 63,2% no caso do diesel. Caso não se lembre, caro leitor, a Petrobrás já lucrou R$ 44,5 bilhões apenas nos três primeiros meses de 2022. No trimestre anterior, ela tinha lucrado R$ 31,5 bilhões.

Para confirmar o argumento de que os impostos não resolverão o problema do preço dos combustíveis, basta ver a defasagem entre o preço cobrado pela Petrobrás e o preço de importação do combustível. Desde abril, os preços internos estão defasados (mais baixos) em relação ao externo. A gasolina da Petrobrás deveria estar R$ 0,82 mais cara. Ou seja, mesmo reduzindo em R$ 1,21 (na conta acima) o preço da gasolina via impostos, em algum momento a Petrobrás vai ter que reajustar seus preços internos para se alinhar ao mercado internacional. Em resumo, a redução do imposto junto com o aumento do preço resulta numa redução efetiva de apenas R$ 0,39 no preço da gasolina. No caso do diesel, a defasagem está em R$ 0,95. Ou seja, ao invés de cair, caso haja a redução do imposto e o realinhamento com os preços internacionais, o preço do diesel vai subir em R$ 0,13. Isso tudo sem falar nos reajustes que devem vir até o fim do ano.

 Como desgraça pouca é bobagem, no dia 09/06/2022 o Governo Federal enviou ao Congresso uma proposta de lei que antecipa a receita que o Brasil terá com o excedente de óleo e gás extraído do seu território até o ano de 2030. São mais de R$ 330 bilhões que podem vir como cheque em branco para Bolsonaro, Paulo Guedes e Arthur Lira gastarem neste ano eleitoral. Haja orçamento secreto para dar conta dessa dinheirama.

Por fim, para aqueles que ainda acham que Bolsonaro vai entregar o poder de graça, preparem-se, pois, literalmente, ele vai cobrar muito caro.


[i] Professor do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares, Nertan Gonçalves e Ana Isadora Meneguetti.

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