quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

O que esperar para 2023?

Semana de 19 a 25 de dezembro de 2022


Lucas Milanez de Lima Almeida i 


O fim de ano chegou e é inevitável falar sobre as previsões econômicas para o ano que está chegando. Mas, antes de dizer o que é mais provável de acontecer em 2023, é preciso olhar para trás e entender o contexto em que nos encontramos.  

Desde 2011 a economia brasileira vem reduzindo sua força. Desde aquele ano nosso crescimento ficou abaixo do crescimento médio das chamadas “economias emergentes e em desenvolvimento” (aquelas mais parecidas com a nossa) e do mundo. Desde 2014 nosso crescimento está abaixo daquele registrado nas “economias avançadas” (as economias dos países centrais). Entre 2017 e 2019 não conseguimos sequer chegar a 2% de crescimento do PIB. Mesmo no tombo causado pela pandemia de Covid-19 (em 2020) ou na recuperação de 2021 ficamos atrás desses grupos de países.  

O motivo desse desempenho pífio é o conjunto de políticas econômicas adotadas desde o fim de 2014, mas aprofundadas após o golpe institucional que tirou Dilma Rousseff da presidência em 2016. As medidas passaram a privilegiar a austeridade orçamentária e a eliminação do Estado nas ações de coordenação e estímulo à atividade econômica. Abriu-se mão de projetos de infraestrutura e de políticas de estímulo à produção local, bem como desconfiguraram o principal instrumento estatal de fomento, o BNDES. Somado a isso, o orçamento foi sendo pouco a pouco reduzido em áreas como educação, saúde, ciência e tecnologia, combate à fome, moradia etc. Por outro lado, aumentou-se a prioridade para a obtenção do superávit primário a todo custo.  

Essa busca do governo de executar um orçamento que gasta menos do que arrecada virou uma verdadeira loucura com Jair Bolsonaro. São muitas as notícias que mostram a falta de recursos em inúmeros órgãos neste fim de ano. Mesmo assim, a expectativa do atual ministro da economia, Paulo Guedes, é fechar o ano de 2022 com um superávit primário de R$ 40 bilhões. Isso mesmo. O governo Bolsonaro praticamente deixou fechar diversos serviços públicos por falta de verba, mesmo havendo essa dinheirama para ser gasta. Esse é o contexto no qual se deram as negociações da PEC da Transição, que corrigiu um conjunto de irresponsabilidades desta natureza.  

Por isso, em 2023 a expectativa é de que haja uma espécie de correção de rumos. É bem verdade que a economia mundial está em desaceleração e, por isso, essa correção pode ser turbulenta. Mas, me arrisco a dizer, que o crescimento do Brasil será significativamente maior do que as atuais estimativas do “mercado”, que prevê algo menor que 1,0%. O motivo desta visão otimista explico a seguir.  

Há um conjunto de necessidades estruturantes para uma expansão robusta e adequada da economia, mas que, como mencionei anteriormente, foram negligenciadas nos últimos anos. Não é nenhuma novidade no âmbito da ciência econômica que economias como a brasileira, economias atrasadas, necessitam do impulso do Estado para garantir seu sucesso. O motivo fundamental é que alterar o “estado das coisas” livremente, via mercado, é impossível. Por isso, para romper as amarras que caracterizam a nossa dependência, é estritamente necessária a ação ativa do Estado na criação de condições que façam a produção local reduzir o atraso em relação às “melhores práticas internacionais”. Esta ação, porém, depende do apoio da base ideológica que sustenta o governo e, principalmente, da elite que (teoricamente) vai lucrar com isso.  

Apesar de termos visto a elite financeira (e aqueles que ganham com o atual “estado das coisas”) tentando impedir a proposição de medidas diferentes, mesmo assim, é de se esperar que a partir de 2023 isto mude. Como já vimos entre 2003 e 2010, é perfeitamente possível que todos ganhem em momentos de expansão econômica, capitalistas e trabalhadores. Somado a isso está o fato de que a ação estatal no Brasil está parada há muito tempo. Por isso, o atual “esforço fiscal” certamente fará nossa economia voltar a andar para a frente. O difícil é articular isso com as elites e manter o provável arranque que se iniciará ano que vem. É esperar e cobrar

Ah! ... Feliz ano novo!

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i Professor do DRI/UFPB, PPGCPRI/UFPB e PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB. (@progebufpblucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Gonçalves. 
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quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

As dificuldades de 2023

Semana de 12 a 18 de dezembro de 2022

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

Os atos de vandalismo e a baderna provocada em Brasília pelas hordas de bolsomínions enfurecidos pela prisão do farsante pastor-cacique Serere, ainda ressoam, enquanto os caminhões de mudança discretamente continuam a trabalhar no palácio da Alvorada. Mas os fanáticos ainda esperam mais 72 horas pois o “mito” vai ressurgir das profundezas dos infernos com o seu prometido golpe. O delírio continua a ser alimentado pelo próprio presidente com suas declarações e pela conivência de autoridades policiais e militares que facilitam o apoio aos acampamentos nas áreas dos quarteis do exército que se transformaram em covís de marginais. Triste papel dos comandantes destes quarteis que se tornaram coiteiros de bandidos. Até quando estes abusos serão tolerados sem que os responsáveis sejam punidos?

A tensão aumenta com a aproximação do dia da posse do novo presidente, diante das ameaças de atentados para impedi-la, o que parece não preocupar os eleitos, pois as nomeações dos futuros ministros e auxiliares continuam a ocorrer a cada dia como se nada de extraordinário estivesse ocorrendo. À medida em que os nomes são divulgados, os ânimos vão se acalmando com os esperneios previsíveis. As questões econômicas são as que provocam os maiores ataques de pelanca do tal “mercado”, acompanhados pelo coro de muitos analistas partidários da austeridade fiscal a todo custo e cupinchas dos setores mais reacionários da burguesia. Até esquecem os desmandos do governo Bolsonaro com os estouros do teto, os atos eleitoreiros de última hora e a farsa de orçamento aprovado, irresponsável e irrealizável.

Enquanto isso, Bolsonaro se despede assinando atos administrativos de última hora, tentando aproveitar os momentos finais para nomear seus cupinchas que ficarão desempregados e complementar seus planos de destruição do país. Como ele mesmo afirmou, o que ele sabe fazer é matar, foi isto que aprendeu como oficial de artilharia. E foi tão mau aluno que o Exército não o quis. Mas, o pouco que aprendeu foi suficiente para matar, não apenas pessoas (só na pandemia mais de 600.000), mas um país. A destruição que o seu governo causou levará muito tempo para ser reparada. O novo governo enfrentará um primeiro ano infernal pois as bombas econômicas de efeito retardado deixadas por ele já começaram a estourar.

Com efeito, como temos demonstrado, a desaceleração da economia continua em marcha. O próprio Banco Central (BC), em seu relatório de inflação de dezembro, prevê que em 2023 o PIB crescerá apenas 1%, a indústria terá crescimento zero e os serviços 0,9%. Só a agricultura terá crescimento (7%), mas a Formação Bruta de Capital Fixo, indicador dos investimentos, crescerá apenas 0,3%. O BC atribui tudo isto à taxa de juros real elevada que, já no último trimestre do ano atual, chegou a 7,8%. O BC divulgou ainda o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), considerado indicador antecedente do crescimento do PIB. Este Índice mostrou uma desaceleração de -0,05%, em outubro. Lembremos que, em setembro, indicou um crescimento de apenas 0,05%. Se considerarmos a grande possibilidade de agravamento da situação internacional, a inflação pode piorar e levar o BC a aumentar ainda mais a taxa Selic o que agrava a desaceleração. O orçamento fantasma e as irresponsabilidades eleitoreiras do governo Bolsonaro podem provocar um agravamento da dívida pública o que criará maiores dificuldades no primeiro ano do novo governo. Uma situação difícil a ser enfrentada.

A economia já emite sinais negativos que permitem prever o que se aproxima. A Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) do IBGE, mostrou uma queda de -0,6% no volume de serviços em outubro. Três das cinco atividades recuaram, com destaque para os Transportes (-1,8%) e serviços prestados às famílias (-1,5%). Estes dados levam os analistas e a própria FGV Ibre a prever uma desaceleração geral no quarto trimestre deste ano. Aqui nesta coluna temos seguidamente alertado para estes fenômenos que agravam as nossas próprias dificuldades. Eis o que nos espera em 2023.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Alves.

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quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Dor, alegria, ódio, medo e esperança: eis o Brasil

Semana de 05 a 11 de dezembro de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Por motivos distintos e difusos, frações da sociedade brasileira têm sofrido com os últimos acontecimentos da última semana. Não poderia deixar de registrar a dor de ver a seleção levar um gol de contra-ataque, aos 116 minutos de um jogo de futebol e em plenas quartas de final de Copa do Mundo. A equipe toda falhou naquele momento. Essa, talvez, seja a dor mais disseminada no país.

Porém, três dias depois da eliminação, pudemos comemorar a diplomação de mais um presidente democraticamente eleito. Assim, com esse terceiro mandato, Lula constrói um verdadeiro triplex na cabeça dos bolsonaristas. E aqui vale ressaltar o empenho do atual presidente do TSE, Alexandre de Moraes, para garantir que a democracia fosse respeitada. O meu eu, de 12 maio de 2016, dia da sua nomeação como ministro do STF, jamais pensou que Moraes seria um “paladino da justiça” em 2022.

Isto, no entanto, despertou choro e ranger de dentes em uma parte dos brasileiros. Neste mesmo dia da diplomação de Lula, viu-se um rebanho de bolsominions desgarrados botando terror em Brasília. O motivo é curioso, pois envolve mais um personagem caricato do multiverso bolsonarista: um indígena cacique-pastor-missionário. O Serere Xavante foi preso, dentre outras coisas, por incitar e liderar atos criminosos contra Lula e contra a democracia. Para piorar, depois do quebra-quebra, dos incêndios e da baderna, ninguém foi preso em flagrante. A suspeita é de conivência de parte das forças policiais com os manifestantes.

Por sua vez, o sentimento de medo, ao qual me refiro no título da análise, já vem sendo tratado há algumas semanas: o medo do “mercado”. Na medida em que avançam as tratativas e indicações dos futuros ministros do governo Lula, avançam também as “análises” e opiniões de que as coisas já estão no caminho errado. Não é difícil encontrar nos grandes portais ligados ao setor financeiro as notícias que decretam o futuro desastre brasileiro.

Baseados em teorias que respeitam pouco a realidade e os fatos, tais “analistas” projetam para o futuro aquilo que vivemos hoje, como se nada ou pouca coisa pudesse mudar ao longo do tempo. É como se o fraco crescimento econômico de hoje fosse perdurar e, com isso, não fosse possível pagar os gastos e os investimentos pretendidos pelo novo governo. Mas, como é bem sabido por qualquer economista que tenha estudado bons manuais de macroeconomia, os investimentos governamentais tem um forte efeito de retroalimentar a atividade econômica. Com isso se gera mais renda. Com mais renda há maior arrecadação de tributos. Daí viria a receita para quitar os investimentos.

Mas, não se poderia esperar outra coisa dos analistas do “mercado”. Esses são os mesmos que sempre defendem o nosso papel tradicional no sistema econômico mundial, de país subordinado. Na cabeça deles é assim: façamos o mais fácil (economia baseada em produtos primários) e deixemos o difícil para os outros (economia de maior complexidade tecnológica). Para eles a economia e o orçamento público estão ótimos da maneira como se encontram hoje, pois sempre saem ganhando. Querer aumentar a dívida pública é um pecado, mais ainda se o objetivo é dar dinheiro aos pobres ou investir em infraestrutura, educação, ciência e tecnologia. O dinheiro público tem que ir para a gestão da dívida, aliás, a única cifra do orçamento para a qual não se discute um ajuste ou sacrifício.

É na flexibilização dessas exigências do “mercado” que está a esperança de dias melhores para o Brasil e os brasileiros. Como estamos vendo, o futuro governo já está a governar. Além de conseguir aprovar no Senado uma PEC para aumentar os gastos em 2023, a equipe de transição conseguiu dinheiro para Bolsonaro e Paulo Guedes pagarem as contas de 2022. Não fosse isso muitos serviços públicos iriam parar, literalmente.

Mas, como destacamos nas últimas análises, o “mercado” é muito duro na queda. A chance de dobrá-lo sem sequelas é (quase) zero. Por isso, que o novo governo toque seus projetos, doa em quem doer. Mas deixo claro, também estaremos aqui pra fiscalizar...


[i] Professor do DRI/UFPB e do PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Gonçalves.

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quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Arrasta-se a transição. Esperneiam os bolsominions

Semana de 28 de novembro a 04 de dezembro de 2022

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

 

Em análises anteriores falamos nos tempos difíceis que se avizinham. Eles estão chegando. À medida em que as comissões vão avançando nos trabalhos da transição, os números vão sendo revelados em sua crueza. A irresponsabilidade da dupla Bozo-Guedes é muito maior que o imaginado. Não há dinheiro nem para terminar o atual ano. Agora querem que na PEC da transição sejam incluídos alguns milhões para pagar despesas de 2022. Enquanto os bloqueios continuam nas estradas, o governo continua bloqueando verbas para os ministérios criando um verdadeiro caos na Educação e na Saúde. A fúria é de tal ordem que até as verbas do orçamento secreto foram bloqueadas causando revolta entre os deputados do “centrão”. A cada dia o tamanho do rombo aumenta. O orçamento que foi apresentado pelo sinistro Guedes é uma farsa e não pode ser executado.

No Congresso, as conspirações avançam a pleno vapor. As eleições para as presidências das duas casas, que deveriam ocorrer no próximo ano, já estão em marcha e tudo indica que a equipe de Lula vai encaminhar sua posição de apoio à reeleição dos atuais presidentes. As alternativas são ainda piores. Como se previa o adesismo ao novo governo é descarado. Os partidos e deputados do Centrão estão à venda. Todos querem aderir em busca de favores e empregos. Aspiram até a ministérios já disputados pelos partidos que apoiaram a eleição do Lula. É um grande saco de gatos e é de se esperar que o presidente eleito, com sua grande experiência, saiba navegar neste mar revolto.

Se na política as coisas estão confusas na economia a situação não é melhor. A lenta recuperação que se anunciava perde cada vez mais o fôlego, como já havíamos previsto. Os fatores que a impulsionaram perdem força: a recuperação pós-pandemia, o esgotamento da poupança das famílias, a alta dos juros com a Selic elevada aumentando a inadimplência, o dólar forte, os juros externos mais altos, o crescimento global fraco, o estímulo da farra das medidas eleitoreiras do governo, a desaceleração dos serviços e da construção civil, o crescimento do emprego etc. Indicador disto é a queda da confiança do consumidor. O Índice de Confiança do Consumidor (ICC), calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), apresentou uma queda de 3,3 pontos em novembro. Em outubro, a inadimplência das companhias aumentou 8,5%. Do total inadimplente, 53% corresponderam a empresas dos serviços, 38% do comércio e 8% da indústria, segundo dados da Serasa. 89% dos inadimplentes são micro e pequenas empresas.  No terceiro trimestre a economia desacelerou. A agricultura decresceu -0,9%, a indústria extrativa -0,12%. O crescimento do PIB foi salvo pelos serviços que cresceram 1,1%, pelos investimentos que cresceram 2,8% e pela construção civil com um crescimento de 1,1%. A indústria de transformação contribuiu apenas com 0,12%.

A taxa de desemprego caiu para 8,3%, em outubro, com redução da informalidade, mas os analistas afirmam que esta tendência não se manterá. O que é mais preocupante é que um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostrou que a erosão dos salários no Brasil, entre janeiro e junho do ano em curso, foi de -6,9%. Considerando que em 2021 a redução dos salários foi de -7% e em 2020 de -4,9%, no período 2020-2022, a massa salarial caiu -18,8%. Isto mostra o tamanho do esmagamento da demanda que obrigatoriamente deve refletir-se no crescimento do PIB.

Apesar dos avanços na transição a instabilidade continua a perturbar a retomada da normalidade pós-eleição. Há mesmo uma dualidade de poder. Continuam as ocupações de estradas e as concentrações em frente aos quarteis com apelos para a intervenção militar “contra o comunismo”, o que é tolerado pelos comandantes. Continuam os apelos para impedir pelas armas a posse do novo presidente, diante da passividade das autoridades. Só de vez em quando, por ordem direta do STF, alguma medida é tomada. Fica evidente o caráter reacionário das Forças Armadas, totalmente contaminadas pelo bolsonarismo, situação que precisa urgentemente ter um fim. Para a garantia do futuro urge que os criminosos sejam punidos. Não pode haver anistia para estes crimes.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Alves.

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sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

A tutela do novo governo Lula

Semana de 21 a 27 de novembro de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Prezado leitor, há quatro anos escrevi aqui neste mesmo espaço um texto abordando as contradições que o então presidente eleito, Jair Bolsonaro, teria de arbitrar para compor e manter seu governo (link). Além disso, há um ano escrevi sobre o que a literatura da ciência política chama de bloco no poder e como algumas elites estão sempre comandando o Estado (link). Pois bem, não tem como não falar desse tema no momento atual, pois há muitas forças tentando tutelar a formação da base do governo Lula.

Como já é público e notório, a gestão do orçamento da nação feita pela dupla Bolsonaro e Paulo Guedes é um desastre, principalmente para nós, reles mortais. Na proposta original do orçamento de 2023 está faltando dinheiro para várias áreas importantes, como saúde, educação, ciência, tecnologia e habitação. Por exemplo, o orçamento de 2023 propõe a redução das verbas para as políticas de habitação em 93,2% (sai de R$ 1,2 bilhão para R$ 82,3 milhões) e de saneamento básico em 65,2% (menos R$ 492,2 milhões). Na saúde, a redução é de 42% nos gastos discricionários, enquanto na educação a redução chega a 50% das verbas de 14 ações. Além disso, algumas promessas não estavam previstas no orçamento, como o Bolsa Família de R$ 600 e o salário mínimo de R$ 1.400. O que a equipe de transição está tentando fazer é consertar essa porcaria.

Naturalmente, quando se fala de orçamento, estamos falando da organização de todo o dinheiro que será arrecadado e como (e com quem) ele será gasto. Sabemos que esse orçamento deve respeitar uma lei criada em 2016, pelo governo Michel Temer, conhecida como teto dos gastos. Como o nome sugere, a lei diz que um governo só pode gastar em um ano o mesmo valor gasto no ano anterior acrescido da inflação. Em outras palavras, as atuais regras orçamentárias limitam muito a margem para manobrar o orçamento. Como ele não pode ter crescimento real sobre o ano anterior, para aumentar o gasto com uma coisa é preciso reduzir com outra que não seja considerada prioritária. E é aí que entram as pressões do que seria esse “prioritário”.

Como vimos, Bolso-Guedes consideram dispensáveis a educação e alguns fundos constitucionais (sob responsabilidade do Ministério da Integração Nacional). Por outro lado, consideram o pagamento dos juros essenciais. No ano passado já reduziram (em relação a 2020) verbas da educação em R$ 1,3 bi e da integração nacional em R$ 10,4 bi. Mesmo assim, segundo dados do Banco Central, em 2021 os dois aumentaram o pagamento de juros para R$ 499,3 bi, enquanto em 2020 foram pagos R$ 347,2 bi em juros nominais.

Mas não é só o orçamento do ano que vem que está de mal a pior. O dinheiro também está sendo mal gerido agora. Todo mundo sabe que, para tentar se reeleger, Bolsonaro gastou adoidado ao longo de 2022. Por isso, anunciou em novembro mais R$ 5,7 bi de bloqueio no orçamento, deixando, por exemplo, as universidades à mingua. Já são R$ 15,4 bi bloqueados em todo ano. A situação é tão crítica que até o comércio e a indústria foram buscar seu espaço. Em reunião com a Confederação Nacional da Indústria, membros da equipe de transição apresentaram o descalabro da falta de apoio ao setor. Com dados atualizados pela inflação, a verba destinada ao desenvolvimento da “Indústria, comércio e serviços” caiu de R$ 10,6 bi em 2010 para R$ 5,7 bi em 2022. Para 2023 o orçamento previa um gasto de R$ 5,8 bi.

Enquanto isso, lembra dos juros pagos pela dupla Bolso-Guedes? Pois bem, entre janeiro e outubro de 2022 eles já pagaram um total de R$ 599,3 bi em juros nominais. O que a elite, que tenta tutelar na formação do bloco no poder do governo Lula, é a manutenção dessa mamata.  Por outro lado, Lula tenta avisar: a mamata está muito grande, vocês têm que abrir mão disso por enquanto, para depois todos voltarem a ganhar muito dinheiro. Afinal, como ele mesmo diz, foi no governo Lula que os banqueiros mais ganharam dinheiro na história do país. Infelizmente, no capitalismo, não tem como não os agradar. Dilma Rousseff que o diga...


[i] Professor do DRI/UFPB e do PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Gonçalves.

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