quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Dor, alegria, ódio, medo e esperança: eis o Brasil

Semana de 05 a 11 de dezembro de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Por motivos distintos e difusos, frações da sociedade brasileira têm sofrido com os últimos acontecimentos da última semana. Não poderia deixar de registrar a dor de ver a seleção levar um gol de contra-ataque, aos 116 minutos de um jogo de futebol e em plenas quartas de final de Copa do Mundo. A equipe toda falhou naquele momento. Essa, talvez, seja a dor mais disseminada no país.

Porém, três dias depois da eliminação, pudemos comemorar a diplomação de mais um presidente democraticamente eleito. Assim, com esse terceiro mandato, Lula constrói um verdadeiro triplex na cabeça dos bolsonaristas. E aqui vale ressaltar o empenho do atual presidente do TSE, Alexandre de Moraes, para garantir que a democracia fosse respeitada. O meu eu, de 12 maio de 2016, dia da sua nomeação como ministro do STF, jamais pensou que Moraes seria um “paladino da justiça” em 2022.

Isto, no entanto, despertou choro e ranger de dentes em uma parte dos brasileiros. Neste mesmo dia da diplomação de Lula, viu-se um rebanho de bolsominions desgarrados botando terror em Brasília. O motivo é curioso, pois envolve mais um personagem caricato do multiverso bolsonarista: um indígena cacique-pastor-missionário. O Serere Xavante foi preso, dentre outras coisas, por incitar e liderar atos criminosos contra Lula e contra a democracia. Para piorar, depois do quebra-quebra, dos incêndios e da baderna, ninguém foi preso em flagrante. A suspeita é de conivência de parte das forças policiais com os manifestantes.

Por sua vez, o sentimento de medo, ao qual me refiro no título da análise, já vem sendo tratado há algumas semanas: o medo do “mercado”. Na medida em que avançam as tratativas e indicações dos futuros ministros do governo Lula, avançam também as “análises” e opiniões de que as coisas já estão no caminho errado. Não é difícil encontrar nos grandes portais ligados ao setor financeiro as notícias que decretam o futuro desastre brasileiro.

Baseados em teorias que respeitam pouco a realidade e os fatos, tais “analistas” projetam para o futuro aquilo que vivemos hoje, como se nada ou pouca coisa pudesse mudar ao longo do tempo. É como se o fraco crescimento econômico de hoje fosse perdurar e, com isso, não fosse possível pagar os gastos e os investimentos pretendidos pelo novo governo. Mas, como é bem sabido por qualquer economista que tenha estudado bons manuais de macroeconomia, os investimentos governamentais tem um forte efeito de retroalimentar a atividade econômica. Com isso se gera mais renda. Com mais renda há maior arrecadação de tributos. Daí viria a receita para quitar os investimentos.

Mas, não se poderia esperar outra coisa dos analistas do “mercado”. Esses são os mesmos que sempre defendem o nosso papel tradicional no sistema econômico mundial, de país subordinado. Na cabeça deles é assim: façamos o mais fácil (economia baseada em produtos primários) e deixemos o difícil para os outros (economia de maior complexidade tecnológica). Para eles a economia e o orçamento público estão ótimos da maneira como se encontram hoje, pois sempre saem ganhando. Querer aumentar a dívida pública é um pecado, mais ainda se o objetivo é dar dinheiro aos pobres ou investir em infraestrutura, educação, ciência e tecnologia. O dinheiro público tem que ir para a gestão da dívida, aliás, a única cifra do orçamento para a qual não se discute um ajuste ou sacrifício.

É na flexibilização dessas exigências do “mercado” que está a esperança de dias melhores para o Brasil e os brasileiros. Como estamos vendo, o futuro governo já está a governar. Além de conseguir aprovar no Senado uma PEC para aumentar os gastos em 2023, a equipe de transição conseguiu dinheiro para Bolsonaro e Paulo Guedes pagarem as contas de 2022. Não fosse isso muitos serviços públicos iriam parar, literalmente.

Mas, como destacamos nas últimas análises, o “mercado” é muito duro na queda. A chance de dobrá-lo sem sequelas é (quase) zero. Por isso, que o novo governo toque seus projetos, doa em quem doer. Mas deixo claro, também estaremos aqui pra fiscalizar...


[i] Professor do DRI/UFPB e do PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Gonçalves.

Share:

0 comentários:

Postar um comentário

Novidades

Recent Posts Widget

Postagens mais visitadas

Arquivo do blog