Semana de 24 a 29 de
junho de 2024
Nelson Rosas Ribeiro[i]
A publicação da ata da reunião do Copom
veio tentar reforçar os argumentos que sustentaram as decisões de interromper a
redução da Selic. Em nada reforçaram, porém, a justeza da decisão. Não é
necessária muita teoria para se concluir que uma taxa de juros elevada em nada
afeta as “incertezas econômicas externas”, ou seja, para esta causa o remédio
apontado é inútil. Outro argumento usado pelo Boletim Focus, as “perspectivas
desancoradas” do mercado também não sofrem qualquer alteração. Melhor seria se
proibissem o próprio presidente, Campos Neto, de falar as bobagens que influem
nas “expectativas”. Como os jornais noticiaram, ele andou por aí discursando e
difamando o BC futuro, que será constituído com nomes indicados pelo presidente
Lula.
Nos jantares e cerimônias de que
participou, como a promovida pelo governador de São Paulo, fez questão de
levantar suspeitas sobre o novo Banco Central (BC), no que tem sido ajudado
pelo coro dos grandes jornais. O outro argumento usado, sobre a elevação das
projeções de inflação, igualmente não se justifica, pois o próprio BC calculou
que o IPCA teve uma elevação de apenas 0,06%. O último argumento é o da
“resiliência da atividade econômica”. Aí fica clara a verdadeira intenção do
BC: dificultar o crescimento da economia. Quanto pior, melhor!
É a confirmação das denúncias feitas aqui
nesta coluna: para o BC, a desgraça do país é o crescimento da economia, a
queda do desemprego, que está no patamar mais baixo dos últimos 10 anos, a
elevação dos salários, que provoca o aumento do consumo etc. Muita razão tem o
presidente Lula ao denunciar o Roberto Campos Neto como agente do atraso. É
lamentável que os partidos e as forças sociais não façam esta denúncia e as
próprias entidades empresariais, que começaram a se pronunciar, não aumentem o
coro dos protestos.
O
papel nefasto da elevação dos juros para a atividade econômica é reconhecido
por várias teorias. Não é preciso recorrer a Marx para se chegar a esta
conclusão. O jornalista Pedro Cafardo, em artigo publicado no jornal Valor
Econômico, cita alguns exemplos. No Brasil, depois de 2005, com juros reais
médios de 6,5%, um rentista aplicando seus recursos, dobraria seu capital em 11
anos. No mesmo período, nos EUA, com juros reais de 0,4%, o capital empregado
só dobraria em 173 anos. Os altos rendimentos resultantes das elevadas taxas de
juros contaminam toda a sociedade e contaminaram o próprio setor industrial,
que começou a desviar parte de seu capital produtivo para “aplicações
financeiras”, são os tais “ativos financeiros”.
Isso serviu de base para a aliança estre
estes capitais e o setor financeiro-rentista, formando um poderoso bloco
financeiro-rentista-industrial, que atualmente domina o congresso nacional e
influencia todos os poderes da república. Cafardo baseia-se no livro
“Financeirização, Crise, Estagnação e Desigualdade”, do cientista social da USP
Bruno Mader. Bruno utiliza as teorias do economista polonês Michael Kalecki
(1899-1970). Não é necessário, portanto, recorrer a Marx para se chegar a esta
conclusão. Kalecki não é marxista, e desenvolve uma teoria com grande
semelhança ao keynesianismo.
Temos, assim, mesmo sem recorrer a Marx,
uma base teórica capaz de explicar a atual aliança de forças que dominam a
política e as instituições no país. É contra este poderoso grupo que temos de
lutar.
Para nossa felicidade, temos como timoneiro do barco o hábil negociador que é o presidente Lula. Como explicar o resultado do último Copom que aparentou uma grande derrota do governo? O resultado é tão aberrante que nos leva a pensar em uma grande manobra do presidente para tentar reduzir o ruído atualmente existente e viabilizar a futura indicação do possível candidato para a presidência do BC, o Galípolo, Lula teria orientado os diretores por ele indicados para votar com os demais. Parecendo ter sofrido uma grande derrota o timoneiro manobrou o barco para desviá-lo dos recifes e prosseguir navegando no rumo programado. A situação permanece muito tensa, mas a colisão imediata com os recifes foi evitada. O prosseguimento dependerá da correlação de forças que se está alterando. O frentão, que ganhou as eleições, está se rachando, como era previsível. O resultado dependerá das lutas que se aproximam.
[i] Economista, Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do
Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira;
nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).
Colaboraram os pesquisadores: Paola Arruda, Brenda Tiburtino e Paulo Vitor.
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