quinta-feira, 28 de novembro de 2024

NO PRESENTE, BUSCA-SE FREAR A ECONOMIA; DO PASSADO, VEM À TONA A TRAMA GOLPISTA

Semana de 18 a 24 de novembro de 2024

 

Rosângela Palhano Ramalho [i]

           

Prezado leitor, em meio às negociações sobre o corte dos gastos, o “mercado” amplia a pressão sobre o governo, para que o aperto monetário continue e seja intensificado com um aumento dos juros em 0,75 ponto percentual na próxima reunião do Copom. O subjetivismo característico da análise econômica tradicional prevê que, dessa forma, a tal desancoragem das expectativas de inflação será resolvida. Ou seja, para ancorar as expectativas apuradas pelo relatório Focus, construído a partir das expectativas do “mercado”, o “mercado” exige uma dosimetria maior de juros que remunera, vejam só, os rentistas do próprio “mercado”! A raposa continua a vigiar o galinheiro. Nunca é demais lembrar que, se lançarmos o olhar para a realidade concreta e objetiva, as estatísticas reforçam que não há pressão inflacionária à vista, já que o IPCA acumulado até novembro, segundo o IBGE, fechou em 3,88%, ainda longe dos 4,5% previstos como limite máximo do regime de metas de inflação.

Mesmo com o Banco Central se esforçando para desacelerar a economia e conter ameaças inflacionárias fictícias, a economia tem apresentado resultados cada vez melhores. Espera-se que 2024 feche com crescimento de 3,3% do PIB. Esta estimativa é da Secretaria de Política Econômica, que vem ajustando para cima a previsão que no início do ano era de 2,2%. Assim, aqueles que se empenham em impor suas pautas ao governo, seja para obter proveito financeiro, seja por questões ideológicas (pessoais, políticas ou intelectuais), têm recebido consecutivos choques da realidade. O último foi a queda da taxa de desemprego para 6,4% no terceiro trimestre de 2024, segundo apuração do IBGE. Em relação ao trimestre anterior houve queda de 0,5 ponto percentual. O desemprego recuou em todas as faixas etárias, e a queda mais representativa aconteceu entre os trabalhadores de 25 a 39 anos. Portanto, os dados conjunturais mostram, de forma cristalina, que 2024 será um ano bom para a economia o que contraria os arautos do fim do mundo. E ainda: o crescimento não trará aceleração inflacionária.

No cenário externo, enquanto o mundo e os americanos assistem, atônitos, a formação da equipe de governo de Donald Trump, composta até agora por lunáticos, adeptos das mais descabidas teorias da conspiração e do desejo de desmontar o setor público, o Brasil caminha para punir aqueles que tramaram contra a nossa democracia. Lá, não só não puniram Trump pelos crimes cometidos na invasão do Capitólio, em 6 de dezembro de 2021, como ainda permitiram a sua candidatura. Sua vitória nas eleições produziu um delírio momentâneo dos golpistas brasileiros que, enganando a si mesmos, viram naquele resultado uma oportunidade de anistiar os criminosos que, em 8 de janeiro de 2023, invadiram e depredaram a Praça dos Três Poderes em Brasília, à espera de uma intervenção militar. Segundo a fantasia coletiva, a eleição de Trump facilitaria a tramitação da proposta de anistia no Poder Legislativo, geraria pressão para que o ministro da Suprema Corte Alexandre de Moraes liberasse o passaporte de Bolsonaro, a fim de que ele pudesse participar da posse americana em janeiro e, ainda, o ministro poderia até ser impedido de entrar nos Estados Unidos, simplesmente por estar aplicando a lei àqueles criminosos de boa intenção.

Ora, se achavam que o resultado eleitoral americano iria intimidar as investigações em andamento no Brasil estavam redondamente enganados! Eis que em 19 de novembro foi deflagrada pela Polícia Federal, a Operação Contragolpe. Quatro militares do Exército e um agente da Polícia Federal foram presos por planejar um golpe de Estado para impedir a posse do presidente Lula e o pleno exercício do Poder Judiciário. A estratégia incluía o assassinato do atual presidente da República, do vice-presidente e do ministro Alexandre de Moraes do STF. Dois dias depois, ainda no âmbito desta operação, a Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro, o general Walter Braga Netto, candidato a vice-presidente na chapa derrotada nas eleições de 2022, o general Augusto Heleno, que foi chefe do Gabinete de Segurança Institucional e outras 34 pessoas pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.

O resultado das investigações não deixa dúvidas. Não foi algo corriqueiro. Não foi um ato isolado. Foi uma estratégia planejada, com partes executadas e, felizmente, fracassada... O fato de terem fracassado por incompetência e/ou burrice, não os exime do crime, muito menos quer dizer que estes indivíduos não sejam perigosos. São criminosos periculosos e violentos que autointitulados de patriotas, ousaram urdir-se contra as estruturas institucionais do seu próprio país tomando como exemplo o golpe de 1964. Prisão para todos os que tramaram contra a democracia brasileira!


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; rospalhano@yahoo.com.br, rosangelapalhano31@gmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Raquel Lima, Lara Souza, Guilherme de Paula, Ícaro Formiga e Brenda Tiburtino.

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sexta-feira, 22 de novembro de 2024

O DINHEIRO PÚBLICO ESTÁ SENDO ENGOLIDO PELO “MERCADO”

Semana de 11 a 17 de novembro de 2024

 

Lucas Milanez de Lima Almeida[i]

           

Prezado leitor, você que acompanha as notícias econômicas tem visto uma enorme pressão “dos mercados” sobre o governo Lula. De fato, o dólar tem aumentado ao longo de 2024. Além disso, a inflação deu uma leve acelerada nos últimos meses. Apesar de as causas serem, essencialmente, outras, os “analistas” financeiros têm atribuído isto a um improvável descontrole dos gastos públicos.

É extenso o conjunto de termos que compõem a loucura do mercado financeiro, mas os que se destacam são “expectativas” e “credibilidade”. Isto não é à toa. O motivo é que, no mundo atual, a especulação é uma atividade essencial para dinamizar a valorização do capital. A “expectativa” de ganhos e a “credibilidade” da organização que emite um ativo financeiro são fundamentais para o funcionamento daquilo que chamamos de capital fictício. É um dinheiro que cresce porque tem a possibilidade de trazer mais dinheiro no futuro, mesmo o futuro estando longe do presente. Em outras palavras, a valorização vem de uma aposta.

O grande problema é que as apostas, em geral (como uma espécie de fetiche do capital fictício), têm tomado conta de todas as esferas da vida humana. No caso específico que interessa a esta análise, o capital fictício estabeleceu uma relação íntima com o endividamento dos Estados Nacionais desde os anos 1980. No caso das economias periféricas, como o Brasil, a situação é ainda pior.

Sem recursos financeiros para cumprir todas as funções necessárias à existência cotidiana dos seus cidadãos, bem como para atender aos diferentes interesses de cada classe social, o Estado carece de empréstimos para pagar suas contas. O problema é que, com isto, um país se torna refém daqueles que o financiam, a saber, um grupo cada vez menor e que concentra uma porção cada vez maior do capital. Consequentemente, a vigilância sobre o orçamento público se torna inevitável, pois quem empresta quer seu retorno. Quanto menos um governo gasta com “besteira” (assistência social, saúde, educação, moradia etc.), mais sobra para o que importa, a boa gestão do endividamento público. Este é o motivo da tara “dos mercados” pelo equilíbrio fiscal.

Pois bem, quando escrevo esta análise, o Brasil e o mundo discutem questões climáticas na COP29 e questões sociais no G20. Contudo, no Brasil, temos um tema ainda mais quente: quanto e, principalmente, onde o governo federal vai deixar de gastar para cumprir o “novo arcabouço fiscal”, a nova regra que impõe ao poder executivo um conjunto de limitações em seus gastos?

Antes de mais nada, vale lembrar que o orçamento de 2024 já é um problema para o Governo Lula. Em agosto do ano passado, Fernando Haddad e Simone Tebet apresentaram um Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2024, que previa o equilíbrio fiscal, com a possibilidade de déficit ou superávit de R$ 29 bilhões (banda de 0,25% para mais ou para menos). Ou seja, as receitas deveriam ser iguais às despesas em 2024, com uma pequena “margem para erro”. Nada mais falso. À época, era possível estabelecer algo mais factível, com um déficit de 0,5% ou mesmo de 1% (também com bandas de 0,25%). Na tramitação da PLOA, o deputado Lindbergh Farias apresentou esta proposta. Mas, ela foi recusada não apenas pelo Congresso, como também pelo próprio Haddad.

Atualmente, a discussão é sobre o orçamento futuro, referente a 2025 e 2026. Os “analistas de mercado” já apresentaram suas propostas: reduzir o piso constitucional da educação e da saúde, acabar com os reajustes reais do salário-mínimo, aposentadoria e BPC, bem como outros ataques ao orçamento dos pobres. Enquanto Haddad e Tebet são os mais simpáticos a tais propostas, o presidente Lula tem apresentado resistência. Por outro lado, há quem diga que, desta vez, algumas regalias dos militares serão atacadas. Quem sabe os benefícios às grandes empresas. A ver...

Enfim, a situação brasileira atual, ao menos, serve para mostrar a insustentabilidade deste sistema no qual vivemos. Cedo ou tarde, o Estado brasileiro não será capaz de atender às necessidades de sua população. Por que é um tabu discutir os R$ 649 bilhões de juros pagos no ano passado, quatro vezes mais que o valor gasto com o Bolsa Família? Diante disto, o que faremos?

Há muito a classe trabalhadora não se mobiliza para se fazer presente na luta de classes. Iniciada em um novo campo de batalha, nas redes sociais, que a justa e legítima discussão sobre a escala 6x1 sirva de fagulha para reacender a luta contra as desigualdades que o capitalismo impõe às massas. Se não este, não há outro caminho.


[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Gustavo Figueiredo, Raquel Lima, Guilherme de Paula, Júlia Souza, Paola Arruda e Victória Pinto.

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sábado, 16 de novembro de 2024

ENTRE A AUSTERIDADE E A DIPLOMACIA: OS DILEMAS DO GOVERNO LULA

Semana de 04 a 10 de novembro de 2024

 

Maria Fernanda Vieira Guimarães[i]

           

Como já pontuado nesta coluna, o compromisso quase obsessivo da equipe econômica com o déficit zero em 2024 resultou em uma série de medidas que, na prática, atendem prioritariamente aos interesses do mercado financeiro. Como era de se esperar, optou-se por um rigoroso pente-fino nos gastos sociais, com o ministério de Simone Tebet revisando benefícios e enxugando despesas públicas. No lado das receitas, o governo recorreu a medidas como taxação de importações, contribuindo para sucessivos recordes de arrecadação, os maiores desde o período pré-pandêmico. O efeito dessas políticas recai diretamente sobre a população brasileira enquanto um grupo específico, os rentistas, continua blindado das consequências dessa “caça” ao déficit zero.

A meta fiscal, estabelecida pela equipe econômica e aprovada pelo Congresso Nacional, é de déficit zero, com uma margem de tolerância de até R$28,8 bilhões. Em setembro, a previsão de déficit estava em R$28,3 bilhões, ainda dentro da meta. No entanto, pressionada pelo “mercado”, a busca por austeridade fiscal segue a todo vapor. Prova disso é que, na semana de publicação desta redação, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, cancelou compromissos no exterior, a pedido do presidente Lula, para se reunir com outros ministros e consolidar um novo pacote de cortes de gastos, reforçando a determinação do governo em atingir a meta fiscal. Os ministros Wellington Dias (Desenvolvimento Social) e Carlos Lupi (Previdência) já declararam que, em suas pastas, não haverá cortes. Desse modo, cabe a Lula articular internamente como esses cortes serão implementados.

Veja bem, caro leitor, segundo o tripé macroeconômico, adotado em 1999, no governo de FHC, o governo brasileiro deve perseguir superávits primários, manter o câmbio flutuante e adotar um regime de metas para a inflação. E, nesta incessante busca pela austeridade fiscal, o que se observa é um capricho em agradar aos credores do governo com rendimentos sobre a dívida pública. Não à toa, o corte de gastos tornou-se central desde as eleições municipais, visando assegurar ao mercado a confiança de que o Brasil continuará honrando seus juros.

Para tanto, o Banco Central decidiu elevar a taxa Selic, uma vez mais. A instituição, que acredita na manipulação dos juros como único meio para manter a inflação sob rédeas curtas, mesmo esta continuando dentro da meta, esquece que seu papel também inclui a promoção do bem-estar econômico da sociedade brasileira. Ao elevar a taxa de 10,75% para 11,25%, o Banco Central encarece o crédito, restringe o consumo e agrava as dificuldades enfrentadas pela população e pelos setores produtivos. Esses setores, apesar de apresentarem um leve crescimento no trimestre, já preveem queda nas atividades devido ao encarecimento do crédito. Com o aumento da taxa Selic, a dívida pública se torna ainda mais onerosa, e o peso do ajuste fiscal recai sobre quem já enfrenta dificuldades econômicas.

No cenário internacional, a vitória do republicano nas eleições norte-americanas sinaliza um cenário potencialmente desconfortável para o governo brasileiro. O Federal Reserve, banco central norte-americano, baixou a sua taxa de juros em 0,25 ponto percentual apesar das promessas inflacionárias durante a campanha de Trump. Tendo apoiado a campanha da democrata Kamala Harris na corrida à Casa Branca, o presidente Lula deixou claro seu descompasso com o republicano. A agenda climática, considerada por Trump como uma ferramenta de interferência, do sistema internacional, na soberania dos Estados, deve ser, não apenas negligenciada nos próximos quatro anos pela potência americana, mas veementemente atacada. No entanto, diante da crescente influência da China na agenda climática brasileira, especialmente com investimentos em energias renováveis, é possível que Trump evite rupturas mais radicais para não abrir ainda mais espaço à projeção global chinesa em temas ambientais. A influência chinesa coloca o Brasil em uma posição estratégica, porém delicada.

Enquanto isso, é necessário estar atento às movimentações da imitação tupiniquim de Trump, que, mesmo inelegível, viu na eleição do gêmeo nova-iorquino a oportunidade de voltar aos holofotes. Em mensagens de congratulação ao republicano ele passou a publicar na plataforma X (anteriormente Twitter), alusões à possibilidade de tornar-se elegível e concorrer à presidência em 2026.

Supõe-se que estes e outros desafios que o governo brasileiro enfrenta, tanto no cenário doméstico quanto no internacional, vão exigir habilidade política e uma estratégia econômica hábil para equilibrar as pressões. No entanto, é evidente que quem continuará arcando com o peso das decisões fiscais e da instabilidade internacional será o povo brasileiro, que sente diretamente os efeitos das políticas de austeridade e dos cortes em programas sociais. Resta saber se o governo será capaz de encontrar um equilíbrio entre seus compromissos fiscais e as necessidades sociais, mantendo a estabilidade e a credibilidade necessárias para enfrentar as oscilações do sistema global.


[i] Pesquisadora do PROGEB e graduanda em Relações Internacionais pela UFPB (mafe.vg.2007@gmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Brenda Tiburtino, Guilherme de Paula, Lara Souza e Gustavo Figueiredo.

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quinta-feira, 7 de novembro de 2024

A QUEM ESTÁ SERVINDO A ECONOMIA DO BRASIL?

Semana de 28 de outubro a 03 de novembro de 2024

 

Paola Teotônio Cavalcanti de Arruda[i]

           

A cobertura da grande mídia tem intensificado o tom alarmista ao tratar da alta recente do câmbio, que chegou a R$5,70, e dos juros de longo prazo, atualmente na casa dos 7% ao ano, descontada a inflação. De maneira insistente, editoriais como os do Valor Econômico atribuem essa oscilação a uma suposta falta de controle das despesas públicas pelo governo. Essa narrativa sugere que o único caminho viável para estabilizar o câmbio e conter a inflação seria o corte de gastos públicos e o aumento dos juros, desprezando outras alternativas econômicas possíveis e mascarando interesses mais profundos.

Curiosamente, os mesmos editoriais que sempre defenderam juros elevados começam a admitir que uma Selic alta sufoca o crescimento econômico. No entanto, em vez de reconhecer o impacto negativo dessa política para a economia e para a população, reforçam a pressão sobre o governo, ao insinuar que o próximo passo, caso os gastos públicos não sejam contidos, será elevar ainda mais os juros no país. A “inflaciofobia” alimentada no país serve como justificativa para uma política fiscal austera. Câmbio alto encarece os preços e para reduzi-los teríamos que arcar com mais um aumento dos juros. Para que isto não aconteça, o governo deveria se esforçar reduzindo os gastos já que estes compõem a demanda nacional. Resultado: demanda contida, inflação controlada. Em última instância, quaisquer que sejam as soluções,  os interesses do setor financeiro continuarão a ser protegidos e os seus  altos rendimentos, às custas do erário público, estarão garantidos.

Portanto, essa pressão pela austeridade fiscal não é uma solução neutra ou inevitável, mas um discurso conveniente para o mercado financeiro. O governo já sinalizou que vai ceder e está se reunindo para discutir onde serão feitos os cortes nas despesas. Ao focar exclusivamente nos cortes de gastos como solução, desconsidera-se a importância de políticas fiscais que favoreçam o crescimento econômico e a justiça social, negligenciando o debate sobre as consequências de uma Selic alta para o investimento produtivo e o bem-estar dos brasileiros. Negligencia-se que as causas inflacionárias são variadas e que a taxa de juros não deve ser o único instrumento utilizado para seu controle. Na prática, o Banco Central responde automaticamente a qualquer pequena elevação na expectativa de inflação, mesmo quando os indicadores reais estão em processo de convergência para a meta, o que gera aumentos injustificados na taxa de juros.

Fato é que a polarização ideológica e econômica no Brasil criou um ciclo vicioso que impede o avanço da economia e transfere o ônus para a população. Em vez de convergir para soluções práticas que promovam crescimento e inclusão, debates sobre temas econômicos são frequentemente marcados por posturas dogmáticas, que se traduzem em políticas rígidas e medidas paliativas que pouco beneficiam o bem-estar coletivo. Essa tensão ideológica acaba prejudicando o brasileiro comum, que enfrenta juros altos, desemprego e perda de poder de compra, enquanto as elites financeiras e os rentistas encontram espaço para lucrar.

Nesse cenário, a verdadeira solução para melhorar a economia brasileira exige uma superação desse impasse ideológico, com a adoção de políticas econômicas que equilibram responsabilidade fiscal com o compromisso de gerar oportunidades e reduzir desigualdades. Mas, não se pode esperar que a elite faça isso por iniciativa própria. Por isso, a participação política dos cidadãos é fundamental para pressionar por um sistema econômico que seja verdadeiramente inclusivo e sustentável, garantindo que as políticas públicas atendam ao bem comum e não apenas a interesses restritos. A sociedade tem o potencial de assumir um papel muito importante na formulação e na fiscalização dessas políticas, ajudando na construção de uma nova realidade, mais justa e equilibrada.

Mas, para que isso ocorra, é também necessário conseguir se comunicar com as pessoas, mostrar o que tem sido feito, quais são os entraves para que mais seja concretizado e o que é necessário para que o Brasil realmente prospere. A grande questão que surge é: estamos conseguindo nos fazer ouvir? O discurso progressista tem chegado até as pessoas e, mais importante, tem feito sentido para elas? Que pessoas queremos atingir com nossas políticas? Quais lugares estamos deixando de alcançar? É sobre isso que precisamos refletir.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduanda em Relações Internacionais (UFPB). (paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Lara Souza, Maria Fernanda Vieira, Guilherme de Paula e Raquel Lima.

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sexta-feira, 1 de novembro de 2024

AINDA A SELIC E A CONJUNTURA MUNDIAL

Semana de 21 a 27 de outubro de 2024

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

O aumento da taxa Selic pelo Banco Central (Copom) continua a causar celeuma. Esta questão dos juros no país torna-se recorrente e a principal preocupação de todos: tanto os especuladores financeiros, apelidados de “mercado”, e o resto da nação. Enquanto continua a difamar o Brasil no exterior e a traçar maus prognósticos para o futuro da economia, o presidente do BC, Roberto Campos, aproveita sua peregrinação para conseguir mais autonomia para a entidade. Não satisfeito com a já conseguida autonomia, quer agora, com a PEC 65/2023, uma independência orçamentária e financeira, transformando o BC em uma empresa pública. Este foi o tom do discurso feito por ele, em São Paulo, no evento da 20-20 Investment Association. Além disso, Campos solta a língua, para fazer críticas à política fiscal do governo, insinuando a possibilidade de um descontrole fiscal e dificuldades para manter as metas propostas no arcabouço fiscal. O resultado é a inquietação e o nervosismo do “mercado”, que começa a precificar os juros futuros, que já subiram para 13%. O próprio Tesouro Nacional já começou a emitir papéis prefixados com taxas acima deste valor.

O nervosismo do mercado mostra a intenção oculta de prejudicar a execução da política social do governo, pois todas as críticas se voltam para o corte das despesas. É claro que as despesas a serem cortadas são todas as que envolvem apoio social aos mais desfavorecidos. Ninguém aponta corte de despesas com juros da dívida, por exemplo, ou não pagamento das emendas dos parlamentares. Querem até investir contra as despesas obrigatórias que só podem ser alteradas com emendas constitucionais.

Embora as estatísticas nada mostrem, os especuladores da Faria Lima falam em pessimismo, em desconfiança fiscal, em um quadro inflacionário agravado pelos preços da energia, alimentos e serviços, em expectativas desancoradas, fatores que justificariam uma elevação da Selic para 13,5% ou mais. Com toda esta tensão tudo leva a crer que será muito difícil a tarefa do novo presidente do BC, Gabriel Galípolo, quando assumir a presidência.

Neste clima, a Fundação Getúlio Vargas divulgou o Monitor do PIB, por ela calculado. Para agosto, em relação a julho, houve uma retração de 0,2% na economia. Os dados mostram uma estagnação da indústria e uma retração dos serviços. Só a agricultura apresentou crescimento. As exportações tiveram uma queda de 2,5%, o que contribuiu para a queda do PIB. Apesar deste quadro, não muito favorável, a taxa de investimentos foi de 18,1%.

Para surpresa geral, o FMI reviu para cima sua estimativa para o crescimento do PIB do Brasil. No relatório “Panorama Econômico Mundial” (WEO), a entidade estimou, que a economia do país deverá crescer 3% este ano, e apontou como razões o “aumento do consumo privado e dos investimentos, o mercado de trabalho aquecido, os programas de transferência de renda do governo e o impacto das inundações, menor do que o esperado”.  Para a inflação, o FMI prevê uma taxa de 4,3%, dentro da meta, portanto. Para o mundo, o Fundo prevê um crescimento de 3,2% e aponta como tarefa geral “derrubar a inflação sem uma recessão global”. Mostrou preocupação com a eleição de Trump, nos EUA, que poderá provocar uma guerra de tarifas com a China, que poderá afetar um quarto de todo o comércio de mercadorias e 6% do PIB mundial. Destacou a resiliência da economia mundial e previu um pouso suave marcando o fim da reanimação.

As tensões políticas e geoestratégicas continuam elevadas, com o aumento dos riscos na guerra da Ucrânia (chegada de tropas da Coreia do Norte no front) e continuidade dos massacres em Gaza, Líbano, Síria e Irã. O estado de Israel, em ações terroristas, passou a bombardear, com as bombas enviadas pelos EUA, as agências bancárias em Beirute, a pretexto de atacar as finanças do Hamas. Ao bombardear uma agência bancária, destrói um quarteirão inteiro e mata dezenas de civis, enquanto o mundo ocidental civilizado a tudo assiste, passivo, com apenas algumas simbólicas declarações.

Para finalizar, lamentamos o traumatismo sofrido pelo presidente, que o impediu de participar das reuniões dos BRICS e o embaraçoso veto do Brasil, à inclusão da Venezuela como membro da instituição.


[i] Economista, Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Paola Arruda, Brenda Tiburtino, Lara Souza, Raquel Lima e Guilherme de Paula.

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